terça-feira, 23 de novembro de 2021

A NECESSIDADE DOS MOVIMENTOS SOCIAIS SOB A ÓTICA DE SARA ARAÚJO

 

A presente analise da necessidade dos movimentos sociais sob a ótica da autora Sara Araújo evidencia o pensar crítico do direito em relação ao direito institucionalmente constituído, evocando considerações essenciais sobre o sul das relações capitalistas e sociais, não se referindo ao sul geográfico, mas ao sul do campo da ideias, do não hegemônico, da necessidade de se ultrapassar a linha abissal do pensamento entre a referência do que seria norte e sul, que é um abismo que não se consegue vencer, visando a descentralização do branco como centro, da cultura produzida para um grupo, do não binarismo, fala sobre o que não se considera, se debate os temas que convencionalmente não se debate, mas onde se quer chagar com tais debates e transposições de abismos.

Tenta-se chegar a conscientização social, em mostrar uma interpretação do mundo onde o sujeito passa a ter noção de seus direitos, de mostrar ao sujeito o local onde ele se encontra nesse campo de sul e norte, de forma racional, mostrar a ele quais são suas demandas, quais são seus direitos, ajuda-lo a encontrar seu caminho e de maneira clara quais são suas lutas e como elas devem ser combatidas, é adentrar e mostrar o espaço dos possíveis para si e para estabelecer e pacificar direitos que serão estabelecidos e continuados em gerações futuras, pois a necessidade de se estabelecer esses espaços e conquistas no campo jurídicos é real e se não existe essa luta e fixação desses direitos de forma positivada eles simplesmente não irão existir de fato, será apenas uma forma abstrata e insignificante de senso comum que nada teria de útil e pratico ao cidadão minoria.

Esse local a que a autora nomeia sul, quando se expressa soa dor aos ouvidos do norte, abalada juridicamente o ordenamento fixado e positivado, pois mostra os erros que existem, que na verdade não se tratam de erros, pois foram  positivados de maneira intencional e a voz do sul vem confrontar e tornar público a esses grupos não convencionais que esse positivamento fora criado para deixa-los a margem da sociedade de todas as formas e mostra que essa discriminação é errada e que todos esses grupos tem seus direitos e que devem lutar para fixa-los e vai além, pois mostra o caminho a ser trilhado através dos movimentos sociais.

O movimento que as falas do sul trazem estimulam a mudança necessária, mas de uma maneira em que também depende do indivíduo fazer parte dessa luta, dessa pressão constante, pois hoje essa luta é reflexo de lutas anteriores e tem suas bases históricas desde quando se classificava a evolução das pessoas conforme o padrão da Europa, que abriu caminhos para a escravidão, para o racismo estrutural, e note que a luta é realmente importante, nessa linha de luta do sul das ideias, e principalmente por causa do contramovimento do norte, não se pode baixar a guarda, pois o período em que as pessoas foram classificados como subdesenvolvidos até a escravização desses mesmos povos e países foi relativamente curtos e até hoje não foram restabelecidos os direitos que foram tirados naquela época, então baixar a guarda dessa luta é muito perigoso, pois não quer dizer que o retrocesso levara o mesmo tempo das conquistas, pois o campo jurídico não está apartado da realidade social.

A autora mostra de maneira brilhante com a ilustração do norte e sul e da linha abissal para retratar a imposição que é feita as massas e seu levante político através das demandas que abalam sismicamente o lado norte das ideias, confrontando esses paradigmas e rompendo a linha abissal cada vez mais, e essa investida legitima do sul não só conquista campo nas ações demandadas com temas específicos, como também mostra a outros oprimidos que suas demandas podem ser acolhidas, podem também romper a linha abissal e fomentar de dentro das instituições que controlam o poder a mudança no comportamento social, melhorando assim a vida de muitos, pois direitos conquistados não só abrem brechas jurídicas para novas demandas como também gera a antecipação da desistência do contramovimento do norte em causas, em pontos de vista que eles não podem mais defender.

Interessante o ponto de vista da autora que mostra que assim como em um ordenamento jurídico toda norma nova não pode destonar do sistema normativo vigente, no campo das lutas, as demandas sociais tem relação entre si mesmo que a princípio os temas pareçam não ter relação, e nesse viés esses movimentos quando somados formam grupos de pressão deixando os tribunais em uma grande saia justa, pois embora tenham sido criados para a manutenção dos direitos da elites, esses tribunais tem em sua fachada que pertence ao povo e quando a pressão desses grupos é muito forte eles não tem como não ceder esses direitos ao povo.

