segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Bordieu e a ADPF 54

Pierre Bordieu, influente pensador do campo das ciências sociais, fez um estudo sobre a constituição do campo jurídico. Bordieu acreditava que o Direito deveria evitar o instrumentalismo e o formalismo. O instrumentalismo vê o Direito como uma forma de dominação, ou seja, um instrumento da classe dominante que age de acordo com os interesses desta. O formalismo por sua vez enxerga o Direito como uma forma autônoma que independe das pressões e movimentos sociais. Bordieu critica Kelsen que acreditava na autonomia do Direito perante as pressões sociais.
Para o pensador existe ainda uma dualidade no Direito, uma “luta simbólica” protagonizada pelos doutrinadores e pelos aplicadores do Direito. Os doutrinadores encarregados da elaboração teórica tendem a puxar o Direito para o lado da teoria pura, autônomo as pressões sociais. Os aplicadores se encontram em situações concretas onde precisam aplicar o que está na norma, essas situações mostram quando a norma entra em conflito com a realidade, não acompanhando as demandas sociais que surgem com o decorrer da história.
A partir desse conflito podemos notar o fenômeno estudado anteriormente o avanço da judicialização. Analisando a ADPF 54, a luz do pensamento de Bordieu, notamos que o Direito, não pode ser analisado de maneira formalista, pois não está alheio as demandas sociais e nem sempre uma norma universal atende as necessidades da população. A ADPF 54, que visa à descriminalização do aborto de anencéfalos, mostra justamente isso, pois é um caso onde a norma não acompanhou as demandas sociais através da história, pois antigamente não se tinha a tecnologia necessária para descobrir se um feto era anencefálo ou não, essa decisão é uma ampliação no “campo dos possíveis”.
A decisão a favor da descriminalização do aborto de feto anencefálo é um pequeno avanço na justiça brasileira. É a possibilidade de findar um grande sofrimento e uma crueldade contra a mulher, pois sim, é extremamente cruel o Estado obrigar uma mulher a carregar um feto que não tem a possibilidade de sobreviver. É uma afronta a dignidade humana, a liberdade sexual e reprodutiva e a diversos direitos fundamentais. A mulher sofre diariamente com a opressão da sociedade que lhe rouba o direito de dispor do próprio corpo. O aborto é um tabu e mesmo no caso dos anencéfalos onde não há a possibilidade de sobrevivência do feto, ainda existem pessoas que consideram isso um crime, um assassinato. A descriminalização nesses casos é um passo bem pequeno, mas já é alguma coisa, a luta continua. 

Juliane P. Motinho
 Direito - Noturno

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