domingo, 8 de novembro de 2015

As cotas raciais no Direito emancipatório

A ação do Partido Democratas (DEM) de Arguição de Preceito Fundamental (ADPF) alegou a inconstitucionalidade da implementação de cotas raciais adotadas pela Universidade de Brasília (UnB), pedindo a suspensão da primeira chamada dos ingressantes do segundo semestre de 2009.

Segundo o partido, a UnB estaria desrespeitando preceitos fundamentais da Constituição Federal, como o princípio da igualdade nas condições de acesso ao ensino e o princípio meritocrático. No entanto, a sua interpretação se afasta da realidade brasileira à medida que no país ações afirmativas como as cotas raciais são um meio de garantir a efetivação desse princípio, e a meritocracia exige um mínimo de igualdade de oportunidades, o que não existe no país.

Boaventura de Sousa Santos discute em seu artigo, “Poderá o direito ser emancipatório?”, o direito como mecanismo de mudança social. Dessa forma, explica que a falta de negros nas universidades públicas não se dá pela falta de “mérito” dos mesmos, mas por haverem sido excluídos do contrato social. As cotas raciais seriam, assim, uma forma de transformar a sociedade civil incivil – os totalmente excluídos – em sociedade civil estranha – inclusão parcial; sendo o primeiro passo na direção emancipatória.

O pedido do DEM, justificado pela igualdade formal e pelo discurso meritocrata, deixa de lado o “filtro” exigido para a entrada na universidade pública. Santos explica-o pelo surgimento, no século XXI, do fascismo social, que faz da classe social dominante a fonte de poder e conhecimento, reproduzindo uma perspectiva geral e utilizando-se do econômico como pilar social.

Foi a partir da percepção desse fascismo social que a UnB adotou o sistema de cotas: verificou-se que a universidade se limitava a estudantes brancos, com maior poder aquisitivo e oportunidades de instrução; buscaram então a pluralidade. fundamental para o desenvolvimento dos alunos. Boaventura de Sousa Santos enfatiza a importância dessa pluralidade ao afirmar que “quanto mais as pessoas permanecem num ambiente uniforme”, ou seja, com pessoas iguais a elas, sem os riscos de incompreensão e debates, “mais é provável que ‘desaprendam’ a arte de negociar significados compartilhados e um modus operandi agradável”: não conseguem, dessa forma, respeitar e conviver com aqueles que são diferentes, desconhecidos, ampliando-se cada vez mais o estranhamento; seria esse, portanto, um dos motivos da continuidade da existência do racismo.

Santos propõe, então, o cosmopolitismo subalterno, que seria uma globalização contra-hegemônica, um pluralismo o qual, a partir de objetivos comuns, diferentes movimentos sociais se uniriam, como é o caso da Central Única dos Trabalhadores, que se pronuncia a favor das cotas. A importância do Direito como mecanismo de mudança social seria a mesma, de atuar contra o sistema de dominação e exclusão. A decisão judicial do Superior Tribunal Federal nesta ADPF, a favor das cotas raciais na universidade, é um exemplo de atuação do Direito emancipatório.

Letícia Solia
1º ano - Direito diurno

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