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segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

A religião e o senso comum

Na constelação de diversas crenças que fazem parte da opinião pública, existem aquelas que são dotadas de tamanha força, seja por ser parte integrante da classe dominante, seja por simplesmente fazer parte do senso comum, que conseguem submeter toda a população às determinações dessas crenças. A crença cristã e seus valores, por exemplo, submete o Estado laico e os cidadãos que não fazem parte dessa religião aos seus valores pela enorme força de seu poder simbólico. De certa forma, conviver em um Estado em que os políticos eleitos representam não necessariamente as convicções e desejos políticos da minoria e sim o da maioria acaba fazendo parte da vida democrática. Essa condição se agrava ao perceber a amplitude do enraizamento dos ensinamentos cristãos, que atinge também a postura dos funcionários e representantes do poder público.
O problema do moralismo cristão e suas consequências na esfera pública que afeta os que não compactuam com essa religião compõe um cenário de difícil perspectiva de conciliação pela própria natureza da gestão democrática que permite em certos níveis, levemente atenuados pela constituição e sua aplicação pelos tribunais superiores, a institucionalizada opressão da minoria pela maioria. Discutir as implicações da doutrina cristã como problema quando para a maior parte da população ela não é verdadeiramente um problema acaba por dificultar ainda mais a emancipação de grupos excluídos por esse ensinamentos.
A ADPF 54 mostra um caso em que a maioria venceu. Em censo de 2014 foi revelado que quase 80% da população é contra o aborto. E acredito que diversos entrevistados, assim como o ministro, não se reportaram diretamente à religião ao escolher o “não”, mas sim à valores morais relacionados ao respeito a vida. Essa é imensa força simbólica do moralismo cristão, que se difunde não apenas aos seguidores de seus cultos. Esse caso revela a necessidade de se discutir a democracia e os limites da vontade da maioria.
Bourdieu fala da necessidade de um Direito que seja condizente com as perspectivas da realidade social mas a identificação de um “problema social” se torna seletiva ao colocar-se um “filtro” religioso. Além disso, o espaço político, nas palavras de Safatle, deve “não ser marcado pela afirmação da diferença, mas pela indiferença absoluta em relação a qualquer exigência identitária”.

Portanto, levando em conta essas duas afirmações desses diferentes autores, uma forma da realização dos anseios dessa minoria oprimida seria a realização de uma prática de Estado “indiferente às diferenças”, esvaziando assim qualquer afirmação de diferenciação do espaço político e tornando-se livre de dogmas religiosos. Sem isso, as questões que envolvem o pensamento cristão que ainda encontram correspondentes morais sempre se encontrarão força no senso comum, limitando assim o espaço dos possíveis da emancipação social.

Lucas Aidar da Rosa
1º Ano de Direito, Noturno.

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