sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Exegese da apropriação marxista diante do velado conflito de classes presente em "Vida de Inseto"

            Uma das clássicas obras cinematográficas da Pixar, “Vida de Inseto” (1998) tem como enredo a representação de uma colônia de formigas, as quais precisam coletar alimentos para elas e, também, para os gafanhotos, sob ameaça de ataque dos mesmos caso não o fizessem. Entretanto, Flik - uma das formigas operárias que quer ser inventor –, acidentalmente, ao testar uma de suas criações, faz com que toda colheita daquele ano seja perdida ao derrubá-la no rio. Cansado da relação abusiva dos gafanhotos, Flik após ser expulso do formigueiro, sai em busca de outros insetos com intuito de combater os opressores. Nesse sentido, apesar de se tratar de uma animação infantil, observa-se na mesma, metafóricos princípios contidos na ideologia proposta pelos alemães Karl Marx e Friedrich Engels e elementos que permitem, até mesmo, a compreensão da lógica marxista acerca da relação de trabalho por autores hodiernos como Richard Sennett.

            De início, cabe-se enfatizar a comum associação das formigas como alegoria ao operariado, traço evidenciado principalmente através das fábulas. Assim, percebe-se a presença da luta de classes – o motor da História – no reino animal de Flik, no qual o formigueiro descreve o papel do proletariado oprimido pelos gafanhotos (alusão a classe dominante de capitalistas). Tal antagonismo é ressaltado pelo fato de, na animação, as formigas terem como objetivo a coleta apenas do necessário para o consumo durante o inverno, em contraste aos gafanhotos que visavam o acúmulo de alimentos – “lucro” – e sua ostentação, como demonstrado na cena onde o líder Hopper exibe a sua abundante coleção de castanhas.

            Ademais, segundo a percepção de Richard Sennett, é possível inferir que a forma de ser fordista expressa a forma de ser dominante. Desse modo, a forma de organização da colônia das formigas é quase uma referência a mecanicidade fabril exigida no modo de produção sistemático do capitalismo. O personagem alegórico de Flik pode ser entendido como o ente primordial da revolução “proletária” iniciada pela união das formigas contra os gafanhotos, as quais conseguem derrubá-los do poder e estabelecem uma comunidade nos moldes do socialismo científico, consagrado pela emblemática fala de Flik no filme: “Basta de exploração!”

            Além disso, pode-se ressaltar que no materialismo histórico dialético, tese bem enfatizada por Marx junto da totalidade, é perceptível analisar que as relações produtivas inferem na organização da vida social e da composição estatal. Esse processo, depois interpretado por Sennett desenvolve-se na abordagem de que o tempo da produção infere no “tempo da vida”. Isso pode ser observado em “Vida de Inseto”, uma vez que a passagem temporal perceptível do formigueiro é marcada pelo período entre uma colheita e outra, o que também remete a terminologia de Marx da alienação do processo produtivo e de consumo.

            Torna-se claro, portanto, a importância da teoria marxista e engelsiana tanto no meio ficcional quanto na realidade hodierna. Em uma sociedade moderna na qual preza-se cada vez mais pelo individualismo em detrimento do coletivo, é essencial destacar os ideais proferidos na ideologia alemã a fim de estabelecer uma totalidade – rede de relações perante diversos fenômenos que se configura em constante mudança – mais igualitária e justa. Por fim, tal qual Flik para diminuir a exploração consequente e assídua do capital é preciso invocar, na prática, a consciência de que se a classe operária (ou formigueiro) produz, a classe operária pertence.

    Luana Lima Estevanatto – 1º ano Matutino

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