Qual o sentido da judicialização ?
A pergunta:
“O termo judicialização faz sentido?” é uma provável questão para algumas pessoas. Porém, para responder essa questão devemos
passar pelo processo de evolução histórica no mundo e nos tribunais que levaram
ao protagonismo dos tribunais. No mundo, o avanço do neoliberalismo, a crise do
Estado de Bem-Estar-Social na Europa, o processo político pós-guerra na Europa
e nos EUA e dos regimes pós-ditaturas na América Latina ampliaram garantias
constitucionais de acesso à justiça e também a crise de representação
político-partidária em conjunto levaram a esse fenômeno da judicialização. No Brasil,
especificamente a crise de representatividade no do Poder legislativo
decorrente da “distrofia ideológica” e também pelo falto da “pulverização
partidária” e alternância de poder do próprio sistema político.
Nesse sentido, de acordo com Bourdieu
(1989, p. 216) a racionalização dos tribunais “expressa a irredutibilidade às inconstâncias
dos conflitos sociais que reivindicam sentidos divergentes para a questão da
equidade.” Dessa forma, os juízes passaram estar atentos às demandas sociais, utilizando
de uma autonomia para interpretarem caso a caso para que assim determinar a
sentença, o que Garapon (1999,p. 223) denomina de “historização da norma”.
Assim, o veredicto é um produto da “luta simbólica” no campo jurídico como define
o mesmo autor:
“entre
profissionais dotados de competências técnicas e sociais desiguais, portanto,
capazes de mobilizar, embora de modo desigual, os meios ou recursos jurídicos
disponíveis, pela exploração das ‘regras possíveis’, e de os utilizar
eficazmente quer dizer, como armas simbólicas, para fazerem triunfar a sua
causa” ( BOURDIEU, 1989, p. 224).
Sob essa ótica, no Brasil contemporâneo, a “arquitetura
institucional” originada pelo processo de redemocratização e a Constituição Federal
de 1988 tiveram um importante papel no que tem se denominado “judicialização”.
Pois essa constituição tornou-se abrangente contemplando questões como seguridade
social, um sistema de saúde, etc. Nessa mesma linha, o sistema de controle de
constitucionalidade é um dos mais abrangentes do mundo, houve um fortalecimento
do ministério público e também a criação da defensoria pública. Somado esses
fatores passou-se a ter um maior protagonismos dos tribunais no caso
brasileiro.
Nessa
linha, o então proeminente advogado e professor de direito Luiz Roberto Barroso
diz:
“A
judicialização que, de fato existe, não decorreu de uma opção ideológica,
filosófica ou metodológica da Corte. Limitou-se ela a cumprir, de modo estrito,
o seu papel constitucional, em conformidade com o desenho institucional
vigente” (BARROSO,2009, p. 5-6.).
De acordo com Antoine Garapon (1999, p. 236-237), para a
constituição do campo jurídico, de haver universalização (o direito expressa o
que é de fato, não o que deve ser) e neutralização (construção passivas e
impessoais) da norma. Para ele o direito “O direito consagra a ordem
estabelecida ao consagrar uma visão desta ordem que é uma visão do Estado,
garantida pelo Estado
Ainda,
segundo Garapon (1999, p.127), os sentidos da interpretação se vinculam à uma
dinâmica da “Luta Simbólica” no campo jurídico de acordo com as posições
ocupadas pelos interpretes. Para ele, os “Doutrinadores” são encarregados da
elaboração puramente teórica e os “Operadores” que realizam a atividade
prática, como o trabalho do magistrado, que realizam atos de jurisprudência e
também contribuem para construção jurídica. Ele descreve o Veredicto como produto
da “Luta Simbólica” no campo jurídico, como pode-se observar o excerto abaixo:
“entre
profissionais dotados de competências técnicas e sociais desiguais, portanto,
capazes de mobilizar, embora de modo desigual, os meios ou recursos jurídicos
disponíveis, pela exploração das ‘regras possíveis’, e de os utilizar
eficazmente, quer dizer, como armas simbólicas, para fazerem triunfar a sua causa”
(GARAPON, 1999, p. 224).
Assim,
ao voltarmos a pergunta inicial uma possível resposta seria que a dinâmica do campo
jurídico se supõe que relações objetivas entre a universalidade, a procura
social e a lógica do trabalho jurídico. Ou seja, o direito demandado pela causa,
ao ser reconhecido como legítimo reflete a autonomia, a e a boa fundamentação do
trabalho do juiz à fim de garantir maior equidade social. Portanto, a
judicialização faz sentido quando demandas como a garantia de creches para
crianças, o reconhecimento da união homoafetiva, a legalização de aborto no caso
de fetos com anencefalia, a garantia dos direitos à vida e à saúde no caso de tratamentos
não disponibilizados pelo SUS, entre outras causas justas que já foram
demandadas e outras que haverão de serem reconhecidas.
Referências
BARROSO, Luiz Roberto.
“Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática”. Revista
Atualidades Jurídicas, n. 4, jan/fev-2009, Brasília: OAB Editora.
Disponível em: //www.oab.org.br/oabeditora
Acesso em: 16 outubro 2022.
BOURDIEU, Pierre. “A força do
direito: elementos para uma sociologia do campo jurídico”. O Poder Simbólico.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989 [Cap. VIII, , p. 209-254].
GARAPON, Antoine. O Juiz e a
Democracia: O Guardião das Promessas. Rio de Janeiro: Revan, 1999. [Cap. VI – A
magistratura do sujeito, p. 139-153]
Autoria: Joel Martins S.
Júnior
Aluno do 1º Ano de Direito (Noturno)
– UNESP-Franca
Franca, 16 de outubro de 2022.
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