Muitos temas ainda são nada dentro dos tribunais, nos ambientes do sul, são pautas que ainda estão silenciosas e essas pautas precisam de voz para que cheguem de maneira incomoda ao norte, pois se essa voz chega de modo sutil ela não gera desconforto aos ouvidos nortistas, pois o mesmo tem ciência das demandas e muitas vezes até as cita de maneira pífia, mas para se estabelecer direitos e fixar posição no solo nortista e romper a linha abissal é necessário o agrupamento das minorias, a união das pautas até onde for possível e gerar pressão para que as mudanças se operem.

NOME: ANTONIO JAIR DE SOUSA JUNIOR

TURMA: XXXVIII MATUTINO


 Michael W. McCann traz a perspectiva da Mobilização do Direito pelos movimentos políticos, transferindo seu local de atuação, solução, conquistas e derrotas para dentro do sistema de justiça. Desta forma, o Direito vai se tornando cada vez mais permeável às classes que antes o tinham apenas como legitimador de seu opressor. O caso analisado sob este pensamento é a Medida Liminar do STF contra a proibição da “Educação de Gênero” em Ipatinga, Minas Gerais. Nele, foi a possibilidade de acessos ao sistema jurídico e a tomada de consciência de seus direitos que permitiu que grupos da sociedade civil, mesmo externos ao mundo jurídico, identificassem a inconstitucionalidade da norma municipal e reconhecessem a capacidade de poderem revertê-la na Justiça. Foi a consciência sobre a possibilidade de ocupação deste novo campo de lutas que engendrou o requerimento de uma ação de extrema importância no contexto político, social e jurídico atual, quando uma onda de reacionarismo contrário às conquistas sociais das últimas décadas causou e intensificou diversos ataques contra os direitos das minorias e contra a ações que os promovessem, como o ensino crítico, com promoção de debates que ampliam visões sobre esta problemática.

 Desta forma, percebe-se como a mobilização do Direito para o atendimento de demandas como a defesa de grupos vulneráveis não é um enfraquecedor dos movimentos políticos, mas um grande e poderoso aliado para a melhora nas condições, sejam materiais, sociais ou legais, provendo o bem estar que tais lutas buscam. O reconhecimento jurídico dessas reivindicações também traz a sensação de consolidação dos direitos adquiridos, sendo, após instituídos ou ao menos citados na literatura jurídica, muito mais difíceis de serem retirados. O Sistema de Justiça faz parte do modelo democrático e a utilização dele pelos cidadãos comuns não é uma ameaça para este sistema, ao contrário, o fortalece. Seria anti-democrático permitir que ações como a norma municipal de Ipatinga - MG relativa à educação municipal permanecesse em vigor, já que esta é contra a pluralidade humana e fere diretamente a existência e o reconhecimento de grupos sociais, como os LGBTI+.

  A atuação dos tribunais frente aos conflitos políticos e sociais traça novas normas e formas de agir, seja socialmente ou juridicamente. Socialmente, pois o Direito é um reflexo da moral, cultura, ética e condutas de uma sociedade, ao mesmo tempo em que as molda. Portanto, cada nova criação, interpretação e aplicação de uma lei vai transformando suas convenções comportamentais, o que é aceito e o que é feito dentro dela. Desta forma, decisões judiciais favoráveis a grupos LGBTI+ vão pouco a pouco mitigando, junto dos movimentos sociais e da educação, as ações homofóbicas dentro da sociedade. 

 Da mesma forma, no campo jurídico, cada ação inovadora amplia o espaço dos possíveis, favorecendo futuramente decisões parecidas e facilitando o trâmite de outros processos de natureza análoga, pois pode ser utilizada como argumento e objeto de pressão. Assim, a pontuação do requerente, que diz “assemelham-se ao contido em leis de numerosos municípios brasileiros, o que comprova ameaça não apenas aos preceitos fundamentais mencionados, mas também à segurança jurídica” revela, por um lado, que a decisão do STF sobre esse caso específico abre caminhos para lidar com outras dezenas de semelhantes; e, por outro, que permitir que determinações anti LGBT, como as feitas em Minas Gerais, se espalhem e se normalizem jurídica e socialmente é tornar o problema cada vez mais grave e enraizado. 

  Assim como a decisão do STF abre precedentes para similares, ela também foi possibilitada por uma jurisprudência já anteriormente debatida e institucionalizada. O requerente pôde utilizar a Constituição Federal para apontar a ilegalidade da determinação do município de Ipatinga. Além disso, a norma municipal cita o Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/2014), declarando que ele será aplicado juntamente com a proibição da discussão sobre diversidade de gênero. Porém, tal essa determinação estaria em antítese com as próprias diretrizes do PNE, que estabelecem como função da educação a “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação, meta que é alcançada justamente com a promoção destes debates vetados pela lei municipal. Ou seja, novamente uma decisão anterior abriu caminhos para a derrubada de uma outra determinação que serviria apenas para o enrijecimento de estruturas supressoras da cidadania de uma parte da população e para a manutenção do status quo.





