domingo, 23 de agosto de 2020

O Materialismo Histórico Dialético em 2020

No panorama mundial do trabalho do século XXI, devido a flexibilização dos direitos trabalhistas e terceirização dos serviços, estimulados pela ideologia neoliberal, pela globalização e pela noção de acumulação flexível, isto é, produzir conforme a demanda do mercado consumidor, abriu-se espaço para o surgimento de empregos sem vínculos empregatícios. Em consonância, elevou-se a maior propensão desses trabalhadores à exploração, como é o caso dos entregadores de aplicativo, uma nova classe de trabalhadores surgido com os aplicativos de smartphones. Devido a constante situação de incerteza e de risco existente nas sociedades atuais, justamente pelo medo do desemprego, a necessidade de trabalhar e a extrema desigualdade social existente no Brasil, são fatores contributivos para que muitos se submetam a empregos sem vínculos empregatícios e, dessa maneira, sem direitos trabalhistas. Isso acaba por gerar a exploração desses trabalhadores, devido a necessidade do aumento das horas de trabalho para se conseguir uma boa remuneração.

Foi nesse sentido que em julho de 2020, entregadores de aplicativos realizaram duas greves nacionais que ficaram conhecidas como Breque dos Apps em busca de melhores condições de trabalho e de direitos trabalhistas. As péssimas condições de trabalho e de exploração a que essa classe de trabalhadores já estava submetida foi potencializada ainda mais pelo contexto atual pandêmico de covid-19, tendo em vista a queda do número de entregas e, desse modo, da remuneração desses entregadores de aplicativos1. Além disso, o risco à saúde foi também ampliado nesse contexto de pandemia.

Como demonstrado pelos estudos sobre o funcionamento do sistema capitalista pelos sociólogos Karl Marx e Friedrich Engels no século XIX, o capitalismo é um sistema econômico marcado por extremas contradições. Baseado na obtenção do lucro, esse sistema se sustenta pela classe proletária vendendo sua força de trabalho para os donos dos meios de produção em troca de um salário. Assim, por meio do conceito de mais valia, em que a partir do excedente produzido pela exploração do proletariado a burguesia retira o lucro, bem como pela dinâmica das relações de consumismo na sociedade capitalista, há a detenção da maior parte das riquezas para os burgueses, o que reproduz e sustenta a desigualdade social. Sobre essa perspectiva e no contexto do ano de 2020, enquanto os entregadores de aplicativos lutam por direitos trabalhistas e melhores condições de trabalho, os super-ricos brasileiros tiveram um crescimento de 34 bilhões em seus patrimônios durante a pandemia, segundo a ONG Oxfam2.

            Dessa maneira, é evidente que a pandemia de covid-19 contribuiu para aumentar ainda mais a desigualdade social já existente na sociedade brasileira, bem como evidenciou o extremo grau de individualismo e desumanidade por parte de muitos indivíduos. Por fim, como última reflexão, percebe-se o Materialismo Histórico Dialético, método de análise sociológica desenvolvida por Marx e Engels sobre como a vida social nas sociedades capitalistas estão condicionadas às relações de produção e classes sociais, materializadas pelo seu tempo histórico, no ano de 2020: a burguesia criou o mundo a sua imagem e semelhança3.

 

André Luiz Gonçalves Primo – Direito Matutino

 

REFERÊNCIAS:

1VIEIRA, Bárbara Muniz. Entregadores se unem por melhores condições de trabalho nos aplicativos: 'Entrego comida com fome', diz ciclista. G1 SP, São Paulo. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/06/21/entregadores-se-unem-por-melhores-condicoes-de-trabalho-nos-aplicativos-entrego-comida-com-fome-diz-ciclista.ghtml. Acesso em: 20 ago. 2020.

2Patrimônio dos super-ricos brasileiros cresce US$ 34 bilhões durante a pandemia, diz Oxfam. G1, [s/l]. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/07/27/patrimonio-dos-super-ricos-brasileiros-cresce-us-34-bilhoes-durante-a-pandemia-diz-oxfam.ghtml. Acesso em: 20 ago. 2020.

3MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto Comunista. Londres: fev. 1848.

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