terça-feira, 22 de novembro de 2016

Judicialização, Direito e Equidade



É muito frequente, na história brasileira, a perigosa busca por um salvador, por um Messias, um justo que guie a sociedade e resolva os impasses. Nesse contexto, não causa surpresa o fenômeno da judicialização estar facilmente visível em questões políticas e sociais. A judicialização, tratada por José Roberto Barroso, consiste propriamente na transferência de poder para órgãos do Poder Judiciário, fazendo com que estes tomem decisões que seriam, anteriormente, tomadas pelas instâncias tradicionais.
                Essa ampliação da atuação do Judiciário advém muito da contínua crise do próprio Legislativo, tanto de representatividade e consequente legitimidade, quanto de própria funcionalidade. Logo, o Judiciário, além de protetor da Constituição, regulando a produção legislativa através do abrangente Controle de Constitucionalidade brasileiro, passa também, nesse contexto, a “legislar”, sendo chamado a decidir sobre questões de grande importância.
                O caso do julgado, em que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu  a união homoafetiva como entidade familiar, mostra que, atuando através de seus ministros, houve uma clara defesa da existência material de direitos fundamentais, presentes na essência da Constituição. Pode-se remeter à visão de Boaventura de Souza Santos, do Direito como instrumento de emancipação social e forma de alcance de uma legalidade cosmopolita. Além disso, cabe também o pensamento de Weber, com a ideia de ampliação da forma que produz limitações materiais a certos grupos sociais, numa dinâmica revolucionária de contestação dessa forma pouco abrangente. Fica clara a importância do direito para a real equidade, na formação de um novo direito a partir da refutação tanto da ordem atual, quanto do Direito que falta em tutelar propriamente a sociedade como um todo.
                Os partidos políticos, na lógica do cenário atual têm dificuldade em atuar como articuladores dos novos sujeitos sociais cujos interesses são vários, difusos e não universalizáveis,  acentuando ainda mais essa falta de representatividade; ocorrendo com grande frequência a profusão de organizações  de identidade coletiva, como as religiosas e as étnicas, por exemplo. O fato recente da elaboração, pelo Congresso Nacional, do Estatuto da Família (projeto que prevê o reconhecimento, como família, apenas da união composta por homem e mulher), mostra essa discrepância entre esse órgão e incontáveis movimentos sociais. Mostra-se, portanto, que apenas alguns anseios da população estão de fato representados do legislativo, remetendo novamente à atual crise do Legislativo.
                Há a ideia também de ativismo judicial, que consiste numa escolha deliberada de interpretar a Constituição de uma maneira específica, extraindo dela  o máximo  de sentido, ampliando assim seu alcance. Os ativistas sociais, que abarcam as várias esferas da sociedade têm seu papel crucial na busca por mudanças profícuas na realidade social.
                A judicialização apresentou grandes avanços, com a redemocratização a partir da Constituição de 1988 e com os abrangentes constitucionalismo e controle de constitucionalidade, havendo ganhos significativos para a sociedade na forma de avanços socias. Porém, não há como negar a necessidade de uma restruturação política no Brasil para que, além de mitigar o perigo de uma centralização das decisões em apenas uma competência que, como outras, possui seus próprios valores e ideologias, haja uma real representação dos cidadãos e um funcionamento eficiente do órgão que reúne esses representantes, eleitos para tal, de forma a alcançar isonomia e equidade na aplicação dos direitos.

“Venha, o amor tem sempre a porta aberta/ E vem chegando a primavera/ Nosso futuro recomeça:/ Venha, que o que vem é perfeição” (Renato Russo)

Vívian Gutierrez Tamaki, 1º ano de Direito Diurno

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