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quinta-feira, 2 de maio de 2019

Lugar do ser humano no positivismo

Uma célula, uma peça e um ser humano. Seriam esses três elementos passíveis de comparação? Estaria o humano para o corpo social, assim como a célula está para o organismo e a peça para a engrenagem? A resposta da filosofia funcionalista defendida por Durkheim é de que sim, mas acredito que a resposta genuína de cada mente pensante e de cada coração pulsante não seja assim tão reducionista. 
As ideias positivistas impulsionaram a humanidade para uma categorização simplista daquilo que o ser humano é. Ou seja, se só se é diante do desempenho da função social, quem seriam aqueles que não cumprem tal tarefa, ou que dedicam suas vidas a funções sociais não legitimadas pela comunidade em que vivem? De certo o sentimento de identidade dessas pessoas é afetado pela ideia funcionalista, que as reduziria àquilo que não tem relevância ao todo, e que, portanto, deveria ser refuncionalizado para pertencer ao grande organismo social. Como uma peça quebrada ou uma célula doente, o indivíduo que não cumpre satisfatoriamente o desempenho de seu papel social obstaculiza o funcionamento equilibrado do meio em que está inserido. A grande questão é se realmente existe tal equilíbrio, quando se trata das relações humanas. A visão positivista da sociedade pressupõe o alcance de uma harmonia em um contexto em que o conflito é constante, por se tratar da vivência em conjunto de pessoas que carregam singularidades infinitas. 
Volto então à questão de que o indivíduo não necessariamente se sente uma peça de uma engrenagem ou a célula de um organismo. Mesmo aquele que dedica sua vida ao cumprimento de suas funções sociais, e não pretende de forma alguma subverter a isso, pois nisso reside sua satisfação pessoal, ainda assim esse indivíduo não poderia ser reduzido a isso. E é justamente esse fenômeno que, oriundo de uma interpretação cartesiana do positivismo, colabora para uma visão míope do ser humano acerca de si mesmo e do outro. Por muitas vezes não conseguir se ver além do que representa ou deixa de representar à sociedade, o indivíduo também reduz o outro a tais categorizações. Neste processo, abandonam-se os caráteres de subjetividade humana, tais como a afetividade, a empatia e a capacidade de reconhecer valores humanos que transcendem as funções práticas. 
As consequências do enraizamento de tal ideologia na consciência coletiva se expressam em um crescente medo do homem de estabelecer relações interpessoais sólidas e genuínas, já que o aspecto da funcionalidade está presente de maneira tão forte que é aterrorizante a ideia de se mostrar ao outro além daquilo que se vê no desempenho de sua função social. Além disso, existe uma insegurança própria de cada indivíduo em relação àquilo que se é no que transcende ao funcionalismo, ou seja, no que o torna de fato humano. Inseguro de si e com medo do estabelecimento de uma proximidade que ameace mostrar sua real personalidade, o sujeito tem cada vez mais facilidade em se desvencilhar de pessoas que se apresentem “inúteis” ou “desfuncionais” às suas vidas. Nisso reside a sociedade que Zigmund Bauman chamaria de líquida, ou seja, aquela incapaz de consolidar relações verdadeiras e duradouras. 
Assim, a filosofia positiva, apesar de ter importância para o desenvolvimento das ciências, mostra-se muito nociva ao caráter humanitário da sociedade, e por isso sua potencialização caminha em contramão com a real harmonia das relações humanas.

Carolina Juabre Camarinha.1º ano Direito matutino

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