domingo, 21 de outubro de 2012

A sociologia de Weber na construção de um ser completo



Por que estudar essa tal de sociologia? Ah que saco, Direito natural e formal! Cadê os artigos?
Esses são uns, dos inúmeros questionamentos que pairam as cadeiras dos primeiros anos do curso de Direito. Por que isso ocorre? Qual a importância de estudar a sociologia e a sociologia do Direito para a formação de um jurista?
Bem, para responder essas perguntas, os convido a ler Max Weber. Este jurista, sociólogo e economista alemão nos mostra sua visão, sob diversos ângulos, como a sociedade funciona vinculada ao Direito. Vinculação esta que não pode, nem deve, ser analisada de um modo simplista, já que uma análise superficial dessa relação não é capaz de nos mostrar a complexidade, e as diversas consequências que ela pode trazer no plano social.
Weber, partindo, na maioria das vezes, de uma comparação do seu tempo com a antiguidade, mostra como a sociedade, majoritariamente os conservadores, vê o Direito como garantidor de benefícios e do status quo. Todavia, até para os revolucionários, o Direito é convocado para legitimar ações de cunho político e social, pois é nele que a sociedade se ampara para obter suas demandas, e assim, receber uma garantia que está banhada na racionalidade.  Porém, não podemos garantir que o Direito é racional, já que a racionalidade é oriunda da espécie humana. Espécie esta que faz o Direito, e que diversas vezes foi, no decorrer da história, taxada de irracional na figura de certos homens.
A modernidade veio, e com ela a necessidade gritante de louvar os especialistas. Pessoas essas que não veem o mundo por uma luneta, pois não está na sua função ver a imensidão que as rodeia, mas sim ver por um microscópio óptico, enxergando apenas o que está a sua frente, o minúsculo, a parte de um todo. Portanto, os alunos supracitados no inicio do texto não veem motivos para estudar matérias que visam atiçar um olhar crítico abrangente do mundo, pois não traz a técnica que precisam para funcionalizar o Direito que estão estudando. Contudo, essa ideia aparente de que a especialização é atrelada à racionalização é perigosa e infundada, já que tudo que fazemos e pensamos está ligado a nossa ideologia e no convívio social: pais, Igreja, ideologia política, etc. Nenhum homem está isento dessa influência externa da sociedade, e, portanto, até os especialistas mais renomados são influenciados, e de alguma forma, parciais.
A sociedade necessita de visões abrangentes para um melhor entendimento dos fenômenos que a envolve. E a sociologia de Max Weber nos dá um pouco de visão crítica acerca do mundo que nos rodeia e nos faz crescer por completo.
Portanto, não podemos comprar a ideia que o Direito é construído na racionalidade, já que todos os homens, inclusive os especialistas, estão dispostos a ações baseadas em ideologias e influências das mais variadas. Uma pena, pois seria muito mais reconfortante.


Entre lobby e direito natural

      


         O Direito Natural é uma concepção arraigada na ciência do direito, principalmente, após a Revolução Francesa, burguesa e liberal. Todavia, o subjetivismo que infere nas matérias cujo objeto é o humano não se absteu de abranger a referida ideia. Destarte, percebe-se a fusão de interesses de alguns grupos - realce para os  abastados economicamente - com teorias que apregoam a observância e, concomitantemente, existência de um direito não aquém do mero positivismo jurídico. Ora, será o lobby um exemplo? Claro que sim!
         Por um lado, o "Direito Natural", no âmbito do ideário capitalista, consiste, basicamente, na possiblidade de possuir (ou obter) propriedade privada e empreender livremente e, por isso, é escusa para afagar práticas que visam a interesses sórdidos e esdrúxulos, acarretando fatos negativos, tais como a desigualdade social. O Congresso Americano barra projetos cujos escopos eram prover condições para que as classes média e baixa pudessem receber atendimentos por parte do serviço público gratuitamente. Essa praxe americana de valorizar o capitalismo e a competição desenfreada entre as pessoas, arraigada numa hipócrita concepção de "direito natural", demonstra a subjetividade a que este está submetido.
           Por outro lado, a URSS, em "prol" de uma sinergia e coesão nacionalista entre os russos, afirmaram políticas de tendências de homogeneização social, mas, de fato, a classe política tornou-se mais robusta e detentora de privilégios inalcançáveis para a "massa". Será que propiciar paridade social - direito "natural" de todo Homem, segundo os soviéticos - é intrínseco à obtenção de recompensas pelo "serviço" prestado ou, mais uma vez, o interesse de um grupo mostra?
           Logo, a ponderação, principalmente por parte dos juristas, é fundamental para alcançar uma solução balanceada e ética. É inútil desejar retirar a subjetividade e o jogo de interesses dos debates e ideias que tratam de questões sociais, porém cautela é indispensável em todas as situações.

http://g1.globo.com/globo-news/milenio/videos/t/programas/v/economista-americano-defende-sua-tese-sobre-a-desigualdade-social-no-mundo/2191241/

Pequenas revoluções


Uma das temáticas de discussão que podem ser abordadas pela leitura da obra de Max Weber na perspectiva da Sociologia do Direito é a questão da dinâmica revolucionária capaz de alterar o direito e a ordem social vigentes. Trata-se do modo pelo qual as classes subvertem a ordem estabelecida, legitimando a criação de um novo direito.
Para Weber, é legítimo apenas o direito que não contraria a razão, que é razoável, mas a questão é saber qual razão é essa, ante a existência da racionalidade formal, afeita ao cálculo puro e simples, e da racionalidade material, engendrada com valores e concepções de uma época e de um grupo determinado.
A racionalidade formal é aquela que se adequa ao liberalismo no aspecto econômico, social e jurídico, representa um direito artificial criado pela sociedade moderna com um determinado fim, o de possibilitar o pleno desenvolvimento econômico, livre de restrições estatais ou de qualquer gênero, condizente com os interesses classistas da sociedade burguesa ascendente. Esse direito se baseava no conceito de segurança jurídica e pode muito bem ser ilustrado pela figura do contrato como instrumento de artificialização da vontade nas relações interindividuais de cunho econômico, o qual adquire força de lei e, como tal, tem garantido seu cumprimento pelo sistema, sob penas sancionatórias.
A racionalidade material é a aspirada pelas classes subalternas (hoje, os chamados grupos minoritários) devido à opressão que sofreram e pela influência do movimento proletário.
Essa transição do ético formal para o material não ocorreu de modo absoluto. Os valores e interesses da classe dominante prevaleceram ainda, no entanto, esta achou por bem não ignorar as classes dominadas, dado o perigo real de insuflação, a firmeza de suas reivindicações e a fervilhação social da época.
Se atentarmos para a sociedade atual, notaremos as pequenas revoluções que têm ocorrido nesse sentido, como resposta a anos de opressão e como forma de reivindicação de uma nova ordem jurídica e social. É o caso dos grupos minoritários que se insuflam numa sociedade retrógrada, mas aspirante à democracia. Os índios, negros, mulheres, deficientes, os grupos LGBT e diversos outros que têm ou que tiveram seus direitos negados em outros momentos históricos, vêm cada vez mais à tona, buscando seu devido reconhecimento e as reparações dos males que sofreram e ainda sofrem.

