domingo, 15 de setembro de 2019

Judicialização


O processo de judicialização, que é estudado por Maus e Garapon, consiste no processo de inchaço do poder judiciário, que no Brasil tem como representantes supremos o STF e STJ, e, consequentemente, esse poder passa a sanar importantes questões, quando o verdadeiro responsável por isso deve ser o poder Legislativo. Ingeborg Maus, ao afirmar que” quando a Justiça ascende ela própria à condição de mais alta instância moral da sociedade, passa a escapar de qualquer mecanismo de controle social — controle ao qual normalmente se deve subordinar toda instituição do Estado em uma forma de organização política democrática.” está analisando o processo mencionado, no qual o poder Judiciário passa a decidir acerca de assuntos que não cabem a esse, mas junto a isso não surgem mecanismos para frear essas decisões, o que representa uma ameaça à democracia e à vontade popular.
O Supremo Tribunal Federal julgou no dia 5 de maio de 2011 a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.277, a decisão tomada autorizou o casamento homoafetivo e ia contra o Artigo 1.723 do Código Civil, que definia família como a união entre um homem e uma mulher, e que negava, assim, o casamento homoafetivo.
A decisão em questão é um grande avanço para a democracia brasileira, uma vez que é um passo em direção ao fim da homofobia, que, atualmente, acarreta 1 morte a cada 23 horas[1] e assegura um direito que era negado aos casais de mesmo sexo. Embora a decisão do STF seja um avanço, ela foi tomada pelo poder judiciário, que não necessariamente condiz com a vontade popular, uma vez que apenas o Legislativo e o Executivo são eleitos pelo voto popular, isso caracteriza o processo citado de judicialização, que é uma ameaça à democracia brasileira, pois ao mesmo tempo em que o Judiciário tomou esse decisão benéfica aos casais homossexuais, o mesmo pode tomar decisões que não condizem com a vontade popular – uma vez que não existem medidas para frearem as decisões desses tribunais - só para satisfazer seus interesses privados, configurando, assim, uma medida antidemocrática.


[1] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/05/17/brasil-registra-uma-morte-por-homofobia-a-cada-23-horas-aponta-entidade-lgbt.ghtml

A falta de autodeterminação

15 de novembro de 1894
  “Todos esperam que agora tudo vai melhorar com o Prudente de Moraes. Eu sempre digo a meu pai que não pode entrar na minha cabeça que tenha alguma influência para nós aqui na Diamantina mudança de presidente. Meu pai diz que tem toda, que o governo é uma máquina bem organizada e que o presidente sendo bom e fazendo bom governo beneficia o Brasil inteiro e chega até aqui para nós. Eu lhe disse que só poderia acreditar nisso se o presidente mandasse canalizar nossa água e consertar nosso calçamento”.
MORLEY, Helena. Minha vida de menina. São Paulo: Ed. Schwarcz. (p. 195)

   Assim como os pais de Helena acreditavam ser tutelados pelo novo governo da época, o autor Antoine Garapon explica a tutelarização e os paternalismos, caracterizados pelo apego às tradições e, consequentemente, pela invenção de autoridades que visem protegê- las. A sociedade fragilizada e desigual torna os sujeitos submissos, os impedindo de aprender, como Garapon diz que deveriam, a discernir o limite entre o que pode ser permitido e o que eles não querem que seja, gerando a chamada “tolerância sob medida”
   A indiferença quanto às escolhas de cada um se extinguiu. Logo, os parâmetros morais são deduzidos de um comportamento social padronizado, generalização fortemente criticada pelo autor analisado. Refletida na democracia atual, essa moralização causa um sério comprometimento dos vínculos familiares, por exemplo, uma vez que colabora com o afastamento dos indivíduos. Os comportamentos familiares se diversificam, o que é atestado pelo número crescente de uniões livres. O francês, ao reforçar que o preço do individualismo é a própria tutelarização, entende que os problemas originados por essa hiperjurisdicionalização invadem as vidas dos cidadãos como um todo.
   Dito isso, é possível discutir a ADI 4.277, cuja pretensão baseava se em extensão do regime jurídico das uniões estáveis às relações duradouras entre pessoas do mesmo sexo. A única diferença entre eles e casais hétero sexuais reside na definição legal. Garapon entende que o direito se “empenha em explicitar as normas sociais, transformando em obrigações positivas o que era, ainda ontem, da ordem do implícito, do espontâneo”. Essa ideia é  muito coerente com o caso, visto que “a união homossexual, em nossos dias, é uma realidade de elementar constatação empírica” como diz o ministro Ricardo Lewandowski.
   Destaco esse voto pois ele resume de modo satisfatório pensamentos comuns dentre os outros juristas presentes, sendo que o judiciário entendeu seu dever de:" exigir o devido enquadramento jurídico dessas relações que são fundadas no afeto, na busca da felicidade, no respeito e desenvolvimento pessoal de seus integrantes.” Assim, concorda com Garapon no quesito de autodeterminação, segundo o qual cada cidadão passa a ser seu próprio legislador, devendo prever as conseqüências sociais de seus atos já que são capazes de governar a si mesmos com prudência. Porém, as pessoas procuram tão incessantemente por uma “segurança moral”, que se interessam mais pelo direito positivado do que pelo bem estar dos cidadãos.
      Os sujeitos são constantemente condenados a interiorizar normas de comportamento, frutos do grande controle do Estado, caracterizando a "magistratura do sujeito". Entretanto, quando o STF julga por unanimidade procedente as presentes ações diretas de inconstitucionalidade para que sejam aplicadas às uniões homo afetivas, percebe- se a compreensão da lógica improdutiva do proibido- a qual é ineficiente- como também a capacidade da lei geral de apreender a diversidade de valores. Na perspectiva Garaponiana, a sociedade deve se adequar a novos princípios a cada situação. Repressão é incapaz de eliminar a intimidade entre essas pessoas  e o bom senso mostra que a justiça não deve utilizar seu poder para tanto.  Há esferas que necessitam de maior atenção: a canalização da água, o calçamento, dentre tantas outras.

