segunda-feira, 28 de outubro de 2019

A perda das origens frente a diatópica fundamentação cultural

Desde o "descobrimento" da ilha brasilis, o choque cultural é apresentado na sociedade que fora sendo constituída. Desde os mandos do Rei às incursões jesuítas, da angelical constituição dos índios à alma branca dos negros; a religião é protagonista na luta cultural e na história publicitada, a história dos vencedores, segundo Boaventura de Sousa Santos. Dentre as inúmeras frutificações de tal luta, a mais agressiva é quase forçosamente enraizada ao público pela sociedade dominante. O Brasil é um país católico. Das afirmações e justificações que seguem tal excerto, uma questão chega ao Supremo Tribunal Federal: a que ponto o ensino religioso abate as premissas constitucionais? E em viés mormente sociológico, a que ponto a religião central amortiza as outras disposições culturais?
Em primeiro lugar, a fim de se abordar as dissertações puramente judiciais da dialética religiosa. A ADI 4439 busca encontrar dispositivos legais para imputar inconstitucionalidade por sobre ferramentas de ensino religioso que não contemplem o plano não-confessional, ou seja, sem vínculo a religiões específicas ou profissionais partidários de uma só religião; apresentação das religiões de forma pluralista. Para fundamentação de tal defesa, foram elencados: o art. 11° do Decreto nº 7101 contemplado entre a República do Brasil e a Santa Sé, o qual entre outras palavras assenta a defesa pela confessionalidade plural das diversas religiões (embora haja a priorização do catolicismo na redação do próprio artigo: "católico e de outras confissões religiosas" ) e a importância do ensino religioso, plural, na constituição da pessoa humana; o caput do art. 33º da Lei 9394/96, a qual fundamenta a formatação da educação brasileira, que fundamenta o ensino religioso como parte integrante da formação base do cidadão, sendo ele respeitoso à diversidade cultural religiosa. Por fim, ainda pode-se assegurar a inconstitucionalidade do ensino religioso confessional por meio do art. 210º, § 1, da CF, que defende a existência de conteúdo religioso na educação fundamental que respeite a forma multifacetária da cultura no país.
Por outro lado, a fim de se discutir acerca da abordagem sociológica da discussão judicial apresentada. O professor catedrático da Universidade de Coimbra, Boaventura de Sousa Santos, disserta acerca da face emancipatória atual dos Direitos Humanos. Nas profundidades de sua tese, o sociólogo apresenta o protagonismo da defesa de tais direitos como uma tentativa de superação do Socialismo frente a sociedade organizada. Dentre os muitos conceitos apresentados, há o de Localismo Globalizado, ou seja, um elemento cultural presente em uma nação imperialista que é apresentado às nações satélites como argumento de globalização, busca por igualdade e incisão de direitos. A partir de tal análise, podemos assegurar o catolicismo como tal dispositivo, o qual foi abraçado pelo Brasil - mesmo sendo para ele um Globalismo Localizado, a parte destinatária do Localismo - e profundamente defendido por esse país como ferramenta de sua identidade, mesmo tendo em sua origem uma cultura e religião totalmente diferentes. Ao ignorar-se as origens, os crimes são defendidos como ferramentas de união. Ademais, tomando o conceito de topoi de Sousa Santos, o qual seria um lugar comum retórico mais abrangente de determinada cultura, ou seja, o ambiente indiscutível de tais valores, chegamos a necessidade da hermenêutica diatópica, uma interpretação neutra capaz de sopesar os limites da invasão do topoi cultural por meio dos Direitos Humanos.
Portanto, a fim de se trazer tais ferramentas à realidade brasileira, o argumento de se elencar a religião cristã como baluarte de educação moral e protagonista do ensino da igualdade ao brasileiro encontra impasse em relação ao respeito a multicultural nação brasileira. O topoi das religiões de matriz africana é intocável ao cristianismo e às incursões viciadas do Estado sob premissa de embasamento moral da nação. A diatópica forma de se avaliar o ensino em uma nação é o segredo para se manter os limites da liberdade cultural bem como dividir equitativamente a profundidade dos topos da efetivação dos Direitos Humanos e da defesa dos patrimônios culturais.

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