quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Omissão e Conivência

 

Diante dos avanços e retrocessos protagonizados pela sociedade brasileira nas últimas décadas, a discriminação, paulatinamente, foi se transformando em uma realidade cada vez mais intolerável. Nesse sentido, diversas práticas refratárias à essência da Constituição Federal de 1988 – vide o art. 5° da mesma – foram recebendo luz, elucidando-se, dessa forma, seus nuances e, principalmente, alternativas para a supressão de tais práticas. Assim sendo, diante de uma ausência legislativa no que tange a elaboração de normas que abarcassem de modo mais específico a população LGBTQIAP+, coube ao STF, mediante os julgamentos do Mandado de Injunção (MI) 4733 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, explicitar a criminalização da homofobia.

Segundo a perspectiva do jurista francês Pierre Bourdieu, divergindo, portanto, da óptica de Hans Kelsen – defendendo alguma “neutralidade” –, o pensamento e a ação jurídica não podem estar dissociados das pressões provenientes da sociedade. Nesse sentido, caberia ao Poder Judiciário, no caso ao STF, decidir sobre uma eventual criminalização mais expressa de tal conduta, de modo a amparar em sua análise alguns fatores de relevância da sociedade brasileira hodierna, como os elevados índices de assassinatos, agressões e demais violações de direitos contra esses grupos, a inoperância do demais poderes constituídos, além, evidentemente, do rigor devido ao ordenamento jurídico vigente.

Já o jurista Antoine Garapon, também francês, conceituando o que seria a tutelarização do sujeito, explicita que, com o desenvolvimento das sociedades, o direito passa a ter, também, a função de tornar expressa as normas e os direitos que, por vezes, estariam mais implícitos. Dessa forma, mesmo que alguns dispositivos do texto normativo já vedem a discriminação e seus anexos, colocar luz sobre a criminalização da homofobia seria uma forma de o direito não se furtar, ao menos no que tange a contemporaneidade, de seu dever.

Pela visão do jurista estadunidense Michael McCann, o poder dos tribunais podem ser exercidos de modo direto ou indireto. Tal perspectiva reforça a necessidade e relevância das decisões tomadas pelo STF, posto que além de decisões mais pontuais relacionadas a julgados – MI 4733 e ADO 26 –, poder direto, o tribunal simboliza e, mais do que isso, reafirma a decisão política de 1988, em outras palavras, dá luz à essência da CF de 1988, poder indireto.

Conclui-se, pois, que os julgamentos do Mandado de Injunção (MI) 4733 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, que configuraram a explicitação da existência da homofobia como crime foram de fundamental relevância para o resguardo de direitos contemplados pela população LGBTQIAP+, além de elucidar algo que pode ser considerado como a essência da CF de 1988, seu cerne, sendo respaldado para tal em pensamento e conceito que transitam desde Bordieu e Garapon, até McCann. Em síntese, um judiciário mais atuante tem, na contemporaneidade, demonstrado-se um mecanismo de fundamental importância para que direitos possam ser assegurados e o texto constitucional preservado.

Wiliam de Oliveira Farias Junior

RA: 221224289

Turma: Direito noturno 2022

 

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