Laura Filipini Noveli
1o ano- Direito Matutino

A atuação jurídica X inadequações das leis perante a sociedade contemporânea

Desde de os primórdios da humanidade há relatos da existência de relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo.Todavia, a sociedade brasileira, ainda no seculo XXI, vê a questão homoafetiva como um tabu e, em decorrência disso, o país apresenta altos índices de casos de homofobia. Nesse sentido, diante de uma sociedade descrente nos poderes legislativo e executivo, tendo em vista que a maior parte da população não se sente representada por esses grupos, foi transferido à figura dos juízes o papel de representar a mais alta instancia moral da população brasileira.

Sob esse viés, o Supremo Tribunal Federal ao tratar acerca da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.277 ( ADI 4277) decidiu - por unânime - reconhecer a união entre pessoas do mesmo sexo de forma igualitária a de pessoas de sexos distintos, tendo como fundamentação a proteção da dignidade da pessoa humana e a igualdade entre os cidadãos. Ao analisar circunstâncias como essa, o jurista Antonie Garapon, em sua obra denominada "O juiz e a democracia. O guardião das promessas", versa sobre o fato de as pessoas, ao se sentirem órfãs de atuações políticas que representem seus anseios, tende a recorrer ao judiciário, atribuindo a esse plenos poderes, o que, na análise da socióloga Ingeborg Maus, em seu livro chamado "Judiciário como superego da sociedade. O papel da atividade jurisdicional na 'sociedade órfã' " é um fato preocupante, tendo em vista que desestabiliza a equiparação entre a divisão dos três poderes, idealizada pelo filósofo Montesquieu. Nesse sentido, a socióloga afirma que esse fator é um fenômeno politico-social e o mesmo fica evidente ao analisar a atualidade em que o Ministro Sergio Moro é visto por muitos como um salvador da pátria o qual é impecável e acima de qualquer possível questionamento.

Ademais, Garapon afirma que as pessoas são guidas, inicialmente, por aquilo que denomina como "magistrados naturais" - pais, parentes e Igreja - e, posteriormente, passam a vislumbrar os juízes como supridores dessa função, "o indivíduo libera-se da tutela de seus magistrados naturais, precipitando-se naquela do juiz estatal" (pagina 140). Entretanto, perante o Neoliberalismo, se sentem "desabrigadas" e por isso, convergem em direção novamente de seus magistrados naturais, fato que é perigoso, uma vez que abre margem para a atuação de políticos com discursos como o de Donald Trump e Jair Bolsonaro, pois se utilizam da valorização desses âmbitos sociais para se promoveram, disseminando discursos de ódio.

Isto posto, vale ressaltar que, embora a exacerbada atuação dos magistrados seja um fator a ser ponderado, ela é imprescindível nas atuais circunstâncias do país, pois do contrário, as pessoas homossexuais ainda permaneceriam tendo seus direitos fundamentais violados com amparo do ordenamento normativo, o que daria respaldo a atitudes violentes em função da orientação sexual das mesmas. Por fim, é imprescindível evidenciar que o reconhecimento equiparado entre as relações heteroafetivas e homoafetivas garante que ambas apresentem direitos assegurados pela Constituição como pensão por morte e herança, o que é essencial para a manutenção do regime democrático o qual vigora no país, ao menos em tese.

Danieli Calore Lalau - 1° ano - Direito: noturno

Com Garapon, entendemos que “Pela voz do juiz, o direito se empenha em um trabalho de nominação e de explicitação das normas sociais que transforma em obrigações positivas o que era, ainda ontem, de ordem do implícito, do espontâneo, da obrigação social. A partir do exposto, é dado que o Direito, na modernidade, arquitetado por magistrados, se empenha em promover a tutelarização do sujeito, apostando na moral e no apelo social preenche lacunas deixadas pelo legislativo para criar meios legais na qual os cidadãos possam recorrer.

Em 2011, o STF atuou no julgamento do ADI Nº 4.277. Nesse, os magistrados deram procedência ao reconhecimento da união homoafetiva como instituto jurídico. Contudo, a problemática que sustenta o debate se encontra no fato de tal procedimento se opor ao determinado na organização legislativa, como no Artigo 1723 do Código Civil que reconhece a entidade familiar como sendo a união familiar entre homem e mulher. Dessa forma, o judiciário se legitima a propor uma via para que pautas necessárias de proteção judicial legal, como a união homoafetiva, surjam. Para isso, pratica a tutelarização, visto que muitos magistrados para dar procedência a seu voto sustentaram-se em dogmas como o princípio da dignidade humana, autonomia da vontade, direito à autoestima e direito a busca da felicidade. Com isso, entende-se a máxima de Garapon: “O direito transforma-se então na moral por ausência.”, dado que o preenchimento dessa lacuna social do casamento homoafetivo ser produzido pelo uso de princípios morais e direito subjetivos.

Dado o exposto, é justo considerar para a analise a intenção do judiciário em realizar tão provimento para, como escreve Garapon, “apaziguar o molestar do indivíduo”. Com isso, surge o fenômeno, também exposto pelo autor, da “magistratura do sujeito”, no qual o indivíduo reivindica para si um modelo de tutela não descrita no ornamento jurídico, entendendo que o legislativo não contempla a diversidade que a mudança de realidades sociais obriga, tornando-se legislador de si mesmo. Fato é que o direito certamente se encontra em expansão fazendo a necessidade de julgamento como o ADI 4.277, fortalecendo o importante principio de "Direito como antecipação", que assim como escreve Garapon "o direito do juiz não pode ser  outro senão um direito para o amanhã.".

