Total de visualizações de página (desde out/2009)

3125053

domingo, 6 de abril de 2025

Sobre o que se pode pensar?

           O pensamento positivista, gestado e consolidado pelo francês Auguste Comte, é, sem dúvidas, uma das bases da consciência científica do Ocidente. Sua teoria, baseada na valorização dos fatos observáveis, em um ordenamento social calcado no fomento à razão e a busca de um olhar técnico naquilo que ele chamou de “física social”, torna-o influente até os dias atuais. 

Todavia, o ideal de Comte também é responsável por uma grande mácula na produção científica do mundo. Ao entender que a sociedade passa por níveis de evolução (a tal Lei dos Três Estados) e ao reforçar que existe apenas um caminho legítimo para o alcance do saber, o primeiro sociólogo foi responsável por jogar aqueles que já estão na periferia do mundo para a periferia do pensamento. Uma das pensadoras que sofreu com a dura marginalização, fruto das sequelas da permanência do ideal positivista no mundo, foi Grada Kilomba, que brilhantemente discorre sobre como o status quo da pesquisa científica criou um “sistema de castas”, no qual o pensamento que deriva de pontos de vista não brancos representam visões particulares e não científicas. Logo, olhares críticos ao fazer ciência, vindos de qualquer pensador que não seja europeu ou americano, são automaticamente taxados de ilegítimos.

Essa visão torpe, que inibe qualquer crítica ao modelo estabelecido e inebria toda a sociedade, resultou em um apagamento de saberes e uma desvalorização da própria sociologia, visto que, embora Comte buscasse uma “física social” baseada puramente na razão, o senso comum atual é de que as ciências humanas e sociais são menos importantes que aquelas consideradas “exatas”.  Isso foi visto, por exemplo, no governo da Argentina, no qual o programa econômico de Javier Milei propôs um duríssimo corte de gastos para universidades públicas e a redução drástica de financiamentos para pesquisas em humanidades, sob a justificativa de que não seriam relevantes e não se converteriam em lucro. 

Ademais, o positivismo, no anseio de racionalizar o pensamento da sociedade, resultou na segregação de pensadores críticos à ciência contemporânea e, ao valorizar um modo de pensar estritamente baseado nos conceitos de ciência modernos, resultou em uma inferiorização da própria ciência proposta por  Comte, que hoje, pelo senso comum, como representado no caso argentino, enxerga as humanidades como pouco importantes para o mundo. Logo, o pensamento positivista, que mirou na criação de uma ordem racional, científica e normativa, acertou somente no cerceamento do fazer ciência e na desvalorização da própria sociologia. 

https://ffyh.unc.edu.ar/noticias/01/2025/la-ffyh-rechaza-el-desfinanciamiento-de-las-ciencias-sociales-y-humanidades/ 

https://www.codigobaires.com.ar/2025-01-10/milei-avanza-en-la-destruccion-del-sistema-cientifico-a-pesar-de-las-denuncias-y-repudios-masivos-239834/ 


Nenhum comentário:

Postar um comentário