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terça-feira, 26 de março de 2019

As falsas conclusões sobrepondo a razão


Desde o início da colonização portuguesa no Brasil, os europeus consideraram que o trabalho escravo era a melhor oportunidade para garantir o lucro na venda de matéria-prima retirada da terra explorada, além do ganho com o tráfico de pessoas africanas. A partir desse fato, enraizou-se na cultura brasileira a ideia de que os negros africanos e seus descendentes estão estáticos na base da pirâmide socioeconômica, posto que possuem uma marca histórica relacionando a ausência de remuneração enquanto trabalhavam compulsoriamente, somada a dificuldade de conseguirem empregos após a proibição de tais esforços impostos. Por conseguinte, causa-se uma pobreza entre a população negra brasileira, sugerindo que o meio rápido de conseguir dinheiro seria através do roubo e furto. Esses delitos têm estereótipos reafirmados todos os dias pela sociedade brasileira: homens e mulheres afrodescendentes. E é essa afirmação que as tirinhas de Alexandre Beck buscam ilustrar. 
A contar o período escravagista, os negros desempenhavam resistência contra essa forma compulsória de serviço a fim de combater o racismo e a desigualdade social. A partir dos anos 60, os movimentos sociais adquiriram a sustentação e movimentação popular e tomaram proporções nunca antes alcançadas por outras mobilizações, e assim, nomes como Rosa Parks, Martin Luther King e Abdias Nascimento tornaram-se um dos maiores ícones representativos desse afronte à sociedade preconceituoso que ainda tem forte atuação em pleno século 21, já que diariamente há divulgação de notícias referentes a crimes causados pela discriminação racial.
Os questionamentos envolvidos na luta de líderes de movimentos negros mostram que, assim como René Descartes promovia em sua obra O Discurso do Método, 1637, no momento que determinados ideais de uma sociedade, como afirmações de que o fator cor da pele definiam o caráter, a situação econômica e a atitude das pessoas, as dúvidas a respeito desses dizeres levantaram questionamentos de porque tal grupo é alvo de julgamentos pejorativos, e os brancos eram vistos como modelos de ótima conduta de ser humano. Dessa maneira, esse incômodo desperta no povo a indignação e vontade de dialogar a respeito desse assunto, e com isso, projetos de impactos em busca de igualdade racial são colocados em pauta por governos locais até alcançarem a ordem legislativa, resultando na criação de leis punitivas a quem praticasse tais crimes.
Logo, retomando as duas ilustrações de Beck, elas expõem acontecimentos recorrentes nas presentes sociedades, visto que uma charge explicita o fato de que se o negro corre, os policiais e as pessoas na cena irão concluir que se trata de um  ladrão, já se o branco está correndo, é apenas um ser com pressa. Além disso, quando a segunda charge exibe que o negro precisa provar que ele comprou algo ao andar com a nota fiscal no bolso, e o branco não, há o entendimento de que o negro é pobre e não tem condições econômicos para possuir uma bicicleta, e por isso, o meio para adquiri-la seria apenas por atos criminosos. E nesse quesito também pode-se comparar o que Francis Bacon defende sobre os ídolos (distrações na vida do ser humano que evitam com que ele adquira um conhecimento verdadeiro), sendo que nesse caso, o ídolo do foro (falsas percepções do mundo através das relações sociais) reflete um costume de culpar e caracterizar criminosos mediante julgamentos de experiências de vidas subjetivas e diferentes, inviabilizando o real conhecimento da situação.  
Mesmo com a manifestação de resistência dos seres humanos escravizados e posteriores movimentos sociais de elevada repercussão, até os dias atuais o racismo é tratado como um problema comprovado pela razão humana, mas que devido a experiência particular de cada indivíduo, predomina-se o costume de duvidar de uma classe historicamente importunada por julgamentos prévios da sociedade, do governo e da polícia.
Sarah Fernandes de Castro – Direito noturno

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