domingo, 18 de agosto de 2019

Na democracia brasileira, é comum temas controversos presentes na sociedade brasileira causarem discussões no âmbito jurídico. Um grande exemplo disso é a ADPF 54, julgada em 12/04/2012, que tratou da questão do aborto de feto anencéfalo e até hoje gera embates em diversas instâncias do meio social.
Por maioria, a decisão dos ministros foi de descriminalizar o aborto nas condições citadas, gerando muitas divergências no meio social. Como se sabe, há muito tempo o aborto permanece como um tabu presente na sociedade brasileira, já que coloca em conflito diferentes correntes sobre o que seria a vida. De acordo com a visão religiosa, por exemplo, a vida se caracteriza a partir da concepção, "condenando" qualquer prática abortiva. Essa visão causa confrontos quanto à questão dos anencéfalos, já que para os religiosos qualquer embrião já se torna vida independentemente de seu desenvolvimento, enquanto que para a ciência a anencefalia caracteriza uma condição sem opção de cura e sem esperança de que o ser sobreviva mais do que alguns dias, no máximo.
Vemos, portanto, uma divergência entre diferentes perspectivas que cabe ao Direito solucionar. Destaca-se, nesse quesito, a teoria de Pierre Bourdieu, que aponta que o Direito deve possuir certa autonomia, baseando-se em seus próprios princípios e formas para tomar decisões. Fecha-se, portanto, na hermenêutica jurídica capaz de julgar os aspectos relacionados à proteção da vida e à descriminalização do aborto. O Direito, dessa forma, mostra-se suficiente para regular temas que permeiam a sociedade.
Há, entretanto, de se fazer ressalvas quanto a esse 'formalismo' observado em certas ocasiões (como a do julgamento citado). É necessário que se destaque o fato que tanto os ministros que votaram a favor quanto contra a liberação do aborto de feto anencéfalo utilizaram como argumento a dignidade da pessoa humana (alterando somente quem era o possuidor dessa dignidade a ser defendida). Vê-se, então, traços de arbitrariedade presentes no âmbito jurídico, que podem justamente corromper o aspecto formal da teoria de Bourdieu, já que o Direito deve se apoiar em seus princípios e normas, e não nas concepções morais dos juízes e demais juristas. Logo, devemos buscar um correto balanceamento entre tais fatores para construirmos uma base jurídica mais sólida e justa.

Gustavo Felicissimo - 1° matutino

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