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sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Os moldes trabalhistas no contexto do capitalismo flexível.


Quando os renomados sociólogos alemães Karl Marx e Friedrich Engels escreveram seus famosos textos acerca do modelo capitalista da época, o proletariado, termo usado pelos próprios autores, se encontrava em uma situação de exploração. De acordo com tais pensadores, essa situação se estabelecia basicamente porque a burguesia, ao invés dos próprios trabalhadores das fábricas, era a detentora dos meios de produção. No contexto do desenvolvimento das ideias de Marx, portanto, os operários das fábricas trabalhavam durante horas em um cenário alienante e degradante, além de receberem baixos salários.

Atualmente, um século depois da obra de Marx e Engels, houve um desenvolvimento da ideia de Direito Trabalhista e, nesse sentido, uma análise superficial do atual cenário poderia concluir que a situação do proletário melhorou ao longo dos anos. No entanto, se observarmos as mudanças ocorridas, compreendemos a incoerência de tal pensamento.

Nos tempos do chamado “capitalismo flexível”, os indivíduos são incentivados, por exemplo, a trabalhar em casa, utilizando as novas ferramentas tecnológicas de comunicação. Dessa forma, alguém poderia indagar: “Ora, mas isso é um avanço, não? Estamos trabalhando no conforto de nossa casa! Podemos fazer nossos próprios horários. ”, mas não, não é um avanço. O fato de estarmos mais confortáveis faz com que, sem percebermos, ultrapassemos facilmente o período de trabalho. Além disso, o uso da internet e das outras ferramentas permite que sejamos cobrados 24 horas por dia, em qualquer dia da semana.

Diante de tal problema, um indivíduo também poderia afirmar que, nos moldes do sistema atual, podemos ser “nosso próprio patrão”, basta que criemos um empreendimento ou comecemos um projeto sozinhos. “Ah, a beleza do capitalismo flexível! ”. No entanto, existem muitos empecilhos no processo de criar um novo negócio, completamente inovador e que seja capaz de satisfazer nossas necessidades básicas e ainda os luxos consumistas de nosso tempo.

“Pois então inove, reinvente-se, faça um curso, busque um coach de negócios! ”. A pergunta é: qual é a parcela da população que tem as ferramentas necessárias para “se reinventar” quando preciso, contratar um coach para todos os âmbitos de sua vida e ainda manter a sua saúde física e mental em um cenário tão exigente? É evidente que apenas os mais privilegiados poderiam manter tal estilo de vida.

Para esclarecer o contexto apresentado, avaliemos um exemplo dos moldes trabalhistas atuais. Segundo o IBGE, a taxa de informalidade no mercado de trabalho foi de 40,6% no primeiro trimestre de 2020, atingindo 38 milhões de trabalhadores brasileiros[1]. Dentro desse cenário, uma das ocupações informais em crescimento se refere à dos entregadores por aplicativos, considerado um exemplo desses empregos “flexíveis” da atualidade, os quais não estabelecem vínculos empregatícios entre contratado e contratante.

Em julho de 2019, o entregador Thiago de Jesus Dias sofreu um AVC durante seu expediente e acabou falecendo. O que surpreende no caso de Thiago é que, quando a cliente contatou o aplicativo de entrega para avisar que o entregador estava passando mal, obteve a seguinte resposta: “pediu para que déssemos baixa no pedido para que eles conseguissem avisar aos próximos clientes que não receberiam seus produtos no horário previsto”[2].

O exemplo de Thiago mostra que, apesar de muitos acreditarem que as ideias de Marx estão ultrapassadas, pois não existiriam mais situações de exploração e alienação do trabalhador em tempos de capitalismo flexível, podemos sim afirmar que o estudo de tal pensador se torna ainda mais necessário diante de tal contexto. Dessa forma, podemos classificar a obra de Marx como atemporal, não perdendo e, ao contrário, aumentando sua importância ao longo dos anos.

 Júlia Scarpinati- 1° ano Direito - Matutino.

 

 

 



[1] Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-03/informalidade-cai-mas-atinge-38-milhoes-de-trabalhadores. Acesso em: 21 ago. 2020

[2] Disponível em: https://vejasp.abril.com.br/cidades/entregador-rappi-morre-expediente/. Acesso em: 21 ago. 2020

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