sábado, 31 de agosto de 2019

Quando a bússola apontou para o Sul.


Quando a bússola apontou para o sul a diferença abissal da máquina jurídica encurtou e a Ecologia de Direito prosperou.

A socióloga Sara Araújo se propõe a uma reflexão sobre a partir de que matriz o campo jurídico toma forma, alertando sobre as “diferenças abissais”, que seria um apontamento de como diferenças, sobretudo sociais, acarretariam em atuações do Direito. A métrica estabelecida pela pensadora toma origem em um método que divide os âmbitos sociais entre “norte” e “sul”, sendo o primeiro aquele em que reside a hegemonia cultural e os rótulos dados socialmente como normativos, enquanto o segundo seria as ideologias popularmente intituladas como atrasadas e com pouco valor.

Em 2001, a Fazenda Primavera, em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, serviu de loco para o processo do Agravo de Instrumento Nº 7003434388, em que foi mobilizado o debate a cerca da função social da propriedade que viera sido ocupada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Protegendo o Artigo 5º, incisos XXII e XXIII, que garante o direito à propriedade, e que essa atendera sua função social, respectivamente, o tribunal foi contra a reintegração de posse desejada pelos agravantes, dado que, em suma, não tinham provas para legitimar a produtividade de suas terras, e portanto essas não estariam cumprindo sua função social.

Englobando conceito e fato; O MST seria o “lado de lá”, o “Sul”, como define Sara Araújo. Ou seja, o lugar onde o Direito atua como Poder limitado, estando alojado nesse âmbito o MST, que tem seus dramas, luta e ideologias, se analisados do panorama hegemônico, rotulados como assimétricos, arcaicos, selvagens e “invisíveis”. Já o “lado de cá”, o norte, dita a cultura jurídica que será dada como predominante, é ocupado, no caso, pelos donos das terras. O efeito sociológico desse fenômeno, que divide os direitos em orientações, é o achatamento dos anseios do lado sul, tornando-os ‘invisíveis’, protegendo assim a hegemonia das forças do ‘’ lado de cá’’. Esse processo que cria uma monocultura faz com que o Direito incorpore uma razão metonímica, criando a impressão de um “Direito para todos”, ou seja, com regras polivalentes que refletem de maneira igual para todas as partes julgadas.

Dessa forma, a negação ao pavimento de tal Agravo de Instrumento desafia o pensamento abissal e contribui para a desconstrução da monocultura. Com isso, a Ecologia do Direito, que se manifesta quando a diversidade de Direitos se manifesta, felizmente prospera, trazendo esperanças para um sistema jurídico no qual a ‘interlegalidade’ seja atuante.

Matheus de Vilhena Moraes - Direito (noturno)

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