segunda-feira, 8 de novembro de 2021


 Quando a legislação vigente não consegue atender as demandas do povo, o recurso encontrado, atualmente, para a nossa sociedade, é recorrer ao judiciário. Com o grande crescimento dos movimentos sociais nos últimos anos, isso se tornou cada vez mais recorrente, pois apesar do modo de pensar da sociedade, e consequentemente suas demandas, muitas vezes nosso código não acompanhou tais mudanças. Assim, para Antoine Garapon, o “boom” das judicializações nada mais é do que uma consequência de um fenômeno político-social.

No entanto, apesar da judicialização ser tratada como uma espécie de remédio para os temas sociais mais polêmicos, como a comunidade LGBTQ+, o aborto, eutanásia, etc, os tribunais seriam mais um remédio paleativo do que um antibiótico, por assim dizer. Ao recorrer ao judiciário sempre que possível para resolver tais questões, acaba-se tirando o foco do próprio movimento social e, assim, não se caminha para uma mudança efetiva no imaginário social, que é onde os movimentos sociais devem focar para conseguirem mais direitos e menos discriminações de fato.

Um exemplo disso foi a decisão de colocar lacres escuros para que não fosse possível ver o beijo gay em uma capa de um quadrinho na bienal do livro em 2019, mesmo ano na qual houve a decisão do STF de criminalizar a homofobia. Assim como minorias podem recorrer ao judiciário para tentar garantir seus direitos, o contrário também acontece, e, muitas vezes, acarretam em decisões desfavoráveis à elas, já que juízes também são, afinal, pessoas, e possuem sua carga de preconceito. O caso do julgamento da censura da capa com o casal homoafetivo trouxe, no final, uma vitória à comunidade LGBTQ+ ao ser derrubada a decisão de censura, no entanto, isso não anula toda a comoção negativa que aconteceu durante a Bienal, todo o show de preconceito e histeria por conta de um simples beijo.

A judicialização é sim importante, ela impede que injustiças e ações movidas por puro preconceito, como a da capa do quadrinho, deixem de sair impunes. Porém, como demonstrado, às vezes o tiro pode sair pela culatra e termos um julgado que traz o movimento alguns passos para trás. Portanto, é importante que a possibilidade de se resolver pautas sensíveis por meio do judiciário não se transforme em uma película que embaça a visão dos movimentos e traz uma falsa sensação de segurança. A luta, antes de tudo, começa no dia a dia, de dentro para fora, para, assim, alcançar a nossa legislação.


Isabelle Carrijo Mouammar - Matutino

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