segunda-feira, 8 de novembro de 2021

A magistratura do sujeito no julgado relativo ao direito à cirurgia de transgenitalização


Segundo o jurista Antoine Garapon, a judicialização é um fenômeno político-social. Não se trata de uma questão interna do Judiciário. Para o autor, a crise do estado de bem-estar social – a qual configura-se como consequência do avanço do neoliberalismo – promoveu uma busca individual das pessoas pela efetivação de seus direitos, de modo que recorrem à justiça para tal. Nesse cenário, cabe ao Direito proporcionar amparo aos indivíduos, o que é denominado por Garapon de magistratura do sujeito.

Esse fenômeno pode ser observado na decisão tomada em 2013 pela Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Jales frente a uma petição para a realização de cirurgia de transgenitalização pelo SUS, além de mudança de nome e sexo no Registro Civil. Nesse caso, a parte-autora identificava-se com o gênero feminino, mas nascera com o sexo biológico masculino. Tal condição conferia-lhe prejuízos psicológicos, incluindo sofrimentos intensos e sintomas depressivos. Logo, é evidente que as demandas contidas na petição tratavam-se de necessidades relacionadas à sua saúde. Ela já havia iniciado em 2007 o tratamento no Hospital de Base de São José do Rio Preto, onde seria realizado o procedimento cirúrgico. No entanto, em 2009, a instituição interrompeu o acompanhamento médico, bem como informou que não mais realizaria a cirurgia. Ademais, a paciente não foi encaminhada a outro hospital onde o procedimento pudesse ser executado pelo SUS.

Sendo assim, tendo em vista as considerações acima, a vara tomou decisão favorável à petição, de modo a atender às demandas da parte-autora. O juiz tomou tal parecer uma vez que reconheceu o direito à identidade como um direito fundamental, e também como um direito humano. Logo, percebe-se que o caso ilustra perfeitamente as ideias de Garapon. A pessoa transsexual em questão encontrava-se desamparada em meio ao cenário político-social brasileiro e, por isso, precisou – para ter seus direitos efetivados – recorrer ao poder Judiciário. Nota-se que este, ao atender às suas necessidades, exerceu tutela ao indivíduo. Dessa forma, é evidente nesse processo a magistratura do sujeito.



Johann de Oliveira Plath - Matutino 

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