domingo, 21 de novembro de 2021

A influência das Marias: a sociedade e o Direito diante a violência de gênero

     O ano era 2006, e uma luta jurídica de 15 anos promovia a sanção da Lei nº 11.340, também conhecida como Lei Maria da Penha. A mulher que deu nome à lei, entretanto, já lutava há mais tempo: Maria da Penha Maia Fernandes esperou por justiça por cerca de 23 anos. Após sofrer duas tentativas de homicídio de Marco Antônio Heredia Viveros (seu marido na época) em 1986, ela ainda teve que esperar oito anos apenas para que o primeiro julgamento fosse realizado. Essa foi apenas a primeira negligência que Maria sofreu do Poder Judiciário, o que a levou a recorrer a um órgão internacional para que o Estado brasileiro passasse a agir com pelo menos o mínimo de competência.

Na visão de Michael McCann, essa situação foi uma mobilização do direito: a luta promovida por Maria da Penha e seus apoiadores deu impulso à criação da lei nacional que criminaliza a violência contra a mulher, ou seja, a necessidade manifestada pelas mulheres brasileiras promoveu uma mobilização no meio jurídico, que deu resultado à sanção de uma lei. A criação dessa lei, obviamente, teve uma grande influência na sociedade: tanto movimentos sociais quanto indivíduos que eram leigos sobre o assunto passaram a lutar contra essa violência, principalmente a doméstica, já que o governo passou a promover campanhas de conscientização e se comprometeu a não deixar tal crime impune. Pode-se dizer que essa influência foi de nível estratégico, definido por McCann como uma decisão dos tribunais que visa transformar o modo como a sociedade age diante tal assunto.

Apesar disso, a influência da sanção da Lei Maria da Penha também se estende a outro nível: o nível constitutivo. Segundo McCann, esse nível de influência de uma decisão judicial se estende à cultura, ou seja, quando o modo de agir dos tribunais acaba sendo adotado pela consciência popular. No caso da Lei Maria da Penha, pode-se dizer que parte da população brasileira tem a violência doméstica como algo a se repudiar e denunciar, o que é um grande feito considerando que o machismo ainda é vivo na sociedade.

Um exemplo prático da influência construtiva da Lei Maria da Penha pode ser o ocorrido no reality show “Big Brother Brasil”, em 2017, em que um participante foi expulso após abusar psicologicamente de sua parceira através de gritos e manipulações. No 7º artigo da lei, ao listar quais são os tipos de violência que a mulher pode sofrer, a violência psicológica é explicada e listada como crime. Com base na mobilização do público para que o participante fosse punido, pode-se dizer que atualmente a violência psicológica citada na lei também é repudiada pela população, que conseguiu a identificar e repudiá-la.

Sendo assim, é possível notar que a decisão de sancionar a Lei nº 11.340 é uma prova do quanto aquilo decidido nos tribunais tem um grande poder sobre a vida dos indivíduos de uma sociedade. Nesse caso em específico, ainda é possível notar uma influência de nível estratégico e constitutivo. Apesar da grande influência positiva que a lei teve na população brasileira, também é importante ressaltar que ainda há muito a se mudar, visto que a violência contra a mulher está longe de se tornar passado no Brasil.


Camilly Vitória da Silva - Direito noturno, Turma XXXVIII, 2º semestre

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