domingo, 29 de novembro de 2015

Julgando o Judiciário

A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu no dia 26 de junho deste ano que a Constituição do país garante aos casais homossexuais o direito de se casarem, em uma vitória histórica para o movimento LGBT nos EUA.  O tribunal decidiu, por 5 votos a 4, que as garantias constitucionais do devido processo legal e da proteção igualitária nos termos da lei significam que os Estados não podem proibir os casamentos de pessoas do mesmo sexo. Com o veredicto, o casamento gay se tornará legal em todos os 50 estados da nação.

Em 2011, o Brasil julgou no seu Supremo Tribunal Federal, também, sobre a questão da legalização do casamento homoafetivo. Na época, os juízes reconheceram ,em unanimidade, a equiparação da união homossexual à heterossexual. Dois anos depois, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidiu que os cartórios brasileiros fossem obrigados a celebrar casamento entre pessoas do mesmo sexo, e não poderiam se recusar a converter união estável homoafetiva em casamento.

Na decisão do STF, duas ações estavam em discussão. A primeira, ajuizada em fevereiro de 2008, é do governador reeleito do Rio, Sérgio Cabral (PMDB). Ele pede que o Código Civil e que o Estatuto dos Servidores Civis do Estado não façam qualquer discriminação entre casais heterossexuais e homossexuais no que diz respeito ao reconhecimento legal da união estável. A ação afirma que posicionamentos discriminatórios vão de encontro a princípios constitucionais como o direito à igualdade e à liberdade e o princípio da dignidade da pessoa humana.

A outra ação em análise, da Procuradoria-Geral da República, foi ajuizada em julho de 2009. O pedido é semelhante: que o STF declare obrigatório o reconhecimento, no Brasil, da união de pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Também pede que os mesmos direitos dos casais heterossexuais sejam estendidos aos casais homossexuais.

O professor Titular de Direito Constitucional, Doutor e Livre-Docente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Luís Roberto Barroso, durante o julgamento da ADPF em questão não era ministro do STF. Contudo, em seu texto ‘Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática’, discute- se sobre a essência do trabalho do ministro da Suprema Corte brasileira e as novas temáticas que estão aparecendo para julgamento e as conseqüências para toda a sociedade civil.

Segundo o Barroso, as cortes constitucionais ou supremas cortes destacaram-se em determinadas quadras históricas como protagonistas de decisões envolvendo questões de largo alcance político, implementação de políticas públicas ou escolhas morais em temas contravertidos  na sociedade. Dessa maneira, coube ao judiciário debater sobre questões polêmicas e avaliar o que está de acordo com a Constituição e o que é melhor para a população.

Nesse momento, observa-se que os ministros passaram a Judicializar a vida, ou seja algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo. A judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação da sociedade.

A redemocratização foi um dos fatores que fortaleceram e expandiram o poder judiciário, bem como aumentaram a demanda por justiça na sociedade brasileira. O Constitucionalismo abrangente transformou um direito individual em matéria de norma constitucional e por isso uma pretensão jurídica que pode ser formulada sob a forma de ação judicial. Além disso, o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade é uma dos mais abrangentes do mundo e permitem que judiciário fiscalize quotidianamente o ordenamento jurídico nacional.

O professor da UERJ, também destaca o conceito de ativismo judicial, que para ele é uma escolha específica e proativa de interpretar a Constituição, expandindo seu sentido e alcance. Normalmente ele se instala em situações de retração do Poder legislativo, de um certo deslocamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva. A ideia do ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois poderes.

Atualmente, uma persistente crise de representatividade, legitimidade e funcionalidade no âmbito do Legislativo tem alimentado a expansão do judiciário nessa direção. O judiciário está atendendo as demandas da sociedade que não puderam ser satisfeitas pelo parlamento e estão aplicando a Constituição e as leis visando a concretização das demandas populares.

O constitucionalismo deve proteger os valores e direitos fundamentais, mesmo que contra a vontade circunstancial de quem tem mais votos, ele deve preservar a democracia e os direitos fundamentais, em relação a todos os demais protagonistas da vida política e decidir de maneira mais pluralista e diversificada possível as melhores escolhas para a sociedade.

Cabe ao juiz, agir em nome da Constituição e das leis, e não por vontade política própria, sua atuação deve estar em sintonia com o sentimento social, na medida do possível e, nunca perder de vista que seu poder é representativo, pois emana do povo e em seu nome deve ser exercido. Deve  se lembrar sempre que em caso de divergência na interpretação das normas constitucionais ou legais, a palavra final é do judiciário.

O judiciário atua como representantes indiretos da vontade popular. Sujeita-se, assim, aos cânones de racionalidade, objetividade e motivação das decisões judiciais, devendo reverência à dogmática jurídica, aos princípios de interpretação e aos precedentes, ma sós pode agir dentro das possibilidade e dos limites abertos pelo ordenamento jurídico. A posição do judