Os
togados são criaturas um tanto quanto peculiares: ainda que deles
não se saiba muita coisa, espera-se deles, comumente, que saibam
tudo. Tudo, no entanto, eu garanto que eles não sabem. Ainda assim é
impossível afirmar que não reunam uma inacreditável quantidade de
informações dentro de suas cabeças brancas e calvas. Tanta
sabedoria, aliás, acaba pesando sobre os músculos da face, de forma
que acabam franzidos e rijos. Em tempos de legislação omissa,
morosa, irresponsável e de uma evidente e grave crise de
representatividade, as demandas sociais acabam invariavelmente por
recorrer aos togados. Mais um peso, portanto, que se precipita sobre
os humanos corpos dos togados. No entanto, não estamos finalizados.
Diante de toda essa conjuntura, exige-se que os juízes suportem
encargos cada vez maiores sobre seus dorsos.
No
Brasil, por exemplo, as circunstâncias acima descritas notadamente
se fazem presentes. O ilustre caso da ADI (Ação direta de
inconstitucionalidade) 4277, proposta em 22 de julho de 2009 pela
Procuradora-Geral da República, a qual visava tornar obrigatório o
reconhecimento da
união
entre
pessoa
s do
mesmo
sexo,
como
entidade
familiar,
desde
que
atendidos
os
requisitos
exigidos
para
a
constituição
da
união
estável
entre
homem
e
mulher, foi resolvido
pelo Judiciário de maneira ativista, através da aplicação direta
da constituição a circunstâncias não diretamente contempladas por
seu texto. O reconhecimento, aos casais homossexuais, dos mesmos
direitos que contemplam as uniões estáveis heteroafetivas exigiu,
ademais, uma imposição de atitudes ao Poder Público, englobando,
assim, outro aspecto prático do desempenho proativo do Judiciário.
Não
obstante, tal procedimento decisório gerou algumas controvérsias
acerca de tal postura do Judiciário, firmadas com base no argumento
de que este supostamente estaria ultrapassando os limites de
competência estipulados pela separação de poderes com a finalidade
de evitar a prática de arbitrariedades por parte do Estado.
Por sua
vez, Luís Roberto Barroso, um dos ilustres togados pertencentes ao
dream team do Supremo
Tribunal Federal brasileiro, em um excelente e esclarecedor artigo
publicado, denominado "Judicialização, ativismo judicial e
legalidade democrática", faz as suas ponderações acerca de
tal posicionamento crítico ao ativismo judicial. Evidentemente,
Barroso é favorável à postura proativa do Judiciário; isso no
entanto não o impede de tecer alguns comentários, pontuais e
necessários, sobre os limites legislativos e decisórios a serem
respeitados pelos togados. Com efeito, afirma ele, em defesa do
ativismo, que a expansão do
Judiciário é benéfica no sentido em que decide assuntos relevantes
os quais vêm sendo negligenciados pelo debilitado Legislativo
brasileiro, pelos já apontados motivos de crise de
representatividade e de precarização da atividade legislativa. Por
outro lado, aponta a importância da atividade política para a
efetiva manutenção da democracia, explicitando, além disso, que os
juízes devem ter em mente que existem situações nas quais o
Judiciário não é o poder mais apto à resolução de contendas.
Chama, ademais, atenção
para o fato de que devem os magistrados ter um senso de cautela e
serenidade, pelo fato de que suas decisões podem gerar consequências
não previstas; cabe a eles, dessa forma, saber identificar as
situações nas quais é cabível sua intervenção decisória,
optando, certas vezes, por não exercer seus poderes.
Luís
Roberto Barroso ensina dessa forma que, além das meras obrigações
legislativas e de atitudes proativas, o peso sustentado pelos frágeis
dorsos dos togados na atualidade é sobretudo composto pelo estafante
e exigente
encargo da responsabilidade.
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