Portanto, o fato tratado não tem sua problemática vinculada ao seu conteúdo, mas sim a seu meio. É certo que a regulamentação do casamento homoafetivo é um resultado necessário, progressista e relevante. Porém, a via da judicialização é um tema delicado, dado que ao mesmo tempo em que promove assertivas que promovem progresso como ocorrido no ADI 4.277, se mostra frágil e perigoso ao não proteger temas como alguns corrupção e mantimento de privilégios políticos.

Matheus de Vilhena Moraes – Direito (noturno)

A judicialização da vida privada


    No ano de 2011, foi julgada na mais alta corte da república uma ação direta de inconstitucionalidade acerca do reconhecimento jurídico do instituto de união estável civil de casais homoafetivos. A decisão do tribunal seguiu sentido favorável ao entendimento de que se deve reconhecer como instituição jurídica a união estável homoafetiva. Neste sentido, vê-se como a mobilização do direito em assuntos de natureza privada, tão privada quando a própria união civil, tornou-se aspecto característico da tônica jurídica contemporânea.
            Em se tratando da mobilização do direito para a solução de conflitos privados que outrora eram tutelados por outras instituições que não a justiça estatal, faz-se necessário compreender o pensamento de autores como Antoine Garapon. Na sua teoria, o pensador francês discute a forma com a qual os tribunais tomam protagonismo nas mudanças sociais a partir de uma noção de que se trata de um fenômeno político-social. Há de se citar a máxima que ilustra esta ideia, “a justiça vê-se intimada a tomar decisões em uma democracia preocupada e desencantada.”. Assim, em um cenário de omissão dos poderes constituídos, o Judiciário acha-se em um lugar cuja atuação deve seguir as mudanças sociais. Ademais, o acionamento da Justiça por indivíduos para conseguir a eficácia de direitos e garantias, na visão de Gararpon, é um fenômeno natural. Para ele, a evolução da sociedade para um estado burocrático, fez com que o povo perdesse de vista modos mais tradicionais de soluções de conflito, absorvendo assim as técnicas da burocracia estatal para a elucidação de óbices particulares, como o casamento e a união estável, por exemplo.
            Na mesma linha, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso reconhece que o fenômeno da judicialização se trata de um modo de transmutar política em direito. O ministro ainda ressalta que o Supremo não toma nenhuma função que não é de sua atribuição constituída. Para ele, as decisões da corte cumprem o trabalho de confirmação e de garantir a eficácia de direitos constitucionais definidos pelo Poder Constituinte Originário em 1988. Ademais, reafirma que o direito deve absorver tendências sociais que outros poderes foram omissos em acatar, visto que diz que o juiz não realiza atividades mecânicas e deve, portanto, estar atento aos anseios da sociedade. No caso da ADI 4277, o anseio da comunidade LGBT em ter direito às mesmas proteções jurídicas dos casais heteroafetivos, uma vez que outros poderes foram omissos em atende-lo, coube ao Judiciário decidir.
            Por fim, a tutela do Poder Judiciário em questões privadas representa a forma com a qual a população civil encontrou para que o Estado reconheça direitos que constitucionalmente estão previstos. Na decisão analisada, a mobilização do direito para o reconhecimento de direitos de casais homoafetivos em igualdade aos heteroafetivos figura de modo enfático o protagonismo do Judiciário em resposta a anseios populares ignorados pelos demais poderes. Enfim, dois anos depois da decisão do STF, em 14/05/2013, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Resolução nº 175, que consiste em ato normativo que reconhece o a união estável civil entre pessoas do mesmo sexo.

Luiz Felipe de Aragão Passos. 1 º ano de Direito/Diurno.