O caminho da razão


          Os diferentes valores incorporados pela sociedade hoje são, de muitas maneiras, plurais. Diversos movimentos que estampam cores e dão voz a minorias são a realidade da pós modernidade. Nunca, na história da humanidade, viveram pessoas com tantas diferenças em uma mesma realidade, de maneira que é necessária a tolerância para que o mundo não queime.
          Na racionalidade do capitalismo as diferentes formas de ver o mundo são mais do que aceitas. Existe até mesmo uma tendência de se fazer com que qualquer movimento de oposição e critica social se torne mercadoria. Assim aconteceu com os “Hippies” e com os “Rappers” e assim acontecerá com qualquer que seja o movimento de crítica. A racionalidade capitalista engloba e adiciona em seu hall de produtos os mais diferentes e drásticos estilos.
          Em uma visão que condene o consumo, o paradigma acima exposto pode ser deveras aterrorizador. Dispensando qualquer sensacionalismo e utilizando do mesmo viés   frio e racionalista que se discute, a característica de englobar diferentes causas pode ser um mecanismo muito eficaz na busca por garantias para minorias.
          Dentro da dinâmica do capitalismo que se mostra mais radical do que muitos movimentos de ruptura, as minorias conseguem alcançar melhoras pelo mesmo mecanismo que a classe hegemônica conseguiu estabelecer seus direitos. Assim como os valores burgueses estão enraizados na sociedade, as transformações que ocorrem na sociedade vão adicionando novos valores na teia de valores do capitalismo. O mecanismo de englobar consegue então ser utilizado de maneira positiva.
          Avanços nos valores da sociedade são então aceitos nesse sistema. No que diz respeito ao Direito, os avanços também ocorrem, basta que a mentalidade da sociedade esteja madura o suficiente para que os avanços sejam efetivados. Nos EUA onde se observa que o capitalismo se desenvolveu de maneira mais plena do que no Brasil, as lutas sociais que tiveram os mais diversos protagonistas, conquistaram no âmbito judicial os avanços de início almejados.
          Um exemplo do citado é o movimento negro, que durante os anos 60 teve seu momento de destaque e que conseguiu através de vários homens e mulheres, que eram minorias em seus respectivos locais, uma grande repercussão e resultados muito positivos. A igualdade entre brancos e negros é fruto dessa luta.
          As mais variadas lutas acontecem dia a dia nos mais diferentes locais. Dentro do Brasil e também em outros países. A racionalidade do capitalismo é revertida em benéfice para minorias resultando assim em uma sociedade mais plural e um ambiente mais seguro para as diferentes formas de pensamento e expressão. 

Conflito entre direitos


Max Weber, ao discutir sobre o Direito Natural e o Direito Formal, mostra o conflito existente entre essas duas concepções e suas principais indagações. Este se refere ao direito puro, do qual todas as normas obedecem a uma única ordem jurídica, sem sofrer alterações externas, criado racionalmente com determinando fim. Já aquele, se refere ao sentimento espontâneo de justiça, sem, necessariamente, a prevalência da razão.

Para o sociólogo alemão, o direito legítimo é baseado na razão, sendo apenas legítimo o direito cujo conteúdo não contradiga a racionalidade. Esse direito, marcado por princípios racionais, se mostra essencial no modo de produção capitalista, pois garante e protege a umas das principais características desse sistema econômico, a propriedade privada.  

Esse direito racional engloba uma série de direito considerados legítimos, como o direito a liberdade, fundamentando assim, a ideia de propriedade privada e o direito de utilizá-la de acordo com a vontade. As relações pessoais são substituídas por relações formais, nas quais prevalece os interesses e as formalidades jurídicas ,como é o caso dos contratos. O direito formal está intimidamente ligado ao capitalismo, garantindo, através da expressão da racionalidade jurídica, a consolidação desse sistema econômico. 

A dinâmica das forças

            Segundo Max Weber, o direito natural seria o modo pelo qual as classes que se revoltam contra a ordem legitimam a criação de um novo direito. Esse novo direito vem a ser o resultado de uma racionalidade, de interesses e valores; além de criar uma liberdade específica. Institui-se, assim, um direito natural material. Contudo, se esse direito segue uma racionalidade, seria que racionalidade? E de quem?
           O século XIX, com o liberalismo, demonstrou o predomínio da racionalidade burguesa sobre toda a cultura ocidental, principalmente sobre o direito. Esse predomínio vem pelo fato de essa classe ter tomado um certo tipo de domínio de tal forma a implantar a sua razão. Sendo assim, a racionalidade da classe dominante influencia fortemente o direito de uma determinada sociedade.
           Entretanto, no fim do próprio século XIX esse predomínio já não era tão evidente. A pressão socialista, a instituição do estado social de direito, são pontos que demonstram que não é somente a racionalidade da classe predominante que dominam o direito. Essa razão não é pura e formal, ela engendra variedades, estas mudam constantemente, logo esse processo de formação do direito deveria ser entendido a partir de uma disputa entre grupos.
            Logo, apesar da grande influência da classe dominante na racionalização do direito, a formação deste vem dos interesses de vários grupos de força relevante na sociedade, com a disputa entre esses grupos.