Sofia Moreira Pinatti 

As demandas de direitos e o papel dos tribunais

 Nos últimos anos temos observado o protagonismo dos tribunais e as mudanças de paradigma legal partindo do judiciário, o que muitas vezes pode parecer arbitrário ou fora das prerrogativas deste poder, na interpretação de alguns. Porém, devemos nos perguntar: quais as particularidades desse fenômeno e seus reais efeitos na sociedade? Qual seria o real papel dos tribunais? Caberia ao judiciário rever e historicizar as normas para corrigir o que é percebido pelos operadores do direito como disparidades sociais? Qual o papel do ativismo judicial e da judicialização nesse fenômeno?

Muitas dessas perguntas têm respostas disputadas e polêmicas, partindo de autores e vertentes do direito. Dentre muitos outros, podemos analisar esses fenômenos pela perspectiva de dois autores - Antoine Garapon e Michael McCann. Para Garapon, a ação do judiciário na concessão de direitos é o resultado da ação direta e muitas vezes individual de magistrados; já para McCann, os tribunais seriam apenas mais um campo de ação (dentre muitos outros) desse fenômeno, que tem sua base na ação de entidades que procuram no direito a resposta que não conseguiram no campo representativo e na mudança pelo voto.

Logo, para McCann, este uso do direito parte da ação de grupos e indivíduos, que procuram mudanças sociais e políticas, se entendendo como desprivilegiados pelos outros meios, nos quais não conseguem atingir o resultado que procuram. Assim, a ideia é que o sistema político e de participação falha e serve muitas vezes aos grupos dominantes, sobrando a esses movimentos e grupos o campo jurídico, onde seria possível agir pelo ativismo judicial e pela judicialização de questões que poderiam ser discutidas, primeiramente, nos parlamentos.

É notório que a busca do direito por esses grupos é legítima e que o acesso ao Direito não deve ser reservado apenas a grupos privilegiados e corporações com a capacidade de fazer o lobby jurídico. Porém, deve ser dada atenção às prerrogativas dos tribunais e os meios legítimos de mudança e ativismo social, para que não haja um desequilíbrio dos poderes e para que os pesos e contrapesos funcionem a fim de manter a estabilidade institucional.

Dessa forma, devemos buscar um maior acesso e representatividade na política representativa, assim como que os tribunais referendem questões que já estão presentes nas normas, reservando aos meios que possuem a prerrogativa de estatuir preceitos e estabelecer leis a exclusividade para tal.

Miguel F. C. Rodrigues - Direito NOTURNO - 2° Semestre

 O presente texto busca correlacionar a Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 6.987 com a sociologia jurídica de Michael W. McCann. A referida ADI é atinente à equiparação da injúria racial ao racismo, como crime inafiançável e imprescritível.

Primeiramente, para McCann, a abordagem mais adequada para o entendimento do poder dos tribunais na contemporaneidade é a abordagem institucional histórica. Em síntese, isso significa que, nessa perspectiva, a atuação dos tribunais deve ser compreendida à luz de “complexidades e contingências das diversas conjunturas políticas e contextos históricos”. Com efeito, um dos conceitos essenciais dessa linha de pensamento do pesquisador é o de mobilização do direito, isto é, uma demanda passa ao âmbito jurídico em uma ação ou um conceito próprio do Direito. Os “usuários” (sujeitos de direito) se mantêm no centro desse processo, mas utilizam o Direito como meio de concretização para seus fins. Essa mobilização acontece em dois níveis, que não são excludentes, mas, sim, complementares: na dimensão estratégica e na dimensão constitutiva.

No plano estratégico, pois não determinam as ações judiciais que serão geradas, mas apenas ajudam a traçar o panorama no qual essas demandas seguirão seu curso, dentro de todo um contexto sociopolítico que as engloba. Já o plano constitutivo, devido a sua colocação dentro do contexto social, apropriando-se, conforme judicializadas as demandas, de pautas e formando um vocabulário particular atinente a determinado tema que foi objeto de sua análise. Como dito por McCann, “os tribunais determinam e convidam membros da sociedade, indivíduos       , grupos, organizações a compartilhar um modo de ver, conhecer e falar”.

