domingo, 10 de junho de 2018



“E a concorrência entre os intérpretes está limitada pelo fato de as decisões judiciais só poderem distinguir-se de simples atos de força políticos na medida em que se apresentem como resultado necessário de uma interpretação regulada em textos unanimemente reconhecidos” (BOURDIEU, 1989, p. 214)

            As ações diretas, como é o caso das ADPF, são manifestações claras da ocorrência de um processo de transição no Direito. A democratização implica muitas mudanças na forma do exercício da justiça, dentre as quais se destaca a possibilidade de interpelação por parte da sociedade civil às cortes competentes para denunciar controvérsias no que diz respeito aos direito adquirido e a posição do Estado. Nessa linha, a ADPF 54/2012 consiste num exemplo da aplicação do ponto de vista de Pierre Bourdieu sobre o Direito e da consolidação de uma nova ordem social.
Bourdieu é um dos símbolos da oposição à ideia de isolamento da lei em relação às forças sociais externas. O esqueleto que sustenta o Direito não é fruto de um desenvolvimento próprio, mas provém de uma estrutura de poder que se projeta sobre o campo do direito  e faz com que o poder simbólico seja exercido também no âmbito jurídico. Nesse caso, o sociólogo francês destaca que o exercício do poder através do Direito parte do emprego de “textos unanimemente conhecidos”, ratificando seu argumento acerca da tendência universalista do direito.
 Dito isso, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental é um demonstrativo do emprego de legislações do conhecimento comum dos intérpretes - tendo como destaque a Constituição Federal de 1988 e o Código Penal de 1940 - no sentido de mobilizá-los de acordo com o direito objetivo e, naturalmente, com suas convicções jurídicas. Por mais que as interpretações se voltem para as mesmas fontes normativas, houve diferentes formas de dizer o Direito, no sentido de mobilizar preceitos constitucionais - hierarquicamente superiores àquele da legislação penal - que estivessem alinhados.
Sem dúvida, alinhar direitos sociais considerados à vanguarda de seu tempo, como é o caso daqueles previstos na Lex Mater com um código de 1940 outorgado por um decreto-lei resultaria na prevalência de uma interpretação baseada nos preceitos constitucionais, tendo em vista a transformação jurídica anteriormente mencionada. Isso, além do conhecimento comum, implica num pôr-em-forma comum em relação ao enquadramento das normas aos princípios predeterminados constitucionalmente.

João Pedro Santos Frari, Matutino


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