          Murilo Thomas Aires

Realidade x idealização


    Sabe-se que a fertilidade presente, a qual se vivencia na dimensão dos direitos e liberdades individuais, tiveram sua origem nos ideais iluministas. A ‘revolução’ estava carregando o novo, uma nova realidade, um novo ‘código’ que superaria por completo o antigo e uma nova dinâmica para a realidade. Um direito racional surge, mas sem abandonar por completo um tipo de bem valioso, não à sociedade da época, mas ao homem em geral: os valores.
  Sim, a realidade mudou muito, mas não abandonou por completo velhos padrões que convivem até hoje na sociedade. Os valores permanecem, de forma a garantir os interesses de uma classe e garantir os de outra na medida em que for conveniente á primeira. O direito formal – posto pela classe dominante – em choque com os direitos individuais.
  O embate produz uma mescla que impregna a realidade com um contraste duro, o qual envolve as pessoas na busca por compreensão da dinâmica social. Ele se resume no resultado da equação entre o capitalismo e as revindicações da sociedade, entre o direito puramente racional e o direito natural. Não há mais racionalidade cartesiana pura, mas sim mistura e disputa de direitos individuais, de seus valores agregados; de interesses concorrentes.
  Com base nisso, não se pode esquecer que todos os aspectos da realidade moderna estão embebidos nesse ‘conflito’ e que seus fatores devem ser levados em conta. Se as discussões acerca de assuntos tangentes às ações político-sociais antes de começarem levassem em conta como as coisas realmente funcionam¸ que tudo é parte de um jogo de interesses¸ se compreenderia que uma coisa é o que idealizamos e outra o que interessa àqueles que têm de agir. Uma coisa é o que a sociedade tem por justo, legítimo, responsável, digno e por outros valores tantos; outra completamente diferente é o conjunto de aspectos que buscam as pessoas que governam ou àquelas que criticamos por qualquer motivo que seja.
  Não se deve através dessa compreensão se colocar ‘fora’ da realidade e dos acontecimentos das coisas, ou se tornar indiferente – a indiferença que tanto trata a música Solo Le pido a Dios, interpretada por Mercedes Sosa -, mas deve-se ter consciência de como a dinâmica realmente é e não como gostar-se-ia que ela fosse.

A questão da segurança jurídica na realidade material do Direito.


Ao pensar no confronto emblemático entre o direito natural e o formal, entende-se que na sociedade moderna emerge um sentimento de justiça espontâneo (Direito a vida, trabalho, moradia), que confronta a todo o momento o direito criado (Artificial), racionalmente criado com um determinado fim.  Desta forma, Weber expressa que o capitalismo não engendra uma racionalidade pura e um sentido de Direito puramente formal (direito racionalmente criado), mas que o atual modo de produção e os desejos que ele incita caminham muito mais em um sentido material, de incorporação de valores e interesses mais diversos.
Essa dicotomia apontada por Weber transparece facilmente na sociedade atual, quando se pensa em segurança jurídica. Partindo do principio de que o Direito natural, representa uma força maior que o direito positivado, no sistema capitalista, pode-se afirmar que os interesses pessoais permeiam o sistema jurídico de tal maneira, que a existência de uma segurança jurídica é praticamente nula, isso reflete em uma antinomia profunda, entre a justiça material e a segurança jurídica.
            A Segurança jurídica, embora pretenda a paz jurídica, não significa, necessariamente, a aplicação certa do direito justo, senão a execução segura do frequentemente defeituoso direito positivo. Desta circunstância podem resultar conflitos de interesses, especialmente entre a justiça material e a segurança jurídica. Que sucede em caso de conflito quando estes dois valores fundamentais do direito não possam ser realizados ao mesmo tempo? Na visão Weberiana claramente a justiça material, que permeia os interesses capitalistas, teria uma validade maior e certa prevalência em relação aos contratos formais.
Porém ao contrastarmos um critério de justiça material e a segurança jurídica, o suporte para afastar uma aparente incongruência e impossibilidade de convivência parece residir, em princípio, nos mecanismos hermenêuticos e processuais de controle no processo de realização do direito. Estes vão desde a existência de uma escala de recursos das decisões proferidas para tribunais superiores (geralmente órgãos colegiados), passando pela fixação de diretrizes ou critérios metodológicos como instrumentos analíticos hábeis para afastar uma eventual "discricionariedade ilimitada" do julgador e garantir a "objetividade" dos resultados da interpretação, isto é, de dotar a tarefa interpretativa do condão de tornar o mais racional e controlável possível os critérios normativos, valorativos e fáticos relativos ao caso em questão, até, e finalmente, convergir na responsabilidade do juiz pelos efeitos éticos e sociais de suas decisões a partir da decisão como componente iniludível da tarefa interpretativa.
É impossível, na minha visão  traçar uma linha nítida entre os casos de segurança jurídica e Justiça material, porém como dito por Atahualpa Fernandez “quando nunca se procurou a justiça, onde a liberdade e a igualdade  que integram o núcleo duro da justiça  se negou conscientemente à regulação do direito positivo, ali a lei não é somente "direito incorreto", senão que carece por completo da natureza do direito, pois não se pode definir o direito, inclusive o direito positivo, de outra maneira que não seja como uma ordem e estatuto que, de acordo com seu sentido, estão determinados a servir à justiça".

Direito cada vez mais natural


                       A análise realizada abaixo, leva em conta o pensamento weberiano, onde toda causa em que o homem está exposto influencia seu comportamento. Além disso, deve ser considerado que com a ascensão da burguesia, também surgiu um novo direito, quando prerrogativas que antes só eram aplicadas á determinadas classes passaram a ter um alcance universal. O Direito surge racionalmente com determinado fim, um direito natural material, definido pela incorporação dos interesses de uma classe específica.
                       Com isso, a razão passou a ser expressada na modernidade como sentimento de interesse particular. Entretanto, as racionalidades podem expressar-se de forma convenientemente diferentes, assumindo as formas mais distintas de acordo com o valor em que é aplicado.
                       Analisaremos, portanto o seguinte caso: Um engenheiro deixou seu emprego e com isso não conseguiu arcar com o financiamento de sua casa. Agora, consideremos o caso de um pai que abdicou sua função social, seu emprego como engenheiro, para assumir a tutela que originariamente pertencia ao Estado, o cuidado da saúde do filho que detém doença rara e incurável e, por isso, deixou de pagar o financiamento de sua casa.
                       No caso acima, qual racionalidade deve prevalecer? Em uma família de classe alta tal ato de um pai não teria uma repercussão tão grande econômica e juridicamente na família. Seria possível a aplicação de tal regalia á uma família de classe média? O pagamento da casa é racional e foi o combinado, um ético juridicamente formal. Mas o direito do homem á paternidade expressando-se pela dignidade da pessoa humana de seu filho é um direito natural, um utilitário e tecnicamente material.
                       O justo batalha com o natural. Para a felicidade da família citada acima, cada vez mais o Direito transita do formal ao natural, como mostrado pelo vídeo abaixo. "Uma decisão inédita da Justiça reverteu verba do fundo pecuniário -dinheiro recolhido de condenações judiciais- para quitar a casa de um pai que abandonou o emprego para pesquisar a doença rara e incurável do filho" (http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/753594-homem-contrai-dividas-para-estudar-doenca-do-filho-e-justica-evita-despejo-em-curitiba.shtml). 
                        