Desigualdade e judicialização: o veneno e seu antídoto para a vida em sociedade


Em uma sociedade democrática, é defendida uma ideia de que nela todos tem ampla liberdade e, sobretudo, igualdade para fazer uso dessa liberdade. Todavia, Antoine Garrapon discorre em sua obra “O juiz e a Democracia” sobre como essa igualdade não é real, existindo grupos que possuem mais direitos que outros dentro de um mesmo grupo social. Assim, negligenciados pelo poder executivo na dimensão dos direitos concedido por ele a toda a população, esses grupos minoritário têm que buscar no Poder Judiciário o exercício de direitos essenciais à dignidade humana, dessa forma, dão vida ao processo de judicialização do Direito.
No presente, esse processo é cada vez mais vivenciado dentro de diversas instâncias dos tribunais, com maior destaque ao casos levados para a apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF), para onde são levadas demandas de grupos que se veem à margem do Direito nacional, situação motivada por fatores por muitas vezes políticos, como ressalta Ingeborg Maus em “Judiciário como superego da sociedade”. Desse modo, à última instância da justiça brasileira foi levado o caso acerca da união estável homoafetiva, na forma da ADI 4.277, a qual foi considerada como constitucional e um direito de toda a população homoafetiva de forma unânime pelos Ministros. Ao analisarmos tal situação sob o ponto de vista de Garrapon, podemos ver que houve a tutela da sociedade pelo judiciário, uma vez que esta não viu outra senão esta alternativa para que pudesse ser feita universalidade de direitos, no caso, o de obter a união estável para todos os indivíduos, sem distinção de gênero ou orientação sexual.  
Ainda, cabe lembrar que o texto do Art.1723º do Código Civil, que trata das possibilidades de casamento, descreve casal como “união entre homem e mulher”, mas que o Ministro Ayres Brito, relator do caso, defende em seu voto como algo a ser interpretado na forma mais ampla possível, de forma a garantir o preceito constitucional de não discriminação e igualdade de direitos. Com isso, o ministro agiu de acordo com o que Garrapon entende como o papel fundamental de um jurista: o de utilizar-se de seus atributos intelectuais a fim de interpretar o Direito com o intuito de fazer a universalização dos direitos ser vigente dentro da sociedade. Por fim, o relator ainda chama a atenção para a necessidade do raciocínio antecipatório em um caso de concessão de direitos como esse, isto é, não se trata apenas de conceder a união estável aos casais homoafetivos, se trata também dos outros direitos de família, como adoção, ou sucessórios, como a herança, para que essa igualdade seja uma igualdade de fato e não apenas formal.
Contudo, essa judicialização não é visto como benéfica à sociedade por alguns estudiosos, como é o caso de Maus, que entende que esse processo apenas infantiliza os indivíduos, fazendo com que não mais ajam por si só, mas sim dependam sempre das sentenças dos juízes, que agem como os tutores dessa sociedade, um verdadeiro superego. Por isso, a autora entende que nessa atitude, o judiciário tornando-se autorreferente e se distanciando dos dizeres constitucionais, há um risco à democracia, pois os juízes passam a arbitrar sobre toda a vida em sociedade, podendo atender a interesses individuais, alertando, ainda, para a volta dos regimes autocráticos.
Porém, esse processo só passa a existir no momento em que parcelas da sociedade são negligenciadas pelo Estado e, por isso, uma vez que a Carta Magna brasileira tem como um de seus princípios fundamentais a igualdade sem distinção entre todos os cidadãos, não há porque questiona-lo, pois ele só faz com que ele se concretize. Portanto, ao tutelar a sociedade no que tange aos direitos fundamentais dos indivíduos, os juízes apenas ocupam o lugar dos juízes naturais, como os pais, a Igreja, como destaca Maus, tornando-se os tutores legais, com a vantagem de se basearem em um ordenamento comum para todos, fazendo realizar-se a universalização do Direito que tanto defende Antoine Garrapon. Dessa forma, coisas simples como casar-se, formar uma família e ter a liberdade de expressar sua forma de amar em público torna-se a realidade de todo e qualquer cidadão brasileiro e não apenas uma possibilidade para aqueles que se enquadram em um padrão conservador previamente definido.

Júlia Veríssimo Barbosa - Direito (Noturno)

Muito se discute, atualmente, sobre o crescente protagonismo do poder judiciário no Brasil. Coloca-se em cheque, desse modo, o sistema de freios e contrapesos de Montesquieu, em que cada poder é autônomo e deve exercer determinada função, sendo controlado pelos outros, a fim de atingir o equilíbrio, a harmonia e a independência entre eles.
Antoine Garapon, em “O juiz e a democracia”, atualiza o debate sobre a nova função da justiça: a magistratura do sujeito. Explica que a demanda pelo poder judiciário é cada vez maior, atendendo ao indivíduo moderno que enfrenta um colapso dos parâmetros sociais e culminando na judicialização das relações sociais. No mesmo sentido, Ingeborg Maus versa sobre o infantilismo do sujeito, que se abstém da tomada de decisões. Essas que, agora, são produtos das decisões judiciais, consequência da perda de consciência das relações sociais e da veneração da justiça como fonte da moral social.
Paralelamente, pode-se trazer uma das decisões do Supremo Tribunal Federal mais comentadas nos últimos anos, que reconheceu a união homoafetiva como instituto jurídico. Buscou-se interpretar conforme à Constituição o artigo nº 1723 do Código Civil brasileiro, que diz “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família." À época, a discussão sobre a atividade legisladora do judiciário ganhou força, com afirmações de que quem deveria tomar determinada decisão era o poder Legislativo. Por outro lado, é papel da Suprema Corte guardar a Constituição e os princípios pertencentes a ela, entre esses o direito à liberdade, igualdade, autonomia da vontade e intimidade. É fato que a sociedade avança e se modifica a cada dia, e o Direito, como parte das Ciências sociais, deve reinventar-se e adaptar-se ao instituto humano. A redação do artigo se mostrou unilateral e segregadora e, portanto, o STF deveria interferir para garantir os princípios gerais a todo e qualquer cidadão.  
A discussão sobre o protagonismo do judiciário é, sem dúvidas, importantíssima para garantir a tripartição dos poderes e o funcionamento do regime democrático. É necessário, no entanto, ter cautela para que, na tentativa de frear os exageros, não se engesse totalmente as funções das instituições democráticas.


