domingo, 6 de dezembro de 2015

O Espaço do Possíveis e a ADPF 54/DF

   Examinaremos a ADPF 54/DF que no ano de 2012, por maioria de votos julgou procedente a ação que declarou a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada nos artigo 124, 126, 128, incisos I e II, todos do Código Penal, à luz do admirável sociólogo francês Pierre Bourdieu. Faremos algumas considerações, tendo como principal objetivo não apenas considerações do julgado, mas examinar o que de fato a decisão do STF significa para a sociedade como um todo.
   A começar pelo julgado que levou oito anos para chegar ao plenário do STF, para finalmente ser decidido, algo de relevante interesse nacional, que é a criminalização ou não do aborto de anencéfalos. De um lado a Igreja e seus fiéis - não só a católica, mas todos as que declaram ter uma fé cristã - que exercem na sociedade uma força em grande porção dos brasileiros e do outro o direito de escolha da mãe que com o aparato do Estado que em tese (constitucionalmente) se diz laico juntamente com o movimento das feministas.
   Muito se pauta que o aborto, de qualquer natureza ou justificativa, é um ataque à vida, condenável e repudiável em qualquer hipótese, mas e quando se trata de um ser humano que está condenado à morte logo depois do parto como é o caso dos fetos anencéfalos? A posição da maioria dos conservadores e seguidores de qualquer religião que seja, se mantém intacta, ou seja, jamais se deve abortar uma vida. Muito embora muitos dos nossos preceitos morais e valores estejam baseado numa ética cristã, vivemos em um Estado laico e como muitos sabem, isso significa que o Estado tem numa posição neutra no campo religioso, portanto apesar da influência religiosa, o Brasil em suas decisões não se deve alicerçar na religião ou seus preceitos. Como dito pelo Ministro Celso de Mello o Direito na nossa república, não se submete à religião. 
   Desta forma, a deliberação dos Ministros giravam em torno da inconstitucionalidade do aborto de fetos anencéfalos. Apesar do infortúnio da mãe em gerar um feto com pouquíssimas chances de vida, existe sobretudo uma vida, como já tido com chances mínimas de após o parto um longo período de vida, mas ainda assim é resguardado a ele o Direito à vida, mas temos também a mãe que como a maioria delas deseja ter um filho saudável e que consiga ter uma vida digna, no entanto teve a infelicidade de carregar no útero um ser condenado à morte, temos aí então um risco de prejuízo não só emocional mas também à dignidade da pessoa humana, por todo o abalo e um possível trauma psicológico de ter que levar até o fim a gestação de um feto anencéfalo.
  Bourdieu dizia que o Direito se pauta numa lógica científica e uma lógica moral, desse modo se reconhece que o Direito se impõe necessariamente e de forma simultânea  numa lógica e numa moral, noutros termos temos a razão e a moral em lados opostos e entre eles temos o espaço dos possíveis, a qual a tomada de decisões se faz neste espaço. Diante disso, quando se trata de temas como a da ADPF 54/DF é neste espaço dos possíveis é que temos algumas soluções, com muitos embates e discussões para se determinar qual a força que "vencerá" se é a lógica positiva da razão ou se é a lógica positiva da moral. Bourdieu formula o conceito de habitus, que em poucas palavras dão a cada indivíduo diversas visões de mundo o que acarreta em diferentes disposições para a ação, internalizando características de uma força simbólica, que não lhe são percebidas.
  Contudo através do conceito de habitus de Bourdieu que se consiga explicar tantas controvérsias a despeito do tema do julgado.
Destarte, a decisão do STF que por anos fora aguardada, e que ainda se tem muita discussão, percebemos que a vida da mãe, a vontade e acima de tudo a dignidade dela fora respeitada, pois os reflexos da não interrupção da gestação de um feto anencéfalo, podem chegar até ser irreversíveis, pelo fato da lei não lhe permitir o aborto de alguém que está fadado à morte, portanto concluo que a decisão fora acertada, não porque somos um Estado laico, mas principalmente por resguardar o direito de levar adiante a sua escolha, segundo seus próprios habitus, sem punição.




Lemuel Dias
1º ano Direito Noturno


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