domingo, 24 de setembro de 2017

Capitalismo: Jaula de aço?

O mundo atual, embora abrigado por alguns como pós-moderno e inserido em uma nova Era do pós Guerra Fria, ainda dá mostras e expõe desdobramentos da exasperada polarização entre capitalistas e socialistas, entre mercado e revolução, entre liberdade e igualdade, sobretudo, do século XX. Exemplos patentes dessa perspectiva de confronto em aberto, ou mal encerrado, são as ditaduras socialistas de Venezuela e Coréia do Norte.
Pelo lado venezuelano, já são mais de 100 mortos, só em 2017; 6 mil detenções arbitrárias; cerca de 2 milhões emigraram; pessoas são enquadradas como terroristas simplesmente por terem em seus celulares “conteúdos de oposição política” − além do ditador Maduro ter imposto uma Assembleia Constituinte sem uma mera figura da oposição e excretar aberrações como “o que não se consegue com votos, conseguir-se-á com balas”. Já dos norte-coreanos, temos os relatos das mais macabras mortes – como de integrantes da própria família do ditador Jong-um, jogados em jaulas com leões −, além das mais perversas formas de trabalho forçado e tortura. Outras indiscrições chamam também a atenção, como o dia em que não se pode sorrir e dançar e as personalíssimas estátuas que homenageiam o execrável ditador por todo o território.
Os dois países, embora extremamente distintos e até distantes, guardam entre si sinteticamente a similaridade de contarem com déspotas que permanecem fiel, incessante e insensatamente lutando contra o capitalismo e tudo aquilo que o colocaria como fator de desigualdade. Dessa celeuma toda, mostra-se conveniente meditar com Max Weber, que se dedicou na temática do espírito do capitalismo e suas repercussões.
Weber, ainda que não um liberal ou entusiasta do livre mercado – via o capitalismo como uma “jaula de aço” −, apreende lucidamente que o sistema econômico não era tão-só uma opção político-econômica a ser, ou não, adotada. Suas teses assistem ao sistema, não como um fenômeno moderno, mas como um artefato presente e inerente a toda história do Homem, caminhando a uma espécie de “capitalismo intrínseco ao ser humano”: não seria o capitalismo o gerador de ganância ou cobiça, mas o espírito de acumulação, presente em toda história do Homem, que acabaria por tê-lo criado enquanto ética ou modo de vida – mesmo nas sociedades mais primitivas, é possível ver o ser-indivíduo pré-disposto a valer-se de sua força de trabalho para sobreviver e se fazer perante a natureza, adversidades e os seus antagonistas semelhantes.
Se para Marx toda passagem e transformação no curso da História teria sido produto de uma luta de classes e do materialismo a ela concernente, Weber passa a ver o Homem enquanto indivíduo capaz e racional, que imprime intencionalidade em suas condutas – as chamadas “Ação Social” −, as quais têm motivos, objetivos e geram consequências. O indivíduo weberiano, portanto, é livre para agir e a sociedade que compõe é resultado justamente das relações entre ele e seus pares, afastando-se da obsessiva premissa marxista do determinismo sócio histórico, que se mostra restrita ao reducionista “proprietário versus trabalhador” como determinador de tudo e todos, ignorando, entre outros fatores, a esfera cultural e a de poder e prestígio − algo fisiológico e displicente que parece ver o Homem como um ser que precisa somente do pão, esquecendo-se até do circo.
Dessa forma, parece pertinente contrastar os expostos ditadores com as moderações realistas e pragmáticas de Weber quanto ao capitalismo. Têm-se os primeiros que, sob a prerrogativa de combater o "selvagem" objeto de estudo do pensador – embora do consumo usufruam, vide a riqueza dessas elites política −, passam a paranoicamente centrar suas contendas numa luta de classes binária e, sobretudo, já desvirtuada: hoje as relações de trabalho contam não mais com o exclusivo duelo clássico “porco capitalista versus operário chão de fábrica”, e, sim, com uma variedade de ofícios e seguimentos, como operadores de informação, funcionários públicos, prestadores de serviço e donos dos mais variados pequenos negócios. Resultado dessa guerra tresloucada ao capital é não mais que a invariável corroboração com a máxima de Friedman: “a sociedade que coloca a igualdade à frente da liberdade irá terminar sem igualdade e liberdade”.
Assim, nota-se que, após a queda do Muro de Berlin, alguns países parecem ter caminhado a Weber – ou seja, achando belo, ou não, mas aderindo ao capitalismo e se beneficiando das liberdades individuais para empreender, negociar e tomar decisões autônomas −, enquanto outros têm partido ou permanecido sadicamente com as já “apreciadas” ditaduras sanguinárias, em busca de uma perfeição hipotética de igualdade material, material e material – como se para libertação e independência, somente isso bastasse. Exemplo do primeiro grupo é a desconhecida Estônia, ex-integrante da URSS, que ao abrir o mercado (em 18 minutos é possível se abrir uma empresa, pela via digital), em pouco mais de 20 anos longe do comunismo, já tem um IDH de 0,865 e um poder de compra per capita de mais de 20 mil dólares. O segundo grupo, por sua vez, mostra-se bem sintetizado em nações como a revolucionária Venezuela, que a cada 4 venezuelanos, 3 já perderam, em média, 8,6 quilos; a pobreza já se aproxima dos 90% e falta até o papel higiênico.




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