Na sociedade moderna, a
transgenitalização é tema altamente relevante e, concomitantemente, complexo.
Particularmente no Brasil, vive-se em meio à uma sociedade conservadora e,
muitas vezes, com repulsa ao diferente, fatores que não fazem senão tornar a
discussão do tema supracitado ainda mais difícil – e, consequentemente,
necessária. Neste diapasão, desponta o Direito como instrumento de transformação
social, tornando-se, cada vez mais, a ferramenta utilizada pelo indivíduo de
sexo biológico incompatível com seu próprio psicológico para suprir seus
anseios.
O julgado discutido em sala de aula
trata do caso de parte autora, geneticamente, do sexo masculino, que concebe a
si própria como mulher e enseja obter o direito à cirurgia de mudança de sexo. Relata-se, no texto, que desde muito cedo esta
sofre com rejeição de seu sexo biológico, passando aos 15 anos à ingestão de
hormônios visando feminilizar seu corpo, tornando-o mais compatível à sua
concepção sexual. O julgado em questão apresenta discussão sobre a condição do
transexual: aponta-se, por exemplo, que as entidades médicas o caracterizam
como patologia, conquanto o Conselho Federal de Psicologia a define como forma
de ser e viver, ambos concordando, no entanto, para a necessidade da cirurgia.
Diz-se, ainda, que “é preciso mostrar ao indivíduo que o transexualismo
não se traduz uma patologia, mas sim uma situação marcada por preconceitos
envoltos numa realidade histórico-social-política a propósito da ‘psiquiatrização’
da condição transexual”.
Neste espectro do Direito, pode-se
relacionar a questão às concepções de racionalidade elaboradas por Max Weber.
Segundo o autor, existem quatro espécies de racionalidade: formal, material,
teórica e prática, sendo que estas estariam em constante confronto. O Direito,
enquanto positivado e exclusivamente técnico, estaria englobado na
racionalidade formal, enquanto na material seriam levados em conta os valores,
exigências da ética e moral, e outro rol de fatores alheios ao ordenamento
jurídico. Ademais, Weber (2012, p.13) afirma que toda decisão jurídica deve ser
a aplicação de uma disposição jurídica abstrata a uma ‘constelação de fatos’
concreta.
Em tal panorama, o caso julgado
imbrica-se com a racionalidade formal e material Weberiana, em distintas
escalas. Enquanto formal, a decisão do judiciário respeita princípios
positivados e fundamentados do Direito pátrio, como, na Constituição Federal, o
respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, até, no Código Civil, o direito
à identidade. Na égide da racionalidade material, a sentença leva não só em
consideração puramente a lei, mas também as considerações éticas que podem ser
atribuídas ao caso, bem como o respeito ao indivíduo e ao seu livre arbítrio,
seu caráter psíquico e fatores sociais (como, por exemplo, o preconceito
sofrido pela parte autora). Faz-se, então, como antes visualizado por Weber,
decisão jurídica que se utiliza da disposição abstrata aplicando-a ao caso
concreto, segundo suas particularidades.
Desta forma, mesmo se tratando de um
caso que conflita com as características sociais típicas, obteve-se,
judicialmente, decisão justa e digna, que, resguardadas as distinções notáveis
no âmbito da ideologia, pode ser comparada e analisada, com efeito, sob a
óptica de Max Weber, anos após a elaboração de sua obra.
Gabriel Cândido Vendrasco - 1º ano diurno
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