Boaventura do Sousa Santos, no seu
artigo “Poderá o direito ser emancipatório?”, cria o termo “fascismo social”
que, segundo ele, é um regime social e civilizacional, que trivializa a
democracia a ponto de se tornar desnecessário sacrificá-la para promover o
capitalismo. É produzido pela sociedade e não pelo Estado, como o fascismo das
décadas de 1930 e 1940. A pretensão deste texto é dar exemplos concretos da
quarta forma de fascismo social, o fascismo financeiro, que é a forma mais
pérfida, afinal este se tornou critério operativo das instituições da regulação
global. É também o mais pluralista de todos, pois os fluxos de capitais resultam
das decisões de investidores individuais ou institucionais espalhados pelo
mundo todo, que nada tem em comum além do desejo de aumentar seus lucros. Outra
característica muito básica do fascismo financeiro é seu tempo-espaço global e
virtualmente instantâneo que, aliado a lógica especulativa do lucro, dá ao
capital financeiro um poder discricionário imenso, suficientemente forte para
ser capaz de abalar a economia ou a estabilidade política de qualquer país, em
segundos.
Não faltam fatos cotidianos do mundo
empresarial/financeiro para confirmar as definições e “acusações” do autor com
relação ao fascismo financeiro. É evidente a busca desenfreada por lucros, que
relega a segundo plano direitos e necessidades das pessoas afetadas pelas
decisões tomadas no âmbito do mercado, mais notavelmente por parte das grandes
corporações. Por exemplo, a prática do chamado “dumping” (prática de preços
menores no mercado externo que no interno), de que foram acusadas pela
indústria papeleira da China as fábricas brasileiras de celulose, denota a luta
que travam as empresas pelo domínio dos grandes mercados mundiais. Tal prática
demonstra a lógica de funcionamento do mercado: a supremacia e o lucro devem
ser alcançados a todo custo, mesmo que seja necessário recorrer a práticas
consideradas desonestas.
E o problema é ainda mais preocupante
quando se trata de práticas cujos resultados não afetam apenas os rendimentos
de concorrentes ou o funcionamento equilibrado do mercado. São casos como os de
superexploração de trabalhadores, com vistas a maximizar os ganhos. Exemplo
disso é o caso descoberto na China em maio de 2007, quando a polícia resgatou
31 trabalhadores escravizados em uma olaria. Os trabalhadores relataram que
eram obrigados a trabalhar 18 horas por dia, sem nenhum tipo de pagamento, sob
a vigilância de guardas e cães, tendo de se alimentar apenas de pão e água e
sofrendo graves queimaduras por carregar tijolos quentes e sem poder sequer
tomar banho. Chama a atenção, no caso, que o dono da olaria era o filho de um secretário
local do Partido Comunista Chinês. Além disso, acusa-se a China de ter uma
legislação trabalhista precária. Por que lógica, a não ser a do desenvolvimento
econômico a todo custo (característica do fascismo financeiro), um regime que
se declara socialista desprivilegia os direitos dos trabalhadores e se volta
unicamente para a abertura do mercado?
Estritamente ligado ao fascismo
financeiro apresentado no contraditório exemplo da China está o fascismo
territorial, uma das subdivisões do chamado fascismo para-estatal. A atitude
coronelista dos donos das olarias reforça a presença desse fenômeno, uma vez
que estes exercem não apenas uma atividade ilegal, mas adquirem certo poder
sobre o território em detrimento do Estado a partir desta. Nota-se, no entanto,
que apesar de consciente da diminuição de sua autoridade, o Estado
frequentemente se faz omisso ou mesmo legitima ações visivelmente violadoras de
direitos em nome do desenvolvimento econômico. Nasce então um ciclo de
desigualdade e exploração justificado pelo acumulo de capital. Assim,
escândalos como o apresentado pela reportagem relativa à escravidão nas olarias
são apenas manifestações isoladas as quais são obtidas somente com muito
esforço e mobilização da mídia, e que permanecerão isoladas enquanto perdurar
este sistema misto de governo autoritário e liberalismo econômico, haja vista
que o assunto não constitui interesse de nenhuma das partes envolvidas. A
reportagem relacionada ao “dumping” reforça a preocupação econômica da China,
cuja indústria não hesitou em pedir as medidas de defesa comercial quando
poderia ter entrado em acordo com o Brasil, observado que esta segunda opção
não ofereceria lucros. Tamanha repercussão nacional e internacional não pôde
ser vista no caso anteriormente analisado, o que novamente denota o tratamento
privilegiado às questões mercadológicas. Seria a desonestidade nas relações
econômicas realmente mais grave que aquela praticada pelo governo para com o
seu povo?
Qualquer tentativa de resposta aos
questionamentos aqui levantados esbarrará necessariamente no conceito de
fascismo financeiro de Boaventura de Sousa Santos, pois o seu mecanismo de
funcionamento é inerente ao comportamento humano no sentido de buscar sempre o
conforto material, ou seja, a acumulação de capital. E enquanto eles
permanecerem sem resposta, mais exemplos da exploração serão gerados.
Grupo: Adri Nayane Souza de Mendonça, Anna Carolina
Carvalho Dantas Kuusberg, Camila Fávaro Leme Bastos e Nathália Marcelino
Vieira.
Referências:
SANTOS, Boaventura de
Sousa. Poderá o direito ser emancipatório?. Revista Críticas de Ciências Sociais, 65, Maio
2003: 3-76.
Disponível em: <http://www.amarilfranklin.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=420%3Aa-industria-papeleira-da-china-acusa-brasil-de-dumping&catid=42%3Anoticia&Itemid=804>.
Acessado em 11 de novembro de 2012.
Disponível em: <http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=5&menu=321>.
Acessado em 11 de novembro de 2012.
Disponível em: <http://www.wsws.org/pt/2007/jun2007/chpo-j28.shtml>.
Acessado em 11 de novembro de 2012.
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