Na ADI previamente mencionada, todos esses aspectos podem ser observados. A mobilização do direito na dimensão estratégica, pois, ao equiparar a injúria racial ao racismo, isso molda as ações estratégicas do campo político em direção não somente a uma postura não-discriminatória, mas que luta ativamente e propõe ações contra as discriminações frequentemente observadas, como a do posto de gasolina. Também, no plano constitutivo, pois visa a responder uma demanda já existente de busca por reparação de danos históricos à população preta, conferindo a esse movimento uma nova roupagem por meio da linguagem jurídica. Nesse sentido, muito ilustrativo é o posicionamento do advogado Paulo Iotti, que sustenta a ideia de uma ofensa ao decoro do indivíduo (injúria) ser sempre uma ofensa à coletividade (racismo), de forma indireta

Assim, é possível concluir que o papel dos tribunais também, em certa medida, é de conferir ou restringir elasticidade aos conceitos, dado o panorama histórico em que está alocado. Mas, também, acaba por incitar movimentos estratégicos de grupos, em termos de recuos ou avanços em seus posicionamentos e propostas políticas. Com efeito, trata-se da dualidade e da amplitude da abordagem institucional histórica.

Isabela Mansi Damiski – matutino 2º semestre

O pensamento de McCann e a Bienal do Livro de 2019: a mobilização social gera impacto

 As ideias do professor Michael McCann pensam o Direito como um instrumento de mobilização social. De acordo com o pensador, há diversas narrativas em disputa no campo social e o Direito é um dos atores fundamentais que ajudam a construir novas perspectivas acerca das diversas realidades que constituem e estruturam o funcionamento das sociedades. McCann analisa, por exemplo, como os Tribunais têm sido cada vez mais as fontes detentoras e garantidoras dos direitos coletivos, pois o judiciário tem recebido fortes pressões que buscam pelo reconhecimento da importância de demandas e pautas populares que ainda são invisibilizadas das mais diferentes formas. Logo, o autor evidencia a existência de práticas arquitetadas por grupos sociais que necessitam de amparo jurídico e, assim, organizam-se e mobilizam-se para provocar impactos positivos tanto no meio social como no âmbito jurídico.


Para debater a ideia do autor à luz da realidade brasileira, é possível analisar uma situação chocante que tomou conta do país no ano de 2019: a proibição de vendas de uma HQ que possuía personagens homossexuais. O caso ocorreu durante a Bienal do Livro do Rio e causou grande polêmica, pois o prefeito Marcelo Crivella exigiu que uma determinada revista em quadrinhos fosse proibida de ser colocada à venda no evento, ameaçando a Bienal ao ponto de dizer que iria promover a cassação do alvará que permitia o funcionamento do festival cultural caso a HQ circulasse no espaço. A partir dessa atitude conservadora e retrógrada, o prefeito utilizou de seu cargo enquanto figura de poder público para impor censura a um material que não apresenta nenhum risco para a sociedade e seus indivíduos. Diante de uma posição com forte caráter homofóbico, muitos movimentos sociais que estão atrelados à proteção do direitos LGBTQIA+ se manifestaram publicamente de forma enérgetica contra a decisão de Crivella, pois todos entederam que a censura proposta estava enraizada em questões ligadas a posturas homofóbicas, machistas e autoritárias. 


Neste cenário de mobilização dos grupos contra a absurda posição do prefeito, percebe-se o fenômeno destacado por Michael McCan, pois encontra-se nesta situação a ideia de ‘’mobilização do direito como estratégia de ação coletiva’’. Após os inúmeros protestos e indignações, o desembargador Heleno Ribeiro Pereira Nunes, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro(TJ-RJ) posicionou-se de forma favorável à venda e circulação das revistas em quadrinho na Bienal e concedeu uma liminar para impedir que Prefeitura do Rio de Janeiro fizesse a apreensão das revistas em quadrinhos. Ao agir desta forma, o desembargador deixou claro que tal postura de caçar livros com a temática que trata de questões LGBTQIA+ é uma conduta que ‘’reflete ofensa à liberdade de expressão constitucionalmente assegurada’’.

Com as revoltas em torno do posicionamento da Prefeitura do Rio, é possível perceber que houve uma pressão social para que o judiciário se posicionasse e repelisse a conduta de Crivella, pois um debate que começou devido um conflito social chegou até a esfera jurídica, propiciando uma mudança positiva para pessoas de um grupo que historicamente vêm sendo marginalizados. Além do desembargador Heleno Ribeiro Pereira Nunes, o próprio STF manifestou-se contra a censura imposta e os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes foram enfáticos ao posicionarem-se diante do ocorrido, reafirmando que ações que atentam contra a noção de dignidade humana, não encontrarão espaço para sobreviver e prosperar na Corte. Assim, compreende-se que na tentativa de subjugar e silenciar uma pauta social tão importante como a relação de pessoas do mesmo sexo, Crivella e seu time do retrocesso acenderam de forma inconsciente um debate que reafirmou ainda mais a importância de valores pautados na dignidade, empatia e respeito a vida dos indivíduos LGBTQIA+. A polêmica em torno da censura imposta acabou trazendo para a discussão um fortalecimento que só foi garantido por meio da utilização do Direito como instrumento de mobilização para gerar impacto na vida desses grupos que ainda são discriminados, abrindo precedentes para que novos paradigmas fossem construídos sob a autenticidade da ação legal.




