segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

A expansão dos conhecimentos jurídicos como asseguradora dos direitos sociais

    Boaventura de Sousa Santos, em “Para uma revolução democrática da justiça”, alude que, para se pensar em mudanças no que tange o campo do Direito, é necessário que haja a expansão do acesso à justiça e a transformação do ensino jurídico, colocando o Direito como um recurso disponível para acesso e mobilização da sociedade de maneira ampla e abrangente, de maneira a responder efetivamente às novas demandas sociais. Para que isso ocorra e o Direito aja como um instrumento contra-hegemônico, o autor aponta a superação da razão indolente, que limita as possibilidades de uma luta pela construção de alternativas democráticas que possam ampliar o espaço dos possíveis por meio do aproveitamento de experiências.

    Há, contudo, um dilema entre a juridificação da vida social e a qualidade da justiça, porque, com tal juridificação, tem-se o advento da morosidade processual, que resulta em tribunais sobrecarregados e, consequentemente, mais lentos. Essa morosidade se divide em sistêmica, que diz respeito à própria administração da justiça e sua burocracia - que é dividida em diversas instâncias, por exemplo -, e em ativa, que se refere às ações dos agentes estatais judiciais com ausência de impessoalidade e não personalismo para resolverem os problemas públicos, por falta de interesse ou engajamento com a causa apresentada. 

    O Estado que consegue operacionalizar bem a administração da justiça em razão da abrangência dos aspectos das questões sociais mais recentes, se conectando com os movimentos sociais para aumentar a igualdade, é conhecido como Estado com novíssimo movimento social. Para construir essa perspectiva minimamente emancipatória, tem-se algumas instituições, como a defensoria pública, promotoras legais populares, capacitação jurídica de lideranças comunitárias, assessorias jurídicas universitárias populares e a advocacia popular, que proporcionam a expansão do entendimento do cânone jurídico pela população que passa a interpretá-lo, a maior democratização o acesso ao Direito e a aproximação dos operadores da justiça com a realidade social, que os engajam faticamente às causas demandadas pela comunidade.

    Como um exemplo dessa democratização do acesso à justiça, que faz com que os indivíduos conheçam seus direitos e usufruam deles, pode-se citar a Ação de Obrigação de Fazer movida por uma mulher transexual que, em detrimento da ausência sofrida por ela por parte da saúde pública, reivindicou, da Fazenda Pública do Estado de São Paulo, em tutela antecipada,  a cirurgia de transgenitalização e a mudança do seu nome e do seu gênero sexual, de masculino para feminino, em seu registro civil. Com base nos preceitos fundamentais e constitucionais de liberdade, proporcionalidade, igualdade, privacidade, identidade, dignidade da pessoa humana e intimidade, além de toda a questão envolvendo a saúde psicológica da requerente, o pedido foi julgado procedente e o Estado foi incumbido de arcar com todas as despesas dos requerimentos.

    Assim, conclui-se que, em casos como o descrito, fica clara a importância da expansão dos conhecimentos jurídicos à toda a população, que pode agir pela efetivação dos seus direitos. Além disso, tal qual afirma Santos, percebe-se a primordialidade da aplicação da ecologia dos saberes jurídicos na pluralidade de possibilidades interpretativas para o reconhecimento das mais diversas particularidades da realidade social, que não deve se restringir à dogmática jurídica do Direito estatal.

Ana Eliza Pereira Monteiro - 2° ano Direito - Matutino


Nenhum comentário:

Postar um comentário