segunda-feira, 18 de março de 2024

Mills e o trabalho escravo contemporâneo

 

Comparando os pensamentos de Charles Wright Mills e o fenômeno do trabalho escravo contemporâneo, podemos lançar luz sobre questões sociais relevantes. Mills, um sociólogo renomado, enfatizou a importância da "imaginação sociológica", que é a capacidade de conectar a experiência pessoal com estruturas sociais mais amplas. Para ele “[...] tudo aquilo de que os homens comuns têm consciência direta e tudo o que tentam fazer está limitado pelas órbitas privadas em que vivem. Sua visão, sua capacidade, estão limitados pelo cenário próximo: o emprego, a família, os vizinhos; em outros ambientes movimentam-se como estranhos, e permanecem espectadores” (MILLS, 1965).

 

Aplicando essa perspectiva ao trabalho escravo contemporâneo, podemos entender como as relações de poder, desigualdades econômicas e falhas institucionais perpetuam essa prática. A exemplo disso, pode-se citar o caso atual de uma juíza que aceitou a denúncia do Ministério Público Federal contra uma mãe e um filho que eram patrões da dona Maria de Moura. A família virou réu na Justiça e é acusada de trabalho análogo à escravidão, coação e apropriação de cartão magnético de idoso. Segundo a matéria veiculada pelo Fantástico, a Justiça informou que as visitas de dona Maria à própria família eram controladas e o celular ficava com o patrão. Eles apontam também que, para a promotoria, o caso representa um recorde negativo no Brasil: "é o mais longevo, em que a pessoa permaneceu mais tempo nessa situação, 72 anos", e assentam que o Ministério Público do Trabalho resgatou a vítima, que atualmente tem 87 anos, a partir de uma denúncia anônima.

 Vale salientar que a defesa alegou que Maria era parte da família e que, no dia do resgate, na frente dos fiscais, André segurou o braço da vítima antes dela ser ouvida disse: "você não diga que trabalhou para a minha mãe, senão você vai..." e disse um palavrão. Esse ato expõe com clareza a concepção de Mills (1985) quando ele expõe que: "Quando as pessoas estimam certos valores e não sentem que sobre eles pesa qualquer ameaça, experimentam o bem-estar. Quando os estimam mas sentem que estão ameaçados, experimentam uma crise – seja como problema pessoal ou como questão pública. E se todos os seus valores estiverem em jogo, sentem a ameaça total do pânico”.

 Ao examinar histórias como essa, as quais envolvem o trabalho escravo contemporêneo, podemos ver como as experiências são moldadas por estruturas sociais mais amplas, como políticas trabalhistas deficientes, corrupção e impunidade. Essa perspectiva destaca a necessidade de não apenas abordar esse assunto como um problema individual, mas sim como um sintoma de injustiças sociais mais profundas. Portanto, aplicando a "imaginação sociológica" de Mills a essa questão, pode-se desenvolver uma compreensão mais profunda das raízes e consequências dessa temática nos dias atuais, buscando soluções mais eficazes e justas para combatê-lo.

 REFERÊNCIAS:

 

MILLS, C. Wright. A imaginação sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1965.

 'Minha tia perdeu uma vida inteira', diz sobrinho de idosa resgatada após 72 anos de trabalho análogo à escravidão. FANTÁSTICO, 11 de março de 2024. Disponível em: <https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2024/03/11/minha-tia-perdeu-uma-vida-inteira-diz-sobrinho-de-idosa-resgatada-apos-72-anos-de-trabalho-analogo-a-escravidao.ghtml>. Acesso em: 17 de março de 2024.


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