Pedro Oliveira Silva Junior

A MOBILIZAÇÃO DOS TRIBUNAIS E A LEI MARIA DA PENHA: ADC 19 E ADI 4.424, ASPECTOS PROCESSUAIS

 Os reflexos da dialética social que mobiliza o Direito perante as cortes podem ser observados mesmo quando a controvérsia reside em questões processuais.  Foi o caso da ADC 19 e da ADI 4424, que versaram sobre aspectos da instrução judicial nos crimes referentes a violência doméstica e familiar contra a mulher. 

Na ADC 19, o STF afirmou a constitucionalidade do dispositivo da Lei Maria da Penha que vedava a aplicação do procedimento sumaríssimo nos crimes dessa natureza, ainda que a pena cominada, tecnicamente, permitisse-o. Ou seja, ainda que presente requisitos que atraíssem para o caso a competência do Juizado Especial Criminal, a lei, e, em controle de constitucionalidade, o STF, reconheceram a relevância social da matéria, reservando tais casos à instrução mais meticulosa e abrangente do procedimento criminal comum. 

Já na ADI 4.424, foi decidido que lesões corporais resultantes de violência doméstica contra a mulher devem ser processadas por meio de ação penal pública incondicionada. Ou seja, havendo indícios dessa violência, o MP pode fazer a denúncia independentemente de representação da vítima.

Verifica-se, em ambos os casos, a mobilização do Tribunal frente a uma luta social que se institucionaliza. Essa mobilização é tanto indireta, em razão da mera existência da Lei Maria da Penha – cuja materialização eventualmente obrigou a Corte a se manifestar sobre –, quanto direta, evidenciada pela participação de entidades ligadas a movimentos sociais na ADC 19. De qualquer forma, ambos os julgados podem ser observados como a continuação de uma pauta social que tem como paradigma a edição da lei em tela.

No primeiro julgado citado, a mensagem é clara: ainda que determinada conduta possa ser classificada como de menor potencial ofensivo, dentro deste contexto – de violência doméstica contra a mulher –, ela não será assim processada. Já o segundo julgado, ao permitir que o MP não se condicione à representação da vítima, passam a ser objetos da lei os casos em que a situação de vulnerabilidade da mulher é tamanha que, mesmo diante de agressão, ela não se vê em condições de denunciar o agressor. 

Portanto, a atuação da Corte fortificou as disposições da lei em questão e ampliou seus mecanismos de proteção. Nos termos de Mc Cann, esse enquadramento legal mais severo opera em nível constitutivo, fomentando o repúdio à violência doméstica e encorajando denúncias. Também opera em nível estratégico, pois abre mais caminhos para que diversos atores possam levar eventuais agressões à apreciação judicial, que se processará ainda que a vítima não esteja em condições, por motivos de coação do agressor ou de qualquer tipo de vulnerabilidade, de representação. 

As decisões trazidas pacificaram divergências que existiam a respeito da aplicação da Lei Maria da Penha. Em ambos os casos, as decisões do STF foram ao encontro do caráter protetivo desse diploma, ampliando o alcance do Estado nos casos de crimes de violência doméstica contra a mulher, ainda que se tratasse de questões eminentemente processuais. Toda mobilização social que antecedeu e resultou na edição da Lei n. 11.340/2006, 6 anos depois, toma a via judicial na forma das ações trazidas neste texto. Essa dinâmica evidência que o fenômeno da judicialização não se inicia nos tribunais e nem se restringe a eles, mas é fruto de uma ação coletiva espontânea que, agora, busca outros caminhos, além do político, para a efetivação de direitos. 



Pedro Olivatto Zanutto


A Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 26 e a mobilização do direito como forma de reafirmação de direitos fundamentais

 Segundo Michael McCann, os precedentes judiciais podem exercer influência, direta e indireta, no relevo político-jurídico das formações sociais que integram. Seja fornecendo recursos simbólicos para determinada mobilização social, seja incentivando a formação de novos litígios, a atividade judicante estaria, direta e essencialmente, relacionada com a dinâmica social. 

