domingo, 29 de setembro de 2019

As demandas sociais e a mobilização do direito

O cientista político da Universidade de Washington, Michael McCann, faz uma importante análise acerca do aumento do protagonismo do Poder Judiciário em seu artigo “Poder Judiciário e mobilização do direito: uma perspectiva dos “usuários”. O acadêmico reflete sobre a ascendência da atuação do Tribunais em decisões cada vez mais importantes e frequentes nas últimas décadas e tenta atribuir causas e explicações para esse fenômeno. Segundo McCann: "Os tribunais podem se fortalecer em diferentes contextos políticos, no que os fatores que impulsionam esse fortalecimento variam de contexto para contexto”.
A interação estratégica das elites é um dos fatores apontados por McCann, uma vez que os membros do Poder Legislativo podem se omitir diante de certas demandas e temas polêmicos de maneira intencional, a fim de não desagradar parte do eleitorado futuro. Tal conduta faz com que o Judiciário tenha que intervir de modo mais ativo.
Porém, o acadêmico atribui como hipótese mais apropriada a abordagem institucional histórica, isto é, as dinâmicas de mobilização do direito se introduzem em processos compostos de inúmeros e diversos atores e lógicas institucionais. Segundo McCann:

“os autores institucionais históricos apontam a necessidade
de se entender o fortalecimento judicial como um complexo
processo que envolve diversos atores do Estado e da
sociedade, e que os interesses devem ser entendidos em
termos de visões e ideias emergentes”.

De acordo com essa perspectiva, podemos extrair que a atuação judicial é incitada pelos movimentos sociais que mobilizam o direito buscando realizar seus interesses e ter seus valores e direitos reconhecidos. Essa dinâmica acaba por deslocar o enfoque nos tribunais para os grupos sociais e seus modos de atuação, de maneira a ocorrer uma revolução "de baixo pra cima". Na qual as minorias pressionam o Judiciário a resolverem suas demandas.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 26 é um exemplo que evidencia essa dinâmica. Nesse julgado, o Partido Popular Socialista (PPS) buscava criminalizar todas as formas de homofobia e transfobia, baseado no artigo 5º, inciso XLI da Constituição Federal - "a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais". Diversos outros representantes de grupos sociais como a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos e a Associação Nacional de Travestis e Transexuais se apresentaram como amicus curiae. 
Após a deliberação dos ministros, O Supremo Tribunal Federal decidiu por maioria, criminalizar a homofobia e a transfobia com base na Lei 7.716/89, por encontrarem semelhança entre os crimes de racismo e a discriminação contra indivíduos LGBTQ+. 
Essa decisão representa exatamente o que foi analisado por Michael McCann, visto que a demanda dos grupos sociais e suas diversas formas de atuação mobilizam o direito e levam os tribunais a proferirem resoluções vinculantes que criam novas normas, direitos e formas de conduta na sociedade.

Mariana Paz F. Puentedura - Matutino


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