Julia Martins Rodrigues- matutino

A manutenção e a judicialização

Viver no Brasil nos últimos cinco anos não restou dúvida da força política que exerce o poder judiciário na atualidade, principalmente no nosso país. A Operação Lava-Jato, comandada pelo ex juiz Sérgio Moro e pelo procurador Deltan Dallagnol, teve desdobramentos nunca antes vistos nas terras tupiniquins, incluindo as prisões de um parlamentar em atividade e de um ex presidente da república. Mesmo muito desmoralizada atualmente, graças às revelações da série de reportagens intitulada Vaza Jato, do The Intercept Brasil, a Operação e os membros do sistema judiciário como um todo ainda são peças chave na política nacional e contam com uma grande gama de entusiastas.
   Muito além das polêmicas investigações, os magistrados têm estendido seu leque de atividades: as leis criadas em tribunais são cada vez mais comuns e tocam, na maior parte das vezes, em questões extremamente polêmicas. É o fenômeno popularmente chamado de judicialização da política, caracterizado justamente pelo aumento da participação do judiciário nas decisões políticas do país. Um exemplo a ser discutido é a ADI 4.277, votada em 2011 pelo Supremo Tribunal Federal. Essa Ação, que versava sobre a proibição da união homoafetiva em território nacional, terminou permitindo legalmente a mesma. O grande debate em torno da questão não é sobre o conteúdo do caso julgado, visto que esse representa uma enorme vitória de uma minoria historicamente oprimida e silenciada. Discute-se o método, visto que o judiciário é o único dos poderes que não é eleito pelo povo e, por isso, não representa a vontade popular. 
   A autora Ingeborg Maus coloca pontos importantes sobre a questão da judicialização. Ela acredita que o judiciário utiliza de manifestações populares para aprovar temas interessantes para eles próprios. O grande risco é que ao ceder aos magistrados a possibilidade de se colocarem como árbitros morais da sociedade eles começam a calcar, pouco a pouco, uma posição que não permite críticas ou qualquer controle social. É como o exemplo revelado pela Vaza Jato: acreditando serem paladinos da justiça social e possuírem respaldo de toda a população "de bem", passou-se por cima de inúmeros preceitos judiciais e, inclusive, morais, sem que houvesse força política ou social suficiente para frear. 
   É sempre arriscado fazer a crítica de uma forma encontrada por minorias para se inserirem e conquistarem espaço em uma sociedade tão estratificada. Mesmo assim, vale o esforço da crítica pelo fato de saber que, sendo um grupo seleto de indivíduos que participam desse poder e vindo eles muitas vezes de um lugar privilegiado da sociedade, há enorme chance de que esse poder concentrado seja usado para perpetuar padrões já vigentes. É mais um risco para a nossa tão frágil democracia.

Gustavo Carneiro Pinto
1º Ano de Direito - Noturno

O judiciário e os problemas da democracia liberal


No capítulo VI - a magistratura do sujeito, aborda sobre um fenômeno contemporâneo que envolve o judiciário, que é a grande quantidade de demandas que ele recebe e se vê na obrigação de tomar decisões. Isso ocorre, segundo o autor devido a um problema envolvendo a igualdade de condições entre os indivíduos, problema próprio das democracias liberais. Com a perda da autoridade natural, a sociedade busca na figura do juiz uma autoridade capaz de refazer os laços sociais. A respeito dessa última característica, Maus, em “Judiciário como superego da sociedade: o papel da atividade jurisprudencial na ‘sociedade órfã’”, tece críticas no sentido de o poder judiciário se tornar o substituto das antigas autocracias, com seus aspectos negativos levados em consideração.
Esses pensamentos são extremamente importantes para buscar uma compreensão do fenômeno jurídico na contemporaneidade, para entender se ele estaria se tornando tirânico ou cumprindo sua função democrática. Dessa forma, é válido fazer uma análise do julgado a respeito do reconhecimento de direitos na união homoafetiva, decisão tomada pelo STF a favor desse reconhecimento, por votação unânime, equiparando dessa forma a condição de casais homoafetivos à de casais heteroafetivos, no âmbito de direitos iguais. Essa decisão foi tomada através da interpretação conforme a constituição, onde a lei pode tratar da definição de casal como homem e mulher, os ministros não reconhecem que por isso estaria impondo uma limitação, defendendo a livre expressão da sexualidade humana como princípio fundamental expresso na constituição.
Essa decisão mostra a nova realidade tratada pelos dois autores, com a provocação do judiciário para o reconhecimento dos diretos de um grupo minoritário, que vê no judiciário uma forma de conseguir sua legitimação. Dessa forma, o que o judiciário faz é olhar para as exigências desse grupo, e através de uma análise conforme a constituição reconhecer os direitos dessas pessoas. O papel do judiciário não é dessa forma, o de um monarca autocrático que toma uma decisão arbitrária baseada em um juízo de valor, mas sim o papel de uma instituição importante dentro da democracia, que, ao ser provocado, deve apresentar uma decisão ao caso, tendo a Constituição como guia para sua decisão.
 

Gustavo Dias Polini - Direito Noturno

Ambivalência entre a judicialização da política e a morosidade do Legislativo no universo jurídico