 

Direito(s): gradualmente (ir)racional.



                E, mais uma vez, nos voltamos a esse constante questionamento que norteia grande parte de nossas leituras: o que nos faz modernos? A modernidade se ergue sobre que bases? Mais do que depressa, nossa mente já condicionada por anos, nos remete a algumas palavras chaves, como Revolução e Burguesia. E como esse contexto se relaciona com o Direito?
                Fato é que o Direito, na modernidade, passa a ser visto como uma Ciência. Apesar de as discussões perdurarem até os dias atuais, tentou-se delimitar seu objeto de estudo e afastá-lo de tudo aquilo que podia ser considerado “irracional”, uma vez que a ciência preza pela razão e neutralidade.
                Porém, na prática, segundo Max Weber, temos um Direito no qual a razão não é acompanhada pela neutralidade, e sim pela razoabilidade. Razoabilidade de acordo com os ideais, os pensamentos de um único grupo, uma única classe (mais poderosa), o que pode ser absurdo para outro grupo de pessoas. Para ele, não temos uma ciência pura, e sim, uma que se modifica de acordo com os valores de parcelas da sociedade, inicialmente burguesa, e, depois, influenciada por grupos de pressão de minorias. Assim, o Direito pode até ser visto como adaptável. Adaptável e razoável... Tão... manipulável...
                Aliás, tal razoabilidade não influenciou apenas o Direito. Influenciou e padronizou a sociedade como um todo. O que é razoável dentro da mentalidade burguesa, que, por sinal, nos acompanha até hoje? É racional que procuremos nossa felicidade. Felicidade que pode ser expressa, na prática, por um sucesso profissional e pessoal. Poderia ser relativo, indo de encontro com os interesses individuais, mas os livros de autoajuda serem Best-sellers mostram que não. Temos uma felicidade padronizada e, muitas vezes, pessoas diferentes acreditam que devem passar pelos mesmos passos para obtê-la. Afinal, ser uma pessoa rica, bonita (isso inclui ser magra?) e com uma família de comercial de margarina é estar no apogeu da felicidade, não é mesmo?!
Qual calouro de Direito, em conversa com veteranos, nunca se deparou com um sonoro “O primeiro conceito que cai na Universidade é a Justiça”?! Assim, nos deparamos com dois pontos: o primeiro é a contraposição do Direito racional, o Direito lei, que é o aplicado, e o Direito como a realização da Justiça, baseado no sentimento da sociedade. E o segundo, paralelamente, é que a razão com a qual estamos trabalhando não é a racionalidade. Talvez, estejamos trabalhando, na verdade, com a irracionalidade, desde que ela seja razoável para os fins da sociedade. Sociedade em transformação? Talvez. Mas essa transformação anda de mãos dadas com a padronização e é, portanto, gradual. Estaríamos, assim, avançando gradualmente até chegarmos à racionalidade ou apenas chegaremos a um novo tipo de irracionalidade maquiada com a razão da ciência?

Do Direito material ao formal


            Uma das características que determinam o capitalismo é o fato dele utilizar todos os mecanismos sociais a favor do seu aprimoramento, dessa forma, por mais que o sistema exclua muitas pessoas do seu contexto de enriquecimento, ele também possibilita que aqueles com possibilidades de desfrutá-lo possam fazê-lo da melhor forma possível e de maneira muito específica ao segmento que o agrada. Sendo assim, o capitalismo absorve as necessidades básicas das pessoas, seus maiores anseios, para que se torne desejável por todos, isso ocorre com maior freqüência frente aos anseios da classe dominante, mas sempre que viável e interessante para o mercado as classes subalternas são contempladas, o que acaba não excluindo o sistema judiciário.
            Toda essa adaptação que o capital pode sofrer é seu maior meio para se manter atual e sendo considerado o melhor modelo de vida para as pessoas, pois ele se entrelaça com a realidade de todos, de modo que mesmo da forma mais racional os valores da classe dominante detentora de capital estão arraigados no subconscistente de qualquer um, de um modo tão inflexível que mesmo aquele que não é contemplado pelas benesses do sistema ainda se sente melhor sob seu julgo do sob outro modo de produção. Por exemplo, a facilidade que todos encontram de usufruir do judiciário de forma a garantir seus direitos, mas sem perceber que esses direitos que podem ser reclamados são aqueles reivindicados por uma classe e incorporados a legislação.
            Desse modo, o capitalismo coloca tudo que faz parte das relações sociais sob suas vontades, e como faz questão de ressaltar Weber, inclusive o Direito, que teoricamente é a única forma de se reclamar e conseguir Justiça, ou seja, a Justiça realizada no mundo de hoje é permeada pelos valores capitalistas assim como toda a racionalidade do mundo pós Revolução Francesa. Sendo assim, os privilégios ostentados por determinadas pessoas acabam depois da Revolução, porém outros direitos que são buscados por cada classe têm que ser reivindicados dia-a-dia para que se façam presentes no ordenamento jurídico, ou seja, saia do plano material e se concretize normativamente no plano formal, pois enquanto não são pleiteados e formalmente aderidos ao sistema não são considerados relevantes.

Weber e a questão das cotas.


