domingo, 17 de outubro de 2021

A perspectiva de Bourdieu no ocorrido da Bienal do Rio De Janeiro em 2019

     Em 2019, o prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella mandou recolher todos os livros que tivessem conteúdo sobre “homossexualismo” destinados para o público jovem e infantil e embalá-los com plástico preto. O ocorrido gerou grandes debates e indignação por parte das pessoas, sendo revogada pelo ministro Dias Toffoli tempos depois.

    O sociólogo Bourdieu traz pontos que ajudam a compreender tanto o caso, como a medida cautelar redigida pelo ministro para a revogação. O primeiro ponto a ser analisado é o conceito de habitus, que é adquirido dentro da classe social e leva os indivíduos a certas escolhas e aspectos sobre a vida. Essas convicções adquiridas foi o que levou à proibição dos livros, dado que o art. 79 do Estatuto da Criança e Adolescente coloca que livros destinados a essa parte da população que tenham conteúdos que violam os valores éticos e sociais das pessoas e famílias, devem ter seus temas especificados na capa. Dessa forma, como escreveu Toffoli, a notificação realizada pela Administração Municipal do Rio de Janeiro foi pelo interesse público, os princípios da família considerada a “tradicional brasileira”, que por terem bastante influência no governo, influenciaram na criação da restrição. O habitus dessas pessoas que iam contra algumas temáticas que estavam sendo veiculadas na bienal os fizeram ter essa ação.

    Além disso, foi na lei que encontraram amparo para as suas convicções, o espaço dos possíveis junto a hermenêutica os fizeram interpretarem a última parte do artigo citado a favor de seus valores, visto que dava brecha para tal. As fontes do direito, em alguns termos, estavam de acordo com as convicções das pessoas mais influentes. Porém, como Toffoli coloca em sua medida, o casamento entre pessoas do mesmo sexo está previsto em lei, assim como a sua orientação sexual. Desse modo, a decisão da prefeitura ia contra os direitos dessas pessoas, tendo o espaço dos possíveis contra a decisão, dado que essas fontes não permitiam tal comportamento, mesmo com a interpretação do artigo sobre os valores da família.

    Também, é possível perceber que o ministro entende as razões por trás da ordem feita pelo prefeito: um risco de lesão à ordem pública, o que evidencia suas perspectivas, uma lógica normativa da moral. A lógica normativa da ciência do Direito se sobrepôs devido ao âmbito do julgado, entretanto, percebe-se que há a junção das duas visões na medida redigida. Bourdieu discorre dessa forma sobre a dinâmica do Direito, dado que nas decisões irá sempre ter a visão do legislador, pois esse saber não é neutro, tendo influências, tanto internas como externas, da mesma forma que ocorreu na medida feita por Dias Toffoli.

    À vista disso, compreende-se que a medida redigida pelo ministro Dias Toffoli contra os atos feitos pela Administração do Rio de Janeiro tem grande relação com a ideia de Bourdieu, no habitus das pessoas que influenciaram na decisão, no próprio texto, que evidencia as aspirações do juiz e do Direito e na própria ciência jurídica e suas limitações.


Camila Gimenes Perellon - Matutino

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