               O Supremo Tribunal Federal, durante o julgamento da ADI 4277 e da ADPF 132, reconheceu, por unanimidade, a união estável para casais homossexuais. Tal decisão representou um considerável avanço para a implementação da isonomia entre casais com diferentes orientações sexuais, além de significar uma ação importante no sentido de evitar a discriminação odiosa e salientar a dignidade da pessoa humana. Essa atuação do judiciário brasileiro possibilita uma análise dicotômica entre o que se considera como  funções legítimas de um tribunal de instância superior, utilizando, principalmente, os autores: Antoine Garapon e Ingeborg Maus.
            A ministra Carmém Lúcia argumentou que o parágrafo 3°. do artigo 226 da C.F apresenta um rol exemplificativo e não taxativo do que se considera como família, destacando também que a dignidade da pessoa humana pressupõe a sua liberdade. A votação favorável da  ministra, que culminou com o seu posicionamento, foi seguido pela totalidade da corte e demonstra como no mundo contemporâneo, segundo Garapon, a lei geral é incapaz de prever as dificuldades que podem surgir. Por essa razão, o sistema jurídico acaba delegando ao juiz a função de “conselheiro prudente” e “ministro da equidade”.  Já no capítulo “A magistratura do Sujeito”, Garapon irá explicar por que o individualismo e a liberdade, proporcionados pela Democracia, vão fomentar uma maior intervenção do judiciário na vida particular de cada indivíduo (fato evidenciado pela ADI 4277). Nas palavras do autor: “O preço do individualismo é uma crescente tutelarização do sujeito”, isto é, uma judicialização das relações sociais.
            Uma questão que pode ser colocada, a partir da análise do julgado, é a seguinte: até que ponto o aspecto axiológico das decisões  traz insegurança hermenêutica? Tanto os ministros Lewandowski como Gilmar Mendes reconheceram a literalidade do artigo 226, afirmando que a Constituição Federal reconhece a união estável para pessoas de sexo distinto, intenção prevista pela Assembleia Constituinte e, portanto, a união estável de pessoas do mesmo sexo seria, segundo Lewandowski, um quarto tipo de família não previsto na Carta Magna de 1988. A atitude do judiciário de ir além do texto positivado pode significar uma ultrapassagem de seus limites estabelecidos pelo Mecanismo de Freios e Contrapesos, previsto no artigo 2°. da Constituição. Nesse entendimento, vale trazer uma frase do filósofo Confúcio para a discussão: “Leve um punhado de terra todos os dias e logo terás uma montanha”. Essa metáfora se aplica no sentido de que se passarmos a legitimar esses tipos de atitude do judiciário, logo elas poderão servir de base para a instalação de um regime de exceção. Esta hipótese, longe de ser uma reductio ad absurdum, é considerada por Maus em seu artigo. De acordo com a autora: “como demonstrado de modo eloquente pelo regime nazista, o terror político aberto encontra no direito formal um obstáculo” e “o juiz-rei do povo de Adolf Hitler deve libertar-se da escravidão da literalidade do direito positivado”. A produção de decisões além das normas constitucionais é baseada em uma moral superior (conceito abstrato) e há um grande problema em tal situação, segundo Ingeborg Maus, pois quando a justiça ascende a mais alta instância moral da sociedade, deixa de estar sujeita a qualquer mecanismo de controle social, ao qual normalmente se deve subordinar toda instituição do Estado em uma forma de organização político-democrática. Nessa linha de raciocínio, cabe destacar que nenhum magistrado é o hipotético Juiz-Hércules teorizado por Dworkin, um ser abstrato com plena capacidade de integrar de forma perfeita regras, princípios e motivações pré-jurídicas. Os juízes reais são suscetíveis a interpretações mais subjetivas do que o desejado, o que pode trazer a já citada questão da insegurança hermenêutica.
            Sem dúvida o reconhecimento da união estável homoafetiva trouxe melhorias crucias para a nossa sociedade plural. Entretanto, como já advertido por Maus, é necessário sempre olhar com desconfiança e senso crítico para os posicionamentos da Suprema Corte que de algum modo excedam as suas funções, com o intuito de justamente evitar uma possível fragilização do regime democrático vigente.

Nicolas Candido Chiarelli do Nascimento
Período Matutino
Turma XXXVI

           

Tecido social dilacerado: será o judiciário o melhor caminho?


A década de 50 foi um dos períodos humanos nos quais a democracia ganhou certo “tônus muscular” dentro do tecido social. Graças às consequências das grandes guerras e das crises capitalistas, o tecido social encontrou “salvação” em uma regime democrático representativo em que predominasse um princípio fundamental: a igualdade. Posta de forma artificializada em um mundo de crescente globalização, o campo que toma a praticidade institucional- o direito- invade campos antes postos ao equilíbrio da própria moral e dos costumes. Segundo as palavras de Antonie Gurapon:
“A igualdade de condições subverte profundamente o equilíbrio social. O desenrolar desse dogma democrático fragiliza os lações sociais, paralisa qualquer influência natural sobre os outros e aguça, portanto, os conflitos. Ela acaba com a autoridade tradicional, abala a organização espontânea da sociedade e mina a ordenação hierárquica que, ao atribuir um lugar de cada um, limitava as ocasiões de conflito”
Sobretudo ao que o autor revela sobre a “autoridade local”, há certa evidência sobre a translocação dos antigos micro poderes (chefes familiares, líderes locais e entre outros) para a figura de uma autoridade: o juiz.
Sob o prisma da atual situação do meio sócio-político, as relações se liquefizeram. Hoje, as pautas não são diretas e objetivas, uma vez que grupos da sociedade civil se tornaram difusos e plurais. Dessa forma, a luz do pensamento de Ingerborg Maus, nasce a distrofia da representatividade, isto é, partidos tornam-se incapazes de assumir todas as diretrizes dos grupos.
Além disso, Maus utiliza de uma interessante comparação metodológica entre a sociologia e a psicologia Freudiana ao tomar como análoga a relação entre o Complexo de Édipo e a crise da representatividade. A pensadora, tendo isso em mente, disseca a concepção de um intelecto social cuja tendência é infantil: posta a carência de apegos objetivos, encontra na figura do judiciário, sobretudo nas cortes constitucionais, um apego paterno de resolução de conflitos.
Posto tal análise, destaco a “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.277” cuja temática fora a interpretação análoga à constituição que possibilite o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Apenas nessa linha introdutória, assim sendo, torna-se evidente a contundência dos autores citados alhures: a perplexidade temática exposta é claramente uma pauta dos representantes, porém chegou ao crivo do STF devido à inércia legislativa. O direito, destarte, adentou nas esferas mais íntimas da sociedade brasileira e é concretizada por um órgão colegiado não eleito diretamente. Dessa forma, mesmo coerente, a decisão de esvai a priori pelo mérito institucional.

