quinta-feira, 20 de agosto de 2020

O socialismo utópico e o mito do ativismo capitalista

      O materialismo histórico de Karl Marx e Friedrich Engels sofreu influência da teoria do socialismo utópico, desenvolvida por filósofos burgueses, dentre os quais cabe destacar Henri de Saint-Simon, Robert Owen e Charles Fourier. O socialismo utópico acreditava na entrega dos meios de produção para o proletariado por meio da iniciativa de homens burgueses que, elucidados por solidariedade repentina, tomariam a frente na transição do modelo político, desconsiderando qualquer possibilidade de organização e mobilização da própria classe operária para esse fim.

    A lógica desse pensamento, hoje, nos parece tola. A possibilidade de uma classe favorecida pelo sistema abrir mão de seus privilégios de bom grado com o propósito de proporcionar justiça social, sabidamente, é remota, para não dizer inexistente. Mas me parece que o conhecimento da impossibilidade desse acontecimento e da ineficácia da insistência da fé nele não são perfeitamente assimilados por grande parte da população.

     A sociedade, e aqui me refiro à brasileira, por não ter conhecimento suficiente acerca de outras para inferi-las a mesma acusação, continua comemorando e se enganando por manifestações vazias de legitimidade e cheias de interesse comercial provenientes de grandes empresas, que fingem comemorar conquistas das classes sociais marginalizadas quando, na verdade, são agentes da opressão que dizem, para fins midiáticos e econômicos, serem contrários. O termo ‘pink money’ é um termo que exemplifica essa relação, sendo representativo do poder de compra da comunidade LGBT+, que é disputado por grandes marcas devido à sua expressividade. Essas marcas que atraem a atenção e o dinheiro do público ao lançarem produtos relacionados e enfeitarem suas fachadas em datas comemorativas são as que se calam diante de escândalos de homofobia em seus estabelecimentos e não aplicam esforço prático algum para beneficiar as pautas da causa.

    Outro exemplo, e esse muito mais sério, é o de empresas que manifestaram publicamente apoio ao movimento Black Lives Matter, mais cedo neste ano, ao mesmo tempo que não possuem políticas que busquem colocar seu apoio em prática e exploram a mão de obra da população negra em condições análogas à escravidão em suas fábricas.

      É contraditória a celebração e exaltação de marcas que expressam apoio à lutas sociais na mídia quando este não é acompanhado de medidas reais que defendam, de fato, os protagonistas dessa luta. É como se, assim como os teóricos do socialismo utópico, esperássemos que a solução viesse de cima, nos contentando com migalhas estrategicamente distribuídas para assegurar a manutenção do status quo. Atualmente, para muitos, é preferível, ao se referir às opressões estruturais, omitir o nome da estrutura.

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