Essa concepção, ao transcender a noção de que os cidadãos devem ser meramente tutelados por decisões e interpretações judiciais, coloca estes como sujeitos ativos da mobilização do direito. Seria a partir dessa mobilização do direito, realizada pelos próprios cidadãos, que o Direito se alteraria e (re)afirmaria demandas e direitos sociais. Ressalta-se, nessa análise, que as discussões sobre violações aos direitos fundamentais não partem, a princípio, da livre e espontânea vontade dos tribunais, mas são, na verdade, provocadas por aqueles atingidos pela violência, pelo preconceito, pela discriminação e pelo arbítrio, que socialmente se mobilizam para que suas pautas sejam reconhecidas e discutidas no âmbito jurídico. 

Como exemplo a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, em que se discutiu a omissão do Congresso Nacional ao deixar de editar lei que criminaliza atos de homofobia e transfobia. A imprescindibilidade dessa discussão surge pela mobilização da própria comunidade LGBT+ em denunciar a ausência de proteção penal aos integrantes do grupo, a vulnerabilidade e a violência a que estão histórica e constantemente submetidos. Nesse sentido, a mera realização do debate sobre determinadas práticas discriminatória, no caso a homofobia e transfobia, podem repelir condutas governamentais abusivas e reafirmar a intangibilidade dos princípios constitucionais, como a dignidade humana. 

Cabe evidenciar a observação do Ministro Celso de Mello, em seu voto no julgamento da ADO 26, sobre o significado da defesa da Constituição pelo Supremo Tribunal Federal. Segundo o Ministro, a prática da jurisdição constitucional, quando provocada por grupos minoritários e vulneráveis – mobilização do direito, não pode ser considerada um gesto de indevida interferência da Suprema Corte na esfera orgânica dos demais poderes. Ao adotar medidas que objetivam restaurar os princípios constitucionais, o Supremo Tribunal Federal estaria, nesse entendimento, demonstrando o respeito incondicional que tem pela autoridade da Constituição. 

Essa demonstração e (re)afirmação da possível efetividade dos direitos fundamentais pela prática da jurisdição é capaz, portanto, de influenciar a própria dinâmica social, incentivando a conscientização social sobre o tema, a não aceitação de práticas discriminatórias e violentas às minorias e, consequentemente, a própria ação coletiva. Não obstante, possibilita também que seja extraída das declarações internacionais e das proclamações constitucionais a máxima eficácia dos direitos humanos. 



Camila Marcelo de Toledo – Direito noturno – 1º ano



REFERÊNCIAS


BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação direta de inconstitucionalidade por omissão 26. Voto Ministro Celso de Mello. Brasília, DF: Supremo Tribunal Federal, 2019. Disponível em: *ADO26votoMCM.pdf (stf.jus.br)


MCCANN, Michael. Poder judiciário e mobilização do direito: uma perspectiva dos “usuários”. In: Anais do Seminário Nacional sobre Justiça Constitucional. Seção especial da Revista Escola da Magistratura Regional Federal da 2ª Região/Emarf, p. 175/195. 


 Toda ocupação do direito é boa? Não, mas na maioria das vezes as pessoas ou grupos

que tentam ocupar o direito tem boas intenções. Geralmente os indivíduos que pleiteiam um

lugar ao sol dentro do judiciário, busca a justiça ou a efetivação dos seus direitos, afinal

infelizmente num país como o Brasil, todos os dias milhares de cidadãos tem seus direitos

negados e suas vidas solapadas. Como dito, apesar da maioria das tentativas de ocupar o direito

sejam boas, sempre tem suas exceções, como no caso do Juiz da comarca de Franca; Charles

Bonemer Junior.

Em março de 2021, o ilustre e famoso juiz Charles, conhecido pelo seu “terraplanismo”

determinou uma liminar que concede autorização as casas lotéricas de se manterem abertas

durante aquele momento vivido pela pandemia. Bonemer na pratica derrubou o decreto

municipal do prefeito francano de aumentar ainda mais o lockdown, fechando as casas lotéricas.

McCann, um pesquisador que se debruçou sobre as questões dá ocupação do direito e dos

sujeitos que o ocupam diz; “Em poucas palavras, mobilização do direito se refere às ações de

indivíduos, grupos ou organizações em busca da realização de seus interesses e valores.”

Tendo essa ideia em mente posta por McCann, presumimos que Bonemer o próprio juiz,

ocupou e usou seu poder de magistrado para realizar seus interesses claramente motivados pelos

seus valores. É evidente que o prefeito fez um ato (decreto) em que nada foge de sua

competência como administrador municipal, entretanto para os conhecedores de Charles fica

claro que suas intenções não foram jurídicas, mas sim ideológicas; Ele ocupou o direito, no qual

ele mesmo é um dos que fazem o direito para atender os seus próprios fins. Uma clara

deturpação do que de fato deveria ser a ocupação do direito. Os argumentos postos em marcha

pelo juiz evidenciam suas rasas e “terraplanistas” motivações ideológicas. O magistrado

defende que lockdown é inútil, mesmo sendo adotado por todos os países desenvolvidos, e

insinua que a pratica de lockdown é coisa de comunista. Pior que tal afirmação sem sentido

ainda diz que o prefeito quer cercear direitos dos cidadãos usando “sob o enganoso pretexto de

“salvar vidas”’.

