sexta-feira, 10 de novembro de 2017

O Direito diante das metamorfoses do mundo do trabalho

        Na Semana Jurídica (2017) da UNESP enfatizaram-se noções fundamentais sobre o movimento de reformulação do Direito trabalhista e previdenciário no Brasil encabeçado pelo governo federal e que se enquadra dentro do âmbito de modificações do Direito e da sociedade como um todo, pelo menos nos países ocidentais. Ressalte-se, com isso, que reformas no mundo do trabalho não são exclusivas do Brasil nos tempos atuais, na Espanha em 2013 também foi realizada uma reforma previdenciária que elevou a idade mínima para a aposentadoria. Inicialmente, o Doutor Kleber Cabral em sua alocução acerca da reforma previdenciária brasileira demonstrou que a temática em questão possui um leque de análises que podem ser inferidas a respeito. Em primeiro lugar, no que tange à abrangência de formas que o sistema previdenciário possui ao redor do mundo, fato que deve ser levado em conta para o entendimento que se deve ter da reforma em curso no Brasil. Assim como salientou o palestrante, os sistemas previdenciários no mundo distinguem-se por sistemas desiguais, os de capitalização, repartição e capitalização referencial. Para compreender, assim, a reforma da previdência brasileira há fatores diversos que devem ser salientados dentro do mundo do Direito correlacionado com a realidade fática.        
       Objetivamente, como revelou o palestrante, cabe fazer uma análise tridimensional para a apreciação do sistema previdenciário, para tanto, devem ser considerados: a conformidade social- o quanto a previdência social atende a dignidade da pessoa humana assegurada pela constituição-, a sustentabilidade- viabilidade financeira do sistema- e a questão da normatividade- o quão eficiente são as leis que regem o sistema e sua efetividade. Ora, a questão que se apresenta hodiernamente é: o governo federal argui a insustentabilidade do sistema previdenciário, o que comprometeria a sua conformidade social e, por conseguinte, a efetivação das normas previdenciárias. Qualquer análise deve considerar esses fatores de modo conjunto e nunca isoladamente. O que se verifica, entretanto, é que tanto os defensores quanto opositores da reforma em curso salientam pontos específicos desse entendimento: os primeiros ressaltam que a sustentabilidade do sistema estaria em risco e os segundos o suposto ataque que seria feito ao critério da conformidade social. Pelo que se pode concluir, a presença do Direito na previdência social deverá valer-se de critérios que transcendem a pura tecnicidade da norma, mas terá de compreender os substratos fáticos existentes.
        Relativamente às demais mudanças por que passa o Direito no mundo do trabalho, cabe lembrar o entendimento da Doutora Patrícia Maeda, juíza do trabalho, que, também em palestra na semana jurídica do presente ano, assinalou pontos fundamentais acerca das reformas liberalizantes em curso no Brasil especialmente na área do Direito trabalhista. Dois pontos fundamentais de sua palestra que cabem destaque: o caráter social e protetivo do Direito trabalhista e o viés ideológico presente na reforma trabalhista e na lei de terceirização. Primeiramente, quanto a este último tópico, lembrou a palestrante a noção basilar que circunda as noções da liberalização das relações de trabalho: um espectro ideológico neoliberal de cunho muito presente na década de 1990. O discurso em prol da reforma trabalhista utiliza-se de jargões característicos do período supracitado como as ideias de modernização, aumento da liberdade contratual, geração de empregos e aumento da capacidade empreendedora e da valorização pessoal. Desse modo, há de se convir que o discurso ideológico deve sempre ser levado em consideração na linha argumentativa que se vise quando se trata desse tema. A década de 1990 foi caracterizada, não só no Brasil, mas internacionalmente por tentativas de liberalizar os sistemas trabalhistas.
         Isto posto, também foi crucial a lembrança feita pela palestrante da índole eminentemente protetiva do Direito do Trabalho. Em muitas das vezes em que se pretende flexibilizar as relações entre empregados e empregadores, tenta-se transmitir a ideia de que se está a incentivar a liberdade contratual equiparando o poder de decisão das partes. Ora, como foi dito, o caráter protetivo do Direito do Trabalho, como salientou a palestrante, desenvolveu-se justamente por se considerar que há uma parte com menor poder de decisão nas relações de trabalho, que é justamente aquele que é empregado. Neste quesito considera-se o princípio da proteção à parte hipossuficiente, premissa basilar para a existência do próprio Direito do Trabalho, do contrário o que se teria seria a subversão do Direito trabalhista que considera sim que há uma relação assimétrica entre as partes. Eis, pois, as precauções de que o Direito se ocupa em ter visado dar igual capacidade na negociação entre as partes garantindo à parte hipossuficiente direitos sociais próprios de sua condição. É nesse sentido que segue a controvérsia envolvendo a terceirização, por tratar-se de uma modalidade de contratação em que não há duas partes envolvidas apenas, mas há uma parte intermediária o que pode tornar-se um empecilho na aplicação das garantias trabalhistas.
      A partir do exposto, é conclusivo considerar que as reformas previdenciária e trabalhista, em fase de implementação no Brasil, devem ser reputadas sob dois aspectos fundamentais: a multiplicidade de perspectivas que envolvem a temática e suas distinções ao redor do planeta, como salientado pelo Dr. Kleber Cabral acerca da reforma previdenciária, e o traço marcadamente social que orienta essa linha do Direito conforme revelado pela Doutora Patrícia Maeda. Assim, o que se deve ter em mente é que a discussão ao redor de ambos os temas deve ser calcada por: não isolar a análise do tema a um campo específico e considerar como fator prioritário a qualidade protetiva dessa área do Direito, pois, por óbvio, na escala de valores, o direito à dignidade humana superpõe-se a quaisquer outros. É nesse sentido que se concluem os fundamentos que devem perfazer a discussão de ambas as reformas, quais sejam, os fundamentos do próprio Direito acerca do qual elas versam.

Gustavo de Oliveira- 1º ano noturno



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