segunda-feira, 30 de outubro de 2017

O Poder Judiciário na perspectiva atual: um poder Moderador disfarçado?

Ultimamente, o Brasil está permeado em uma longa crise político-econômica, motivada pela adoção de uma série de medidas econômicas desastradas, pela ausência de representatividade política, pelos recentes escândalos de corrupção, pelo colapso dos serviços públicos, pelo aumento dos impostos e pela alta taxa de desemprego e de falência das empresas; consequentemente, impulsionando o descrédito da população perante as instituições dos poderes executivo e legislativo e o pessimismo em relação ao fim da crise. Contudo, um terceiro poder, ao contrário dos demais, não só goza de bastante prestígio, como também é apontado pelo clamor popular como o solucionador de todas as mazelas que nos aflige: o poder Judiciário. Nem que para isso, ele exceda as suas atribuições prescritas pelo ordenamento jurídico, mas que faça “justiça”, e com uma simples “canetada” dê um desfecho aos complexos problemas atuais.
No entanto, a partir da difusão dessa ideia e com o Judiciário reconhecendo-se como legítima vanguarda da moral e da razão, devido à “honorabilidade” e “intelectualidade” de seus membros, sedimenta-se um novo entendimento acerca do limite das suas competências, bem como das suas interpretações jurídicas, já não tendo mais como pedra angular a Constituição da República, mas sim diversos princípios imbuídos na comunidade internacional, oriundos da declaração universal do direito dos homens, como o da dignidade da pessoa humana, o da solidariedade, o da igualdade. Desse modo, iniciam-se numerosos casos de ingerência judicial na seara executiva e legislativa travestidas sob o eufemismo de “ativismo judicial” , impondo a estes poderes o acatamento de políticas públicas dos mais variados tipos ou mesmo a suspensão de outras já tomadas, pelo simples argumento de intérprete constitucional e tutor dos direitos fundamentais, numa clara afronta à separação de poderes prescrita no arcabouço jurídico, usurpando para si funções para as quais não foi eleito e nem será responsabilizado em caso de fiasco e prejuízo à sociedade. Exemplo disso é a judicialização da saúde, por meio da qual inúmeros pacientes entraram na justiça para garantir o recebimento de remédios que estavam em processo de fornecimento ou foram negados, em consequência disso surgiram três problemas graves para o sistema de saúde: a quantidade de pessoas que por ter uma assessoria jurídica furam a fila do SUS, enquanto as demais que não têm esse acesso têm que esperar mais tempo, mesmo que tenha solicitado esse medicamento antes do paciente postulante, ferindo o princípio constitucional da isonomia; deteriora-se mais ainda o precário orçamento dos sistemas regionais de saúde, pois o gestor local é obrigado a atender uma demanda onde muitas vezes não há receita para cobrir esse custo, culminando na falta de medicamentos básicos como analgésicos para providenciar um tratamento oneroso, sobrepondo os interesses individuais aos coletivos; por fim, o mais grave, é a prescrição, por ordem judicial, de medicamentos que muitas vezes não possuem a homologação da ANVISA, podendo acarretar sérios riscos à saúde do paciente, vide o caso da pílula do câncer, que bem antes de ter sua autorização por lei – lamentada por especialista –,  já era concedida judicialmente.
Sob outro prisma, o ativismo judicial também abre nefastos precedentes para que o julgador se arrogue de suas funções a fim de interpretar arbitrariamente as diversas normas jurídicas conforme sua conveniência, valores ideológicos e até mesmo conforme o clamor popular, ainda que num notório desvirtuamento do texto constitucional, com uma hermenêutica bastante heterodoxa e questionável juridicamente; visando solucionar impasses complexos com soluções simplórias, cujo objetivo principal é construir uma boa imagem perante a opinião pública, como ocorreu com a recente decisão do STF em declarar a constitucionalidade da execução da pena em segunda instância, sendo que a Lei Maior é bem clara no seu artigo 5º, inciso LVII, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, ou seja, até a condenação em última instância, no caso o STF, ninguém poderia ser preso durante o processo, com exceções já previstas na Constituição e no Código de Processo Penal para evitar a impunidade. Mas, diante de uma comoção popular causada pela corrupção que atingiu a alta cúpula do Executivo e do Legislativo, bem como dirigentes de Estatais e Executivos do setor privado, então a maioria dos ministros da suprema corte achou por bem dar uma outra interpretação a essa previsão constitucional historicamente conquistada, deturpando sua essência protetora da presunção de inocência. Entrando, inclusive, em contradição com uma das pedras angulares que fundamentam o ativismo judicial: o princípio da dignidade da pessoa humana.

Portanto, é com extrema delicadeza que deve ser analisado o ativismo judicial, pois a sua banalização, como já vem ocorrendo, pode ocasionar diversos gravames à Carta Maior, principalmente no que tange à separação de poderes e às competências positivadas; além de que, muitas decisões tomadas parecem mais servir a questões de cunho populistas do que jurídicas. Por conseguinte, institucionalizando a existência de um superpoder, não eleito para tal, que regerá a vida em sociedade conforme seu bel-prazer e paixões, a exemplo do que foi o poder Moderador no Império; violando, assim, a democracia, que é uma cláusula pétrea da Constituição, implantando, ainda que informalmente, uma “magistocracia”.

John. R. Angelim Novais - 1º Direito Noturno

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