sexta-feira, 20 de novembro de 2015

O peso sobre o corpo dos togados

Os togados são criaturas um tanto quanto peculiares: ainda que deles não se saiba muita coisa, espera-se deles, comumente, que saibam tudo. Tudo, no entanto, eu garanto que eles não sabem. Ainda assim é impossível afirmar que não reunam uma inacreditável quantidade de informações dentro de suas cabeças brancas e calvas. Tanta sabedoria, aliás, acaba pesando sobre os músculos da face, de forma que acabam franzidos e rijos. Em tempos de legislação omissa, morosa, irresponsável e de uma evidente e grave crise de representatividade, as demandas sociais acabam invariavelmente por recorrer aos togados. Mais um peso, portanto, que se precipita sobre os humanos corpos dos togados. No entanto, não estamos finalizados. Diante de toda essa conjuntura, exige-se que os juízes suportem encargos cada vez maiores sobre seus dorsos.
No Brasil, por exemplo, as circunstâncias acima descritas notadamente se fazem presentes. O ilustre caso da ADI (Ação direta de inconstitucionalidade) 4277, proposta em 22 de julho de 2009 pela Procuradora-Geral da República, a qual visava tornar obrigatório o reconhecimento da 
união
 entre 
pessoa
s do
 mesmo
 sexo, 
como 
entidade 
familiar, 
desde 
que
 atendidos
 os
 requisitos
 exigidos
 para
 a
 constituição
 da
 união
 estável
 entre
 homem
 e
 mulher, foi resolvido pelo Judiciário de maneira ativista, através da aplicação direta da constituição a circunstâncias não diretamente contempladas por seu texto. O reconhecimento, aos casais homossexuais, dos mesmos direitos que contemplam as uniões estáveis heteroafetivas exigiu, ademais, uma imposição de atitudes ao Poder Público, englobando, assim, outro aspecto prático do desempenho proativo do Judiciário.
Não obstante, tal procedimento decisório gerou algumas controvérsias acerca de tal postura do Judiciário, firmadas com base no argumento de que este supostamente estaria ultrapassando os limites de competência estipulados pela separação de poderes com a finalidade de evitar a prática de arbitrariedades por parte do Estado.
Por sua vez, Luís Roberto Barroso, um dos ilustres togados pertencentes ao dream team do Supremo Tribunal Federal brasileiro, em um excelente e esclarecedor artigo publicado, denominado "Judicialização, ativismo judicial e legalidade democrática", faz as suas ponderações acerca de tal posicionamento crítico ao ativismo judicial. Evidentemente, Barroso é favorável à postura proativa do Judiciário; isso no entanto não o impede de tecer alguns comentários, pontuais e necessários, sobre os limites legislativos e decisórios a serem respeitados pelos togados. Com efeito, afirma ele, em defesa do ativismo, que a expansão do Judiciário é benéfica no sentido em que decide assuntos relevantes os quais vêm sendo negligenciados pelo debilitado Legislativo brasileiro, pelos já apontados motivos de crise de representatividade e de precarização da atividade legislativa. Por outro lado, aponta a importância da atividade política para a efetiva manutenção da democracia, explicitando, além disso, que os juízes devem ter em mente que existem situações nas quais o Judiciário não é o poder mais apto à resolução de contendas. Chama, ademais, atenção para o fato de que devem os magistrados ter um senso de cautela e serenidade, pelo fato de que suas decisões podem gerar consequências não previstas; cabe a eles, dessa forma, saber identificar as situações nas quais é cabível sua intervenção decisória, optando, certas vezes, por não exercer seus poderes.

Luís Roberto Barroso ensina dessa forma que, além das meras obrigações legislativas e de atitudes proativas, o peso sustentado pelos frágeis dorsos dos togados na atualidade é sobretudo composto pelo estafante e exigente encargo da responsabilidade.

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