segunda-feira, 27 de novembro de 2017

A Questão do Aborto

São muitas as questões que podem ser abordadas quando se trata do aborto. Aqui especificamente está sendo discutida o aborto de anencéfalos. No dia 12 de abril de 2012 foi declarado pelo Supremo Tribunal Federal que não é crime interromper a gravidez quando for constatada a anencefalia do feto. A polêmica dessa decisão é discutida até hoje, envolvendo âmbitos científicos, religiosos, sociais e jurídico.
Analisando a situação da esfera cientifica é necessário falar de em que ponto cientificamente começa a vida. Existem diversas teorias, algumas delas são a Teoria Concepcionista, que defende o inicio da vida com a concepção; a Teoria da Nidação que compreende que a vida começa a partir do momento em que o óvulo fecundado se fixa na parede uterina; a Teoria Gastrulação, na qual apenas após o desenvolvimento embrionário da gástrula até a néurula é que o feto será considerado uma vida; a Teoria Natalista, em que a vida começa a partir do nascimento do feto com vida. Por fim, surge uma teoria contemporânea chamada Teoria da Formação dos Rudimentos do Sistema Nervoso Central, defendendo que a vida começa quando o feto desenvolver seu sistema neurológico, porque a partir daí ele tem sensações como dor e prazer, outro ponto que corrobora com essa teoria é a declaração do fim da vida quando a pessoa não apresenta mais sinais de atividade cerebral, logo a vida começaria quando fossem notadas essas primeiras atividades. Assim, partindo dessa teoria, a autorização para que sejam feitos abortos de fetos anencéfalos faz sentindo, já que a vida seria definida pela existência de um sistema neurológico.
Agora, partindo do ponto de vista religioso, é necessário analisar que a maioria do país seguem religiões de vertente cristãs. Essa vertente condena de forma explicita o aborto, pois acredita que a partir do momento em que há a concepção, o feto possui alma e por isso a gestação deve ser levada até o fim, mesmo que isso acometa riscos a grávida e mesmo que já se saiba que o feto nascerá sem vida. Entretanto, na teoria o Estado é laico, ou seja, não deve ser influenciado por nenhuma vertente religiosa, porém isso não acontece na prática, pois a religião está intrinsecamente ligada ao habitus, conceito de Bourdieu que faz menção a toda disposição incorporada, na trajetória de vida e origem social do individuo, afetando seus julgamentos. Mas, para que o jurista consiga de fato realizar seu trabalho ele não pode se prender ao habitus.
Outra parte da teoria de Bourdieu pode ser utilizada na questão social envolvendo o aborto é quando o mesmo discorre sobre o poder simbólico e a violência simbólica. O poder simbólico, de acordo com o autor, é aquele que quase ninguém vê, que é quase invisível e que se manifesta através de sistemas simbólicos, como a linguagem, a religião, a arte. Esses sistemas simbólicos criam produções simbólicas que servem de instrumento de dominação utilizadas pelas classes privilegiadas.
“É assim que os sistemas simbólicos cumprem a sua função política de instrumentos de imposição ou de legitimação da dominação, que contribuem para assegurar a dominação de uma classe sobre a outra (violência simbólica) dando o reforço da sua própria força às relações de força que as fundamentam e contribuindo assim, segundo a expressão de Weber, para a domesticação dos dominados (BOURDIEU, 1989, p. 11).”
Desse modo, é através dessa dominação pelo poder simbólico que é reforçado por meio de relações assimétricas, contribuindo assim para todo tipo de preconceito de violência, incluindo a violência de gênero.
“Contudo, em virtude da ordem de gênero patriarcal, ‘machista’, dominante em nossa sociedade, são, porém, as mulheres e, em menor número, os homossexuais, que se vêem mais comumente na situação de objetos/vítimas desse tipo de violência (SARDENBERG, 2011, p. 1).”
E é aqui que a questão do aborto pode ser encaixada. A violência nesse quesito está ligada ao patriarcado e ao machismo que além de colocar a responsabilidade de ter engravidado apenas sobre a mulher, impõe também a mesma a obrigação de ser mãe. Apesar de se tratar do corpo dela, e ainda mais quando a gravidez é de risco, ela é excluída da decisão de ter ou não um filho. Outro ponto, agora relacionada com a anencefalia, é o trauma psicológico de uma mulher que carregou 9 meses um feto que vai morrer logo após seu nascimento, assim, a decisão deve ser dela se ela quer ou não passar por isso.
Por fim, observando de um ponto de vista jurídico, é dever do legislador defender os preceitos fundamentais e dentre eles está o direito a vida. Porém isso pode ser relativizado em questões como homicídios justificados em caso de guerra ou legitima defesa, e no quesito do aborto, principalmente quando há gravidez de risco, que vida ele deve defender? A da mãe ou a do feto? Já foi comprovado que o aborto já não é mais uma questão puramente relacionada à vida, mas sim de saúde publica, já que ele é a quinta maior causa de morte materna no país devido à falta de estrutura para realiza-lo. Logo, a lei não salva a vida dos fetos, a lei mata as mães.
Portanto, o que foi discutido e deliberado na ADPF 54 é um avanço no que diz respeito a garantia de direitos relacionados a mulher, além de ultrapassar questões religiosas demasiadamente presentes no governo brasileiro, defendendo a laicidade do Estado. Apesar dessa decisão ter ajudado, ainda há muito mais para ser debatido sobre o assunto, visando assim garantir o direito a vida e a autonomia das mulheres sobre seus próprios corpos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADICIONAIS:
CASTRO, Taynara Cristina Braga. ADI n.º 3.510: bioética e suas repercussões no ordenamento jurídico. Disponível em: . Acesso em: 27 nov. 2017.

COSTA, Neila Santos. O Poder Simbólico e a Violência Simbólica. Disponível em: < http://www.naomekahlo.com/single-post/2015/06/29/O-Poder-Simb%C3%B3lico-e-a-Viol%C3%AAncia-Simb%C3%B3lica>. Acesso em: 27 nov. 2017.


MARIA CLARA AGUIAR                                                             1º ANO DIREITO/NOTURNO

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