O fenomeno da judicialização no cenário brasileiro


     Foi julgado em 2011, no Supremo Tribunal Federal, ação direta de inconstitucionalidade No 4.277, que versava sobre o reconhecimento da união homoafetiva como instituto jurídico. O art. 1.723 do Código Civil diz que é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher. Ademais, o reconhecimento do direito à preferência sexual recai no princípio da dignidade humana, do direito à autoestima, do direito à busca da felicidade, e da autonomia da vontade, sendo a união homoafetiva como entidade familiar um importante passo jurídico não expressamente abarcado nos textos normativos. Por unanimidade, apesar de algumas declarações em alguns votos acerca da função do próprio judiciário em tal decisão, a Corte decidiu pela procedência do pedido.
     Pode-se traçar um paralelo entre o julgado e o tema tratado pelos autores Antoine Garapon e Ingeborg Maus, a respeito da judicialização da política. Este é um fenômeno político-social, e que vem acontecendo desde os anos 90. O “protagonismo” dos tribunais não é simplesmente uma vontade desses de se tornarem um “superergo” da sociedade, como diz Maus. O sistema de justiça é provocado, quando as políticas públicas não se efetivam e não se movimentam devidamente, não suprindo as demandas e anseios da sociedade, como o direito do acesso à saúde, afetividade paterna, dispor livremente de sua identidade de gênero, etc. Assim, os indivíduos se libertam de seus “magistrados naturais”, sendo aqueles considerados os “primeiros”: a família, a igreja e a escola, como assim define Garapon. Mas em contrapartida, essa maior autonomia do indivíduo o faz ficar à mercê do controle do juiz e da tutela do Estado.
     Garapon também trata da “magistratura do sujeito”, sendo a ideia de que cada sujeito reivindica para si um tipo de tutela não contemplada na justiça, como se a lei geral fosse incapaz de apreender a diversidade de valores e realidades, tornando-se legislador de si mesmo. Assim, o poder do juiz seria a de interiorização da norma e de se colocar no lugar da autoridade faltosa -senadores e deputados federais- para intervir nas particularidades dos cidadãos, e não apenas se manter como um poder corretor. Contudo, o Legislativo não “foge” da resolução de temas importantes como esse, sendo muitas vezes uma ação por inação, pois está focando em outros assuntos de também importância e relevância social. No entanto, uma articulação entre o judiciário e o legislativo é muito difícil, e por isso o magistrado procura pensar o futuro do Direito e acaba por intervir e decidir sobre determinadas questões morais, o que às vezes extrapola suas próprias competências e seu devido campo de ação. Não tem  como imaginar um judiciário neutro, afirma Maus, pois a dinâmica social se modifica o tempo todo, mas é necessário verificar se esse protagonismo não se revela uma falsa democracia; um “paraleviatã”.
     Por fim, é de suma importância a reflexão sobre os limites de atuação dos três poderes, para que não seja recorrente a exorbitação de um sobre o outro. Além disso, a sociedade precisa amadurecer e colocar temas como esse em discussão; ela deve ser ouvida e se colocar politicamente, para que o legislativo crie modificações, os problemas sejam gradativamente resolvidos e as lacunas preenchidas. Essa é uma construção histórica, e tanto o Direito quanto os Tribunais contribuem para com isso.  No entanto, apesar de casos como a ADI No4.277 demonstrarem como essa interpretação não limitante do próprio texto constitucional e seus princípios pode acarretar avanços normativos e mudanças sociais extremamente positivas e necessárias, é também preciso lembrar que a judicialização pode vir a ser algo danoso à democracia, uma vez que não há um controle pré-estabelecido do judiciário.

Raquel Colózio Zanardi – 1o ano Direito matutino 

A função do Judiciário e o custo da Democracia

Os ministros do Supremo Tribunal Federal, ao julgarem, no dia 5 de maio de 2011, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo. As ação foi movida na Corte, pela Procuradoria-Geral da República.

A questão gerou fortes debates à época por um entendimento de que a questão seria competência do legislativo, já que a constituição traz no Inciso III do Artigo 226º que: "é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento". Alguns Parlamentares e Juristas defenderam que a questão devia ser posta ao Legislativo por meio de Projeto de Emenda Constitucional, já que seria nescessária uma alteração explícita no texto.

Isso nos remete ao notório protagonismo que o judiciário vem assumindo na sociedade, a chamada judicialização da política e das relações sociais. Segundo Antoine Garapon a justiça é convocada com o intuito de apaziguar o molestar do indivíduo sofredor. "A justiça se vê obrigada a tomar decisões em uma democracia preocupada e desencantada"

Voltando ao caso concreto, deve-se perceber o sofrimento ao qual está sujeito um indivíduo que não tem sua união estável reconhecida devido às sexualidade. Ao não ter esse direito reconhecido questões "simples" como sucessão , partilha de bens e adoção se tornam impossíveis, aumentando ainda mais o "molestar" do invíduo LGBT que já sofre diariamente.

Por outro lado, poderia se argumentar que a iniciativa do judiciário violaria suas competências e poderia até mesmo ser um risco à legitimidade democrática, afinal, como analisou Ingeborg Maus: "(O tribunal superior) atua menos como guardião da constitução do que como garantidor da própria história jurisprudencial"

Não se pode esquecer, no entanto, que a judicialização não é a causa da crise democrática mas uma de suas muitas consequências. A crise de representatividade, especialmente no poder legislativo, é conhecida por todos e embora se possa enumerar causas, como a "distrofia ideológica" e a "pulverização partidária", a grande verdade é que não se sabe uma causa responsável pela crise da democracia representativa, só se sabe que ela existe.