               Durante a última aula de sociologia do direito, um acalorado, porém amigável, debate a respeito das cotas nas universidades e no serviço público se início na sala e persistiu enquanto durou a aula, chegando até a se espalhar nos corredores. Veio a calhar, justamente, que esse debate se enquadra perfeitamente nas ideias de Weber, as quais foram trabalhadas durante as duas últimas aulas.
            Tais ideias weberianas mostram como o direito moderno, fruto de um processo pertencente à Ilustração, berço das inflamadas exaltações à racionalidade, pode carecer de certa racionalidade. E não poderia ser diferente, pois como mostra Weber o direito muitas vezes (para não dizer na grande maioria das vezes), não é fruto da razão, e sim da união e vontade de grupos que conseguem se estruturar e lutar pelos seus interesses dentro do sistema (mesmo que esse privilegie os interesses de mercado).
            É por essa razão a questão das cotas ganhou tamanha dimensão de exemplificação dentro da sala de aula. As cotas são o resultado de anos de luta de um determinado segmento da sociedade, que foi capaz de se organizar e batalhar por reparos devido ao passado histórico e também aos preconceitos ainda existentes. Além disso, podemos enxergar na questão das cotas o próprio Durkheim que aponta o direito moderno com um direito restituidor, o que com certeza bate com os interesses do grupo que as batalhou (ao invés de lutarem por um direito retrógrado vingativo).
            Todavia, muitos colegas de sala (assim como diversos indivíduos fora dela), não sem razão, aliais por utilizarem a razão a cima dos outros interesses, colocam-se contra as cotas raciais e favor das cotas sociais. O que para o autor desse texto é extremamente justo, devido à crença desenvolvida por ele na razão.
            Só que é preciso lembrar que como esse grupo teve a capacidade de se unir, reivindicar por direitos e manter a legitimidade, por avançar de maneira legal (passando por todos os trâmites necessários dentro de nosso Estado democrático), teremos que aceitá-lo junto com suas conquistas.
            Por fim, é válido lembrar que Weber nos mostra por meio de suas ideias a pluralidade de interesses que fazem parte de nosso sistema. E embora, seja necessário lutar para que os interesses de mercado parem de ser os dominantes, também fica o alerta de que os interesses da razão podem possuir certas falhas (visto que na questão das cotas, grupo distante ao menos diretamente das pressões de mercado, não buscam o mais racional). Portanto, caso quisermos manter nosso caráter democrático de Estado, talvez seja a hora de tentarmos entender as outras instâncias, que não a razão, permitindo entender assim os interesses desse grupo e de semelhantes, ou que sejamos capazes de convencer nossos iguais e dessa forma fundar um grupo que batalhe por nossos interesses. 

Direito racional e o uso de cartas psicografadas como meio de prova


De acordo com a teoria do sociólogo Max Weber, o direito formal é aquele que obedece exclusivamente a lógica jurídica, sem considerar aspectos externos ao direito. O direito material, por sua vez, seria aquele que contempla elementos extrajurídicos (como valores religiosos, éticos, econômicos, etc.). Weber, ao estudar o desenvolvimento do direito historicamente, evidencia o seu progressivo processo de racionalização.
Tomando como base aspectos da teoria de Weber, podemos discorrer a respeito dos casos em que cartas psicografadas foram admitidas como meio de prova no direito brasileiro. A aceitação dessas cartas abre precedentes para a discussão do caráter racional que o direito deveria ter (de acordo com o posicionamento da maioria), pois a admissão de tais provas se afasta do conceito de um direito extremamente racional e dá abertura para o entendimento do direito como instituição imaginária da sociedade.
 Embora contenha caráter religioso, as cartas psicografadas foram levadas em conta por serem manifestações escritas, e por expressarem os fatos de forma lógica e racional. O respeitado médium Chico Xavier, de Minas Gerais, foi responsável por psicografar três das únicas cinco cartas aceitas pelo judiciário brasileiro como meio de prova de crimes, inocentando os réus. Tais acontecimentos resultaram em grande impacto na comunidade jurídica brasileira e foram motivo de polêmica na sociedade. 
 Os casos em que essas três cartas psicografadas por Chico Xavier foram aceitas estão retratados em uma minissérie chamada “As cartas de Chico Xavier”, apresentada por um programa de televisão, e podem ser conferidas nos links:*http://www.youtube.com/watch?v=gsa1Gao-HV8
*http://www.youtube.com/watch?v=yzv_bZ-7pDE




"Julgamentos formais", independente da classe

           Weber concebe a construção do que entendemos por modernidade, um processo dependente de variadas dinâmicas de racionalização. Voltando-se para o direito, a dinâmica de racionalização vai do material ao formal. A racionalidade formal é edificada em um caráter calculável das ações e seus efeitos; já a racionalidade material abrange os valores, anseios, exigências, conceitos éticos e políticos, ou seja o "material" atenta para o interesse daqueles que em algum momento não se sentem contemplados pelo que está previsto no direito formal.
       Direito formal é aquele que foi "arquitetado"; criado de forma racional atentando para determinados fins. Este se contrapõe ao direito natural, que pode ser definido como o "senso de justiça" espontâneo. Tais conceitos se vinculam a interesses de classe, sendo o direito formal aquele em favor dos  interesses dos que se apropriam dos meios de produção, e o direito material como instrumento de protesto dos proletários ao se mostrarem contra a segregação de classes tendo como critério para tal a propriedade.
       Apesar de ainda possuirmos a configuração; "direito formal- classe dominante x direito material- classe dominada/explorada" , por diversas situações essa configuração se confunde. Em algumas situações nosso sentimento de justiça se confunde com o que está previsto nos códigos. O maior exemplo disso é a condenação feroz da bigamia. Uma parcela esmagadora da sociedade diz que a bigamia é um crime.  Formalmente uma pessoa não pode ter dois casamentos registrados sendo essa conduta passível de prisão.Mas seria esse um julgamento que partiu do individual de cada um, ou de uma construção padronizada denominada "moral e bons costumes"feita pelos mesmos que elaboraram as leis? Seríamos defensores tão fervorosos da monogamia se a religião  ocidental predominante não tivesse incutido isso na humanidade por séculos?
       Ao definir direito natural, Weber afirma ser;" (...) a única forma consequente e específica de legitimidade de um direito que pode restar quando não há mais revelações religiosas, nem a santidade autoritária da tradição e de seus portadores." Sendo assim, se a monogamia não tivesse sido injetada nas veias da humanidade pelo catolicismo talvez não estivéssemos preocupados em condenar as diferentes formas de amar de cada um, nem enquadrar algo que é de cunho pessoal em um padrão estipulado pelo direito formal.
         Logo, há questões que não as encaramos com o olhar do direito material, apenas com o do direito formal. As leis, os códigos ditam algumas das nossas convicções, mas que na realidade não são nossas. Reproduzir a lei na concepção weberiana era característica da classe dominante, porém, em diversos casos a construção acima da questão vai mais além do que apenas a lei escrita e influencia nas condutas de todos (independente da classe) frente a certas situações. É preciso questionar se certos julgamentos feitos parte da nossa própria concepção, ou se estamos reproduzindo o que está formalizado pela lei e pela religião, entre outros" formadores de padrões".