McCann acertadamente coloca que a ocupação do direito tem um nível estratégico ou

instrumental, novamente o “terraplanista” jurídico Charles Bonemer se enquadra nisso, fez do

direito (e do seu cargo) instrumentos de uma visão ideológica. Pautado em falsos pressupostos

que remetem ao tempo da guerra fria, época em que o Macarthismo estava em moda, e chamar

qualquer coisa de comunista (até mesmo coisas capitalistas) era visto como sensato. Charles

como um macarthista atrasado é o retrato da parte patética-ideológica de uma direita caolha,


“gengivuda”, no qual mesmo que use terno e toga se distancia da parte sensata da direita.

Infelizmente o sujeito no qual ocupou o direito, atuou com os mais escusos valores.



Joao Vitor Pereira de Oliveira- diurno

O uso do Direito nas pautas dos movimentos sociais

 O uso do Direito nas pautas dos movimentos sociais 


Uma paciente com “miocardiopatia isquêmica” e “hipertensão arterial pulmonar” recorreu ao Estado do Rio Grande do Norte para que fornecesse um remédio necessário para o procedimento terapêutico. Pois, em razão de seu alto custo, nem a paciente e nem a sua família tinham capacidade para adquiri-lo, ademais não era possível a substituição do medicamento. Entretanto, o pedido foi recusado pelo Estado, pois segundo este, extrapolaria os limites orçamentários do planejamento estatal, causando lesão à economia pública e, ao atender apenas a um indivíduo, as políticas de universalização do serviço de fornecimento de medicamentos seria comprometida, prejudicando assim os cidadãos em geral. Por meio de uma conscientização dos direitos sociais fundamentais expressos nas normas constitucionais, o caso ganhou repercussão geral e chegou ao Supremo para que este, pela falta do Estado, protegesse e promovesse efetivamente os direitos fundamentais.
Esse fenômeno é chamado de mobilização do direito, no qual os usuários do direito estrategicamente se valem de uma conscientização do direito e agem para efetivação deles diante dos tribunais. Foi na década de 50, nos EUA, que ganhou força o debate sobre a possibilidade de se alcançar mudanças sociais através do direito e do Poder Judiciário, quando a Suprema Corte americana julgou a segregação entre brancos e negros nas escolas do país como sendo inconstitucional. A partir disso, começou a ser considerado o uso do Judiciário nas pautas dos movimentos sociais, e o caminho para transformações sociais e políticas se tornou acessível e promissor. Milner diz que “Os direitos foram vistos como a chave para mudanças sociais. Os destituídos, silenciados e oprimidos poderiam conseguir justiça nos tribunais”. São diversos os conceitos de lei, mas acima de tudo é a lei que constitui o que entendemos por nossos direitos. E com base nisso, os grupos sociais atuam para a sua efetivação. De acordo com Zemans, “a lei é mobilizada quando um desejo ou necessidade se traduz em uma demanda ou afirmação de direitos”.
O endereçamento do caso do medicamento ao Judiciário mostra como este parece mais  acessível para a garantia de direitos, sobretudo em nível constitucional, do que o Legislativo ou Executivo, especialmente quando se diz respeito aos interesses das minorias. A partir disso, a decisão judicial do caso foi justamente na defesa da máxima efetividade dos direitos sociais fundamentais, principalmente por estar em jogo a dimensão do mínimo existencial, que consiste no direito às condições mínimas de existência humana digna. Desse modo, o direito individual à saúde em questão é imponderável frente aos argumentos dos limites orçamentários. Ainda foi acrescentado que “não cabe ao Poder Judiciário formular políticas públicas, mas pode e deve corrigir injustiças concretas”.

Luisa K. Herzberg 
2º semestre Direito matutino 
Turma XXXVIII

Homotransexualismo e Michael McCann

 Resumo do caso real: A PGR, em 2019, suspendeu liminar impetrada pelo TJ-

RJ para proibir venda e circulação e propunha a apreensão de livros infantojuvenis sob a

alegação de conteúdo homotransafetivo das publicações citadas supostamente danoso

para o público amparado pelo Estatuto da Criança e Adolescente.

