A ADPF 186, impetrada pelo Partido Democratas, tinha em seus preceitos o argumento de que a imposição de cotas étnico-raciais pela Universidade de Brasília, configuraria um descumprimento ao princípio constitucional da igualdade. Isso se deu pois, de acordo com os partidários defensores dessa ideia, a ação afirmativa das cotas seria uma forma de impedir a "justa competição" entre as partes ingressantes na instituição pública em questão, "garantindo vantagens" para grupos específicos da sociedade, em detrimento de outros.
A problemática se dá no fato de que o espaco dos possíveis ao qual seria inserida a ação afirmativa das cotas não se dá na simplicidade de uma interpretação restritiva e pragmática das formalidades das normas constitucionais. O caminho para a igualdade material possui a necessidade de ampliação desse espaço dos possíveis, através da universalização do Direito, que seriam nesse caso o próprio princípio constitucional de liberdade e igualdade, sobre o direito de ingresso na educação superior. Estes só alcançariam sua universalização através da racionalização material do Direito, isto é, só poderiam de fato abranger todo o coletivo, caso se atentarem também às questões sociais, políticas e éticas que engendram a norma constitucional a qual foi objeto da ADPF.A partir disso, o STF julgou a ADPF como improcedente pois chegou a conclusão de que a utilização de ferramentas institucionais para de fato igualar as condições de acesso entre todos os ingressantes, evidentemente não se configura como uma garantia benéfica.
Com essa decisão, a Corte acaba por neutralizar o Direito, dando aos desiguais, condições únicas a eles que permitam se livrar (ao menos parcialmente, no quesito educacional) dessa desigualdade vivenciada por eles. A Corte, ao entender e agir de acordo, acabou por atual, tal como dita por Garapon, como uma "magistratura do sujeito", tutelando direitos que foram negligenciados por outros poderes dentro de um contexto social de necessidade históricamente construída.
Ainda nessa questão, percebe-se que a atuação da UNB em relação as cotas acaba também por ir de encontro à chamada historicização da norma, pois leva em conta essa "construção histórico-social" excludente (principalmente em relação aos negros e indígenas) mencionada acima para elaborar uma forma de combate, na geração de um potencial de mudança nesse contexto.
Em suma, nada mais é do que uma forma de aprofundar a democracia, não configurando o chamado "ativismo judicial", mas sim a defesa de direito adquirido por grupos sociais específicos. Essa defesa ocorre por necessidade em virtude da mobilização do direito por parte de um grupo (DEM) que representa a parcela que se sente ameaçada pela ação afirmativa, pois esta se dá como uma possibilidade de perda da posição benéfica em que vive. Ao mesmo tempo, a derrota judicial desse grupo não representa apenas a conservação do direito adquirido, mas um início de uma inversão paradigmática na justiça que sempre beneficiou a parcela branca, mas que agora se vira também para questões da razão negra e indígena.
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