quinta-feira, 6 de outubro de 2022

A influência das ações judiciais na busca pela liberdade de exercer os direitos fundamentais de um coletivo minoritário

    A Ação de Inconstitucionalidade número 4277 foi debatida pelo STF no ano de 2011. A busca central dessa ADI era compreender se a proibição do reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo era considerado algo inconstitucional ou não. Para isso, entraram em conflito, na discussão, os direitos fundamentais e as teorias jurídicas acerca do texto constitucional.

Ao analisarmos a constituição, notamos o artigo 5º nos quais estão previstos os direitos fundamentais. Dentre todos os direitos ali previstos, vale a pena atentar-se ao inciso X que disserta sobre a vida privada e a intimidade. Todos temos direito de exercer livremente nossa vida privada desde que não se contrarie as leis. No entanto, no caso de casais homoafetivos, a vida privada era fortemente impactada pela impossibilidade de exercer os direitos de união e seus decorrente (herança, divisão de bens, etc). Além disso, temos como princípio legal defendido pela Constituição a isonomia das normas, isto é todos deveríamos ser compreendidos de forma igualitária perante a legislação, porém, isso não se demonstra real quando apenas a parcela heteronormativa consegue usufluir plenamente dos direitos de matrimonio e de união estável.

Além disso, não se faz uma definição exata de família nos termos da Constituição, havendo, portanto uma possibilidade de referência, ao superar a feitura de uma interpretação textualista da norma, à pluralidade de famílias existentes na sociedade atual, incluindo as famílias fundamentadas em um casal homoafetivo. Haja vista essa argumentação que demonstra a inconstitucionalidade de se perpetuar esse estigma legal ao casamento LGBTQIAP+, o que permitiu tão tardia discussão por parte das instituições estatais? Os conflitos sociais de força progressista e anti progressistas.

Tal ponto pode ser compreendido a partir da concepção de “espaço dos possíveis” de Bourdieu. Segundo essa linha de pensamento, o direito é compreendido como uma ferramenta que se fundamenta e se altera a partir das movimentações sociais. Dentro dessas possibilidades de movimentações, encontramos na sociedade brasileira um choque crescente que envolve a busca por reconhecimentos de necessidades minoritárias e a necessidade de reafirmação de poder de um grupo hegemônico. Nesse caso em específico, é possível notar a tentativa do coletivo LGBTQIAP+ buscar a consolidação de suas relações amorosas e concepções de família a fim de reafirmar a existência dessa diversidade. No entanto, em contrapartida, há a ação constante de repreensão por parte de uma parcela social que se fundamenta em argumentos moralistas religiosos; gerando uma barreira a ser enfrentada pelos movimentos sociais. Assim, a luta dos LGBTQIAP+ tornou-se mais lenta devido essa necessidade de combater o silenciamento.

Perpetuando nos ideais de Bourdieu, faz-se necessário mencionar  os fatores da neutralização e  da universalização que contribuem para o entendimento de que as normas não deviam ter um caráter subjetivo, selecionador, e sim amplo e geral. Com isso, o casal que deseja contrair matrimônio ou iniciar uma família não deveria ter seu direito barrado por questões de gênero. Além disso, Kelsen prevê, em sua teoria, que tudo aquilo que não está formalmente expresso como proibido, na lei compreende-se como permitido. Assim a união entre casais homoafetivos não expressa-se como algo ilegítimo. A ADI discutida pelo STF foi discutida em um momento histórico coerente, pois, considerando-se a realidade atual de crescente de vozes dessa causa e a constante procura por adoção para a constituição de uma família, o movimento apresenta a necessidade de equiparação normativa.

Ao que tange o STF, a tomada de decisão pelo Poder Judiciário mostra a abertura democrática para um espaço de debates de pautas ao considerar as demandas sociais atuais.  Assim, demonstra-se um caso de  ativismo judicial, uma amostra de que o direito não é o centro e sim uma mera ferramenta da dinâmica social, sendo usado como uma forma de conquista de direitos por muitos grupos minoritários, incluindo esse caso. A necessidade de intervir pelo STF decorre do fato de ser um critério de inconstitucionalidade, isto é, uma necessidade de revisar os quesitos legais vigentes para compreendimento da conduta da norma. Assim, o Poder Judiciário atua apenas cumprindo com a sua função estabelecida.

Por fim, compreende-se que a ação do STF ao que se refere a Ação de Inconstitucionalidade número 4277 é mais um exemplo de como a atuação do Poder Judiciário auxilia no funcionamento democrático do país, pois permite o reconhecimento de demandas populares na renovação constante do direito, incluindo a garantia de que haja a expressão dos direitos fundamentais de diversos grupos minoritários.


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