Em sua argumentação a PGR defende que:

- o ato da prefeitura do Rio de Janeiro (cidade à época governada por Marcelo

Crivella) fere frontalmente a liberdade de expressão e o direito à informação, além de

ser discriminatório contra diversas pessoas por suas orientações sexuais e identidade de

gênero, além de ferir à CF em seus artigos 5 e 220;

- a ADI 4.275 reiterou que o direito à igualdade sem discriminações a liberdade

de identidade de gênero;

- há impossibilidade de invocação do ECA (Estatuto da Criança e do

Adolescente), pois o tema em questão não é agressivo a valores éticos da família;

- não cabe ao Estado definir previamente o que pode ou o que não pode ser dito

por jornalistas e indivíduos;

- existe irrestrito amparo dos tribunais a relacionamentos homoafetivos

(formação de família) e impossibilidade de definir como inadequados os conteúdos dos

livros, pois o artigo 79 do ECA trata de bebidas alcoólicas, tabacos e munições;

- a decisão do TJ-RJ relaciona que conteúdos homoafetivos seriam inadequados

à infância e à juventude.

A decisão do TJ-RJ causou reação contrária por parte de:


- Aliança Nacional LGBTI+ (https://www.metropoles.com/brasil/direitos-

humanos-br/entidades-lgbt-acusam-crivella-de-pratica-de-censura-e-homofobia) e;

- Felipe Netto, blogueiro e influencer que adquiriu vários livros e depois os

distribuiu.

É possível perceber relação da reação da PGR contra a decisão do TJ-RJ e contra

a ditatorial atitude do prefeito do Rio de Janeiro que mandou recolher, bem como as

reações de grupos, como a Aliança Nacional LGBTI+, com o texto de Michael

McCann, que trata de mobilização do direito como estratégia de ação coletiva. Vejamos:

- aumento da demanda por conhecimento de direitos e garantias individuais por

parte da sociedade, o que McCann interpreta como necessidade de advocacia

organizada. No caso da Bienal do RJ de 2019, a tentativa de censura por parte da

prefeitura do RJ (amparada por decisão do TJ-RJ) é tão indecente que parte da

sociedade reagiu, pois princípios democráticos são valores inegociáveis e os preceitos

do artigo quinto da CF é assunto sobejamente disseminado pela sociedade;

- fortalecimento da atuação de tribunais decorre de sociedades complexas, com

interesses diversos. O tema do já citado artigo quinto da CF e sua importância histórica

nas últimas três décadas é fator de atuação dos tribunais (no caso a PGR), especialmente

em um país saído de ditadura militar com ambiente de cerceamento de liberdades

coletivas e individuais;

- tribunais, apesar de reativos, são fundamentais para o funcionamento de

escolhas políticas de uma sociedade. A escolha política pela liberdade de opinião e de

organização familiar preconizada pela CF de 1988, foram escolhas da Assembleia

Nacional Constituinte de 1985-1988. A importância história de tal carta deve ser

preservada pelos tribunais. Isso é uma fortíssima opção de preservação pela estabilidade

do texto magno brasileiro;

- a reação contrária de grupos LGBTI+ à tentativa medieval prepretada por Pr.

Crivella de recolhimento de livros pode ser interpretada como o direito

instrumentalizado para reivindicações e mobilizações sociais. Ou seja, no texto de

McCann, o usuário dos tribunais (grupos LGBTI+) lançou mão do conceito do direito

como recurso de interação social e política, configurando a mobilização por direitos;

- a decisão da PGR em nível estratégico foi marcante, pois analisou a reação da

sociedade contra a decisão do TJ-RJ e em nível de poder constitutivo da autoridade


judicial também, pois ao suspender a proibição estadual apresentou visões

encorajadoras da defesa dos direitos e garantias individuais preconizadas pela CF;

- os precedentes legais considerados pela PGR, como a organização familiar

homoafetiva, intensificaram a demanda de retorno da circulação dos livros

supostamente ofensivos (interpretação do Pr. Crivella);

- decisão mostrou-se de destacado vigor democrático, pois ratificou preceitos da

carta maior de 1988 em seu artigo quinto.

- McCann destaca que no Brasil o maior poder dos tribunais pós CF-88 pode ser

explicado como maior acesso de partes mais vulneráveis socialmente ao direito, o que

pode aumentar a pressão sobre os tribunais por celeridades de decisões. Muitas vezes,

os tribunais podem silenciar-se para a massa de cidadãos comuns e que o status quo

nem sempre é instigado por provocações. No caso da Bienal do RJ de 2019, a

velocidade foi adequada. 



CURSO: DIREITO – Período Noturno

Disciplina: Sociologia do Direito

Ricardo Camacho Bologna Garcia – Número UNESP: 211221511