Também vale ressaltar que os ministros, em seus votos, em momento algum fugiram à lei- embora a tervergissem- o ministro Ayres Britto, conforme o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça ou cor. Considerando as -muitas- contradições do Ordenamento Jurídico brasileiro o Direito que se transveste de técnico e não político mostra suas caras. Porque o artigo 226º se sobreporia ao 3º? Porque a retórica seria verdadeira? A função do magistrado é analisar o caso concreto e, em caso de antinomia, decidir, com base em critérios a lei que prevalece no caso analisado.

Por conseguinte, afirmar que uma lei simplesmente se sobrepõe sem expor os critérios que levaram à essa conclusão é disfarçar uma opinião política de decisão técnica e jurídica. De fato, existe um maior protagonismo dos tribunais da mesma forma que existe uma menor confiança nos representantes eleitos, isso não pode impedir, no entanto, que o judiciário exerça sua função teleológica: a aplicação -e ponderação- de normas gerais e abstratas na resolução de casos concretos.

Pedro Augusto Ferreira Bisinotto
Direito-Noturno

As facetas do fenômeno da judicialização

O magistrado francês Antoine Garapon e a professora alemã Ingeborg Maus discorrem em seus escritos a respeito do fenômeno mundial da judicialização. Um exemplo concreto do tema abordado pelos escritores é a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.277, que visava dar interpretação conforme os princípios constitucionais ao artigo 1.723 do Código Civil de 2002. Por votação unânime os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram ampliar a interpretação da legislação que reconhece como família a união de homem e mulher e conforme as bases da Constituição de 1988, reconheceram a união estável de indivíduos do mesmo sexo.
Tal decisão representa a atual demanda da sociedade em relação à atuação do poder judiciário em questões que anteriormente não eram abrangidas pelo campo do Direito. Garapon utiliza o conceito de magistratura do sujeito para explicar essa transferência da dependência dos indivíduos em relação a seus "magistrados naturais" (como pai, padre, chefe etc) para as decisões dos togados.

“'Em que consiste esta função? O juiz deve
colocar-se no lugar da autoridade faltosa para
autorizar uma intervenção nos assuntos
particulares de um cidadão.” (GARAPON, p. 150)

A partir da magistratura do sujeito, os juízes passam a exercer cada vez menos a função arbitral e cada vez mais sua função tutelar, dado que as decisões judicias tutelam cada dia mais aspectos morais e individuais da vida do sujeito, como a própria união de casais homoafetivos.
Maus também trata das demandas sociais, a crise de representatividade do poder legislativo e a judicialização, mas alerta sobre o risco de discricionariedade e concentração de poder nos tribunais. À medida que os magistrados são responsáveis por decisões tão importantes, os poderes Legislativo e Executivo, eleitos pelo povo, são enfraquecidos. Há a sensação de que os tribunais podem estabelecer  qualquer interpretação para as leis já escritas, justificando o risco apontado pela autora.
Em contrapartida, a atuação cada vez mais presente do poder judiciário representa a possibilidade de avanços significativos, principalmente para as minorias que não têm suas necessidades atendidas pelas normas positivadas, como foi o caso da ADI 4.277 que reconheceu o direito dos homossexuais e tantas outras que foram importantes para vincular resoluções que simbolizam o progresso da nossa sociedade.


Mariana Paz F. Puentedura
Matutino

A Judicialização e a tutela do individuo


Atualmente nos tribunais brasileiros  vem ocorrendo a judicialização, que é um fenômeno político-social que emerge quando o legislativo e o executiva não dão o suporte mínimo de direitos para o cidadão e esse é obrigado a apelar para o judiciário para ter as sua reivindicações atendidas .Levando em conta o cenário atual de nosso país isso acontecer com frequência não é uma surpresa, Garapon já diz “chama-se a justiça no intuito de apaziguar o molestar do indivíduo sofredor moderno”.
Podemos pegar como exemplo á ADI 4277  que versa sobre o casamento de homossexuais, no caso é julgado a violação dos direitos fundamentais garantidos pela constituição, o principal deles o direito a dignidade. Ao mobilizar o direito em prol de reivindicar os direitos garantidos por lei que se inicia essa ação. Podemos notar que a “magistratura do sujeito torna-se uma tarefa política essencial” assim como destacou Garapon. Não basta mas verificar se as leis não estão sendo infligidas mas também confirmar que os direitos estão sendo dados e exercidos e plenitude na sociedade como um todo não deixando que tirania da maioria impere uma que o legislativo que cria as leis representa a maioria do país, cabe ao judiciário defender as minorias sendo a voz da razão e não da emoção das massas.
Segundo Garapon essa demanda abre um novo espaço para a justiça, sendo sua função tutelar mais solicitada do que sua função arbitral a qual muitas vezes é reduzida. Desse modo deve compreender que o poder judiciário não está exercendo funções a mais do que deveria mas sim uma função extra que se o legislativo fosse eficiente e objetivo não seria necessárias essas intervenções.
Inceborg Maus defende que a dificuldade dos partidos políticos convencionais em se colocar como articuladores dos “novos sujeitos sociais”, gerou uma crise de representatividade do poder político fazendo com que ocorresse o deslocamento da agenda do país do Legislativo para o Judiciário como vemos hoje em dia.
Mas quanto ao risco a legitimidade democracia uma vez que hipertrofiamos  judiciário, é um pouco equivocada pois o eles são os guardiões do direito, ou seja, da constituição que foi promulgado pelo representantes do povo através da constituinte logo todas a suas ações para defender o cumprimento da constituição são legitimas. De fato não é o caminho mais certo a se tomar para o bem da sociedade mas parece que o único que nos sobrou, o judiciário deve sim tutelar o individuo que não é atendido pelos demais poderes.

Danilo Braga Vicentini -  Direito Noturno