segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Há muito do que se pode refletir e observar na estrutura jurídica brasileira sob as perspectivas de Bourdieu. Atentando-se primeiramente a um sintético apanhado teórico, podemos observar neste pensador um distanciamento e crítica ao extremo instrumentalismo marxista e ao formalismo acentuado que se evidencia na Teoria Pura do Direito de Kelsen, de forma que o campo jurídico considere ambos estes aspectos, constatando que apesar de certo distanciamento entre direito e sociedade em decorrência de seu formalismo, há também certa aproximação e influência do meio social ao direito, não apenas considerando a realidade material mas o poder de influência do capital simbólico. Desta forma constitui-se um campo que munido de certa estruturação que o legitima atrelado a uma constatação interna do pode ou não ser objeto de discussão e julgamento dentro do direito, o espaço dos possíveis.
Dentro desta lógica encontra-se boa parte das ações do STF ao longo da última década, entre elas está o entendimento de que não há crime na prática do aborto nos casos em que há anencefalia do feto, uma vez que este não teria possibilidade de vida após o nascimento. Esta decisão foi extremamente polêmica, tendo em vista a clivagem social originada por esta decisão que ascendeu o embate entre as pautas da luta feminista em busca da conquista direitos historicamente negados à mulher e os movimentos anti-aborto pautados majoritariamente em uma moral religiosa cristã (e gerido por lideranças religiosas e seus fiéis). É nesse momento interessante observar o como pôde o direito aproximar-se de certas reivindicações de um grupo oprimido, e dentro do que havia de possibilidade em seu campo, decidir de forma a ampliar os direitos deste.
Vivemos hoje, uma ascensão de pautas conservadoras e reacionárias, dos mesmos grupos citados anteriormente no texto, que objetivam claramente a retirada de direitos da mulher e de sua autonomia em relação ao seu próprio corpo, um exemplo claro disso encontra-se em parte da pec 181 que se aprovada criminaliza o aborto até mesmo em casos nos quais a mulher tenha sido vítima de estupro. Não creio que há prudência em exercer previsões acerca dos rumos a seguir futuramente pelo direito, porém constato que a observação da teoria de Bourdieu se faz um bom caminho a ser tomado na travessia de tempos nebulosos como este.

Leonardo Grigoleto Rosa - Noturno

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