Prisão intelectual aos tempos remotos


A crescente influência de uma nova ordem econômica, não só baseada no lucro, como já estudado antes, mas também na graduada dinamização das relações de trabalho, sociais e culturais da sociedade, permite uma mudança nas caracterizações do Direito, seja ele o natural ou formal, e direito natural formal ou direito natural material. Assim, percebe-se que não só a ordem econômica, mas também as lutas e ações sociais, sobretudo, penetram no ramo do Direito, conquistando cada vez mais os chamados direitos individuais.
Porém, no texto de Weber analisado, a racionalização é um dos fenômenos que determina os direitos legítimos, ou seja, aquele direito que não contradiga a razão. Mas, como se pode pensar numa razão, se existe um direito subjetivo introduzido no meio da questão? Essa é uma das belezas que apresenta o Direito, não há razão para um ou para outro, mas os direitos, sejam eles os das mulheres, dos homossexuais, do pensamento político ou religioso, dos analfabetos, dos deficientes físicos e mentais, tudo tem um valor. Mas, não é aquele valor que significa papel-moeda ou metal, mas sim, o valor social, o valor da dignidade humana.
Desse modo, o direito natural, para Weber, não é obra do legislador, mas possui qualidade imanente. De outro lado, como há a possibilidade de se falar que ninguém o criou, se já existe uma ordem que fale que ele é imanente? Sim, há um estabelecimento de conceitos desde há muito tempo, que não nos proporciona uma fonte histórica confiável em relação ao que é realmente direito natural ou não. Necessita-se, portanto, de uma racionalização não apenas no Direito, mas nos moldes societários que se estabelecem segundo a ordem social atual, a qual se vive nos dias de hoje.
Logo, do que se baseia Weber para dizer que os direitos natural e formal estão estabelecidos dentro de uma categoria formada? Esse é um ponto do qual eu discordo, pois o seu pensamento já não se faz tão atual tanto como quantos autores foram analisados ao longo do curso, como por exemplo Marx e Engels, Descartes etc., pois ele se prende ao conceito estabelecido e não à dinâmica que se forma de acordo com o que vai se transformando na sociedade ao longo do tempo, prendendo-se, portanto, restritivamente, ao passado.

Direito natural e a influência capitalista


A abordagem complexa de Weber sobre o direito natural e sua evolução diante da história, com destaque para a divisão entre os períodos pré e pós-revolução burguesa, nos ensina as transformações nas bases dos ordenamentos jurídicos, claro que referentes à região ocidental do mundo, e nos seus caracteres ideológicos.
          O autor conceitua direito natural como aquele que “legitima o poder compromissório das promulgações autoritárias” vigentes, como um conjunto de normas independentes de direito positivo, dotado de princípios gerais, diversos em cada caso. O direito natural, do ponto de vista sociológico, se mostra como princípios gerais que permeiam as regras positivadas, formadores de “máximas jurídicas e da vida jurídica prática”. [p.134]
         Dá-se, assim, na concepção de Weber, e em uma resumida explicação, a determinação do direito positivo pelo natural de duas formas: legitimidade ligada às condições formais ou materiais.
    Pode-se perceber que as normas em vigor nunca serão totalmente naturais, pois constariam apenas de princípios gerais e abstratos. Atendo-nos ao período moderno, o direito natural formal tem como elemento substancial os “direitos de liberdade”, que recaem sobre a liberdade de contrato neste período pós-revolução burguesa. O direito natural legitima as ações contratuais e sociais dentro dessa realidade do Estado de Direito, proporcionando a formalidade de suas acepções. Neste ponto, fica clara a intencionalidade da classe favorecida, a burguesia, em instituir direitos naturais que, acima do ordenamento positivo, pregam liberdades individuais e “exercício pleno da propriedade”; o direito subjetivo, fruto indiretamente do direito natural, nesse momento histórico da ampliação do mercado capitalista, reside na “liberdade” de se efetivamente dispor de bens privados. A redução da coação dos detentores do poder relaciona-se com os grupos de interesses, possuidores de grande desenvoltura econômica e ainda responsáveis pela imputação de valores jurídicos, ao longo de ações de ruptura, que firmaram os propósitos capitalistas. O fortalecimento das “garantias formais, baseadas no direito natural, do indivíduo e de sua esfera jurídica diante do poder político dominante” foi um dos aspectos marcantes do “trabalho bem feito” da revolução burguesa.
     Daí em diante, as determinações do mercado definiam o “justo” com base na concorrência. O direito natural vê-se obrigado a aceitar razões materiais, baseadas no racionalismo prático utilitário. De acordo com Weber, “o direito natural formal transforma-se em direito natural material a partir do momento que a legitimidade de um direito adquirido não depende mais de características formal-jurídicas, mas de características material-econômicas relativas à forma de aquisição” [p.137] As teorias socialistas impuseram a apropriação de bens de produção de produtos materiais como o caminho para o estabelecimento da igualdade social e destruição das “injustiças da luta de classes”. Essa vinculação moderna do direito natural material à classe interessada em retirar os meios de produção do grupo econômico dominante, proporcionada pelas afirmações dos teóricos do socialismo, auxiliou de forma decisiva na formação de um Direito cada vez mais adequado às matérias econômicas. Há a “debilitação do formalismo jurídico por interesses materiais”, uma “racionalização e sistematização” que fortaleceu ainda mais a penetração dentro da sociedade do poder emanado pelos capitalistas. O que a teoria socialista pregava como “justiça material”, claramente envolvendo somente a classe trabalhadora, é vista como “justiça burguesa”, já que os detentores do poder econômico detiveram todos os demais poderes, assim como ditou Karl Marx.
            Discutindo brevemente um assunto relacionado ao que já foi exposto aqui, obviamente na realidade brasileira, podemos perceber que a parcela da sociedade que, atualmente, disputa a citada “justiça material”, pressionando as classes dominantes do âmbito político econômico, o faz não apenas se utilizando dos dogmas de mercado que apreciam um racionalismo principalmente dentro do Direito. Essas classes trazem reivindicações éticas baseadas em aspectos culturais e de ressarcimento moral, além do econômico. Na opinião do autor deste texto, a aplicação efetiva das normas de nosso país, principalmente em relação aos profissionais do direito e seus interesses, está maculada com a influência de grupos econômicos diversos detentores de grande atuação política direta ou indireta. 

Law at the crossroads.


   


                                                                                                                                                  Diego Rivera : Man at the crossroads.



 Poucos possuem a habilidade de elevar a dinâmica social a um patamar tão tangível que é possível destrinchá-la, tal como um corpo a espera de um legista, até suas entranhas mais obscuramente profundas e ir além.  Weber é um cientista social, ressalvo em relacionar o adjetivo ao seu viés médico-biológico, que não se satisfaz com o sistema, almeja tecidos e ao alcança-los constata a existência de órgão que por sua vez se compõem de células e a busca pela gênesis é infinita, magistralmente labutar.
     O direito, como membro do complexo social, não poderia deixar de ser elemento de estudo weberiano, que o concebe como produto de um devir histórico-social engendrado por uma alternância no monopólio ora liberal, ora social.
    A Revolução francesa, mãe adotiva da contemporaneidade,  dá-se concomitantemente com o aflorar dos direitos humanos pela Déclaration des Droits de l'Homme et du Citoyen, que influem intimamente em todo o ramo do direito, incutindo-lhe o direito natural, advindo da crença quase religiosa na racionalidade formal, como caráter ímpar na legitimação do mesmo (Estado Liberal de Direito).
    Os anseios capitalistas estavam bem servidos, la nouvelle loi consolidada o pensamento liberal e o Estado se abstém para que a mão invisível de Smith regule o fluxo e a dinâmica do mercado e por conseguinte da sociedade. 
    A liberdade reina por um significativo período como base dos direitos humanos, mas a infinita pretensão lucrativa da burguesia degrada a classe proletária que se atém a sua bíblia marxista e caminha militando. Surge o Estado Social de Direito, e junto dele o aspecto materialista dos direitos  humanos e consequentemente de toda a dinâmica jurídica .
   Hoje, o direito vive um processo paradoxal e complexo de individualização, uma eterna disputa retórico-dialética entre o formalismo e o materialismo, entre a sanção restitutiva e retributiva, entre a vingança e a tecnização punitiva, entre o império da opinião pública e dos grupos de pressão e a manutenção do Estado Democrático de Direito. 
  Tamanha inconstância judicial confirma a tese weberina que vislumbra o direito como legalização da dinâmica social e da predominância/embate de classes. O direito é reflexo da sociedade, líquida, tal qual salienta Bauman. 

Visão unilateral do Direito

Durante todo o aprendizado educacional dado aos estudantes, pouco se vê sobre o Direito em geral. Pior ainda, o pouco que se vê se trata de um único ponto de vista. Nos é apresentado, sempre, o Direito natural. Afinal, todos os homens são iguais, nascidos da natureza. Só essa visão, no entanto, não nos deixa contemplar e entender completamente a complexidade do Direito em si. Para isso, precisamos partir de outra intepretação, proporcionada por Weber.
Por meio do Direito Formal, conseguimos entender, por exemplo, o sistema de cotas. A certo ponto, o Direito Natural nos diz: todos são iguais e merecem direitos iguais. Nessa interpretação, as cotas são uma extensão do preconceito e da desigualdade, já que generaliza os negros como necessários de ajuda para passar nos vestibulares. Agora, na visão do Direito Formal, os negros, histórica e socialmente, se tornaram desiguais e, racionalmente, um direito de compensação precisou ser criado. Assim, as cotas não são apenas justificáveis, mas plausíveis.
Em suma, o unilateralismo do pensamento atual leva a contradições no pensamento social. O povo, ao invés de compreender ações necessárias, são levados a uma ideia errada e mal formulada, vista apenas com um olho.

O Direito e as cotas

As cotas raciais nas universidades públicas tem sido discutida por todas as classes sociais. Enquanto uns se baseiam no critério de reparação histórica, outros combatem essas politicas com a supremacia da meritocracia. Segundo esses últimos, os lugares nas melhores universidades devem ser ocupados pelo mérito, não por uma simples questão racial.
Segundo Weber, ao analisar a relação entre o direito natural e o direito formal, com o tempo, alguns direitos antes garantidos apenas aos nobres, classe mais privilegiada, passou a ser acessível a todos. No caso das universidade públicas, também fechada a certos grupos, aparecem as cotas como oportunidade, de um melhor acesso de toda a população a esse bem. As classes desprestigiadas, despertam a cada dia seu desejo por igualdades materiais e formais no direito. Com essa demanda, surge uma classe oposta, que critica o surgimento de direitos baseados em critérios sociais de justiça e dignidade humana.
Weber diz que o direito legítimo deve se basear num acordo racional, e que caso o contrarie, perde a razão. Neste contexto, o direito de acesso a universidade por meio das cotas, se torna legitimo, pois temos consciência do déficit do ensino público e do descaso feito com etnias no decorrer da história, sendo portanto racional que esses grupos tenham políticas públicas para que seja resolvido a curto prazo uma desigualdade. A longo prazo, no entanto, deve ser estimulado uma melhora do sistema, para que tais políticas não se façam mais necessárias.

Murilo Martins


Racionalidade jurídica?


Diante da continuidade da discussão acerca de Weber, percebemos que para o autor não há fatores que favoreçam a racionalização do Direito na Modernidade, pelo contrário, o desenvolvimento social acabou debilitando a racionalidade jurídica. Mesmo que o Direito não fosse influenciado por concepções morais, culturais e religiosas, mas marcado por um cunho econômico no qual se baseiam todas as relações, como já foi discutido, a racionalidade não foi puramente formal e científica.
Weber nos coloca essa crítica pelo fato do Direito formal, puramente científico, ter sido substituído na sociedade moderna pelo Direito “artificial”, dotado de uma racionalidade material, ou seja, carregado de valores e interesses.
A partir do Iluminismo a racionalidade passou a ser o ponto de legitimidade para o ordenamento jurídico e a liberdade, originalmente concedida apenas aos nobres, passa a ser de todos os homens. Entretanto, esta liberdade referia-se à liberdade de contrato e a razão que permeava as situações jurídicas era a de uma classe específica. O que fosse conveniente e beneficiasse tal classe seria considerado razoável.
Portanto, desde os primórdios do Direito Moderno, a racionalidade não é puramente formal, engendra valores das classes superiores. Ao analisar esse fato, Weber enxerga uma virada, do direito natural formal para um direito natural material; uma transição do ético juridicamente formal para o utilitário e tecnicamente material. 
Nos questionamos, a partir do exposto, se as ações jurídicas usadas na resolução dos problemas seja algo de real eficiência, como as cotas nas universidades. Uma parcela da sociedade, com menores condições deve ser privilegiada por sua situação? O Direito, mantendo a vontade natural de resolver os problemas, coloca-se, mais uma vez, carregado de valores daqueles que lutaram por uma causa, mesmo que esta pareça benéfica. 
Logo, percebemos que o Direito não é uma ciência neutra, vincula-se aos interesses de uma classe ou até mesmo de um grupo que lute por um movimento, mas não perde a essência do direito natural de propriedade e do sentimento de justiça "instantâneo", podendo muitas vezes ser apenas uma manobra de manutenção de valores, uma marionete jurídica a fim de garantir o status daqueles que o dominam. 

Racionalidade em pauta


         Max Weber discorre sobre o Direito Formal e o Direito Natural em sua obra "Economia e Sociedade", relatando, em certo momento, que seriam legítimos apenas os direitos cujos conteúdos estivessem de acordo com a razão, no entanto será que o Direito é mesmo racional? Será que seu conteúdo é relevante?  
         Segundo o jurista, Hans Kelsen, o conteúdo, a origem, o objeto e a finalidade da lei são indiferentes, afinal, a norma é criada por quem tem poder e intenção própria, ou seja, ela visa submeter todos os homens à vontade de alguns, à vontade dos legisladores.
         Dessa forma, a importância de certos aspectos da lei é relativa, ora dependendo da visão, o Direito se torna algo quase simples e objetivo, como é o caso de quando se adota o enfoque científico sobre a norma.
         É claro que, subjetivamente, nós podemos desejar que a lei seja justa, racional e razoável, porém pensando friamente valores são algo difícil de medir e fundamentar-se neles pode, então, ser perigoso, sem falar que, uma vez que exista sanção, a submissão ao sistema jurídico se torna inevitável.
         Sendo assim, talvez a discussão sobre a ordem social e o direito deva se ater mais a realidade prática, talvez trabalhar com o que temos seja melhor do que vislumbrar ideias esperançosas. De qualquer forma, é imprescindível que o questionamento sobre a lei continue a existir, pois só é possível conseguir uma resposta através de uma pergunta.





Um Direito legal


Max Weber interpreta as ordens estatais das sociedades modernas como os desdobramentos da dominação legal. Porque a sua legitimidade depende da fé na legalidade do exercício do poder. Segundo ele, a dominação legal contrai um caráter racional, pois a confiança na legalidade do ordenamento já escrito e na competência dos que estão a exercer o poder não se confunde simplesmente com a confiança no tradicionalismo ou no carisma, uma vez que ela tem a ver com a racionalidade que habita na forma do direito e que legitima o poder exercido legalmente. O autor introduz um conceito positivista do direito, segundo o qual direito é aquilo que o legislador estabelece como tal, seguindo um processo institucionalizado juridicamente sob esta premissa, a força que legitimaria a forma jurídica não deriva de uma possível relação com a moral.
Isso significa que o direito moderno tem que se legitimar, apoiando-se exclusivamente em qualidades formais próprias, assim sendo, o direito dispõe de uma racionalidade própria, que não depende da moral.
A confusão entre moral e direito pode se tornar um risco à racionalidade da ciência jurídica e por extensão a legitimidade da dominação legal. Ele não faz distinção entre valores que, no interior de determinadas tradições e formas culturais, se recomendam como mais importantes dentre outros valores. Ele não introduz uma fronteira entre os variados teores valorativos concorrentes e o aspecto formal da obrigatoriedade ou validade das normas, a qual não varia com o conteúdo delas. Em resumo, ele não levou a sério o seu formalismo ético.
Isso se depreende do modo como Weber interpreta o moderno direito racional, que ele contrapõe ao direito formal positivado. Ele pensa que não se pode haver um direito natural puramente formal, pois “a natureza e a razão são a medida material para aquilo que é legítimo”.
Uma das características mais importantes de uma forma de dominação fundada na crença da legitimidade da ordem jurídica e política é o seu caráter impessoal, uma vez que a obediência não está ligada àquele que detém o poder, mas é acondicionada unicamente pelo conteúdo obrigatório do direito. Outro aspecto importante é o caráter objetivo das competências juridicamente delimitadas. A dominação legal tem ainda duas características particulares: a burocratização da direção administrativa e a preeminência da ordem jurídica estatal.
O fundamento da legitimidade de uma ordem estatal não poderia escapar à decisão, momento especificamente político. A concepção weberiana de dominação racional decorre da relação de força com os interesses complexos e com as ações destinadas a dar forma a tais interesses e a os promover. Em razão desse ponto de partida, o que importa, antes de tudo, é mostrar que a dominação é diferente dos princípios de legitimação que a lei reivindica, mas não se trata de uma discussão sobre a justiça ou injustiça de um determinado organismo político. Para o autor cabe a visualização do problema da legitimidade, como meio de estabilização e racionalização da disputa do poder, e também como fim a ser perseguido por qualquer tipo de dominação. Desta forma fica explicito o fato de grupos políticos de tão variado tipo revezarem-se no poder sem que para isso haja necessidade de alterações substanciais no decorrente ordenamento jurídico.

...Justiça para todos


                Em seus escritos, Weber diz que acredita que o Direito meramente formal está sendo substituído pelo Direito Material, resultado de mobilizações e anseios da sociedade.
                Prova disso é a recente aprovação da lei que determina que 50% das vagas de Universidades Federais sejam destinadas a etnias e povos historicamente oprimidos.
                Mas há o outro lado da moeda. A desigualdade vai além do âmbito social, chegando ao âmbito jurídico. A justiça é benevolente com uns e cruel com outros.
                Um exemplo claro: A receita federal. O leão ataca funcionários públicos que tem descontado em folha 27,5% do salário e pune severamente quem não recolhe o imposto. Já grandes empresários sonegam milhões anualmente e magicamente nunca são “descobertos” 
                O papel do operador do direto, além de buscar novas soluções justas, é também o de aplicar as normas positivadas. Porém deve aplica-las a todos, igualmente, sendo justo.

                                                                                                                   "Lady Justice has been raped
Truth assassin
Rolls of red tape seal your lips
Now you're done in
Their money tips her scales again
Make your deal
Just what is truth? I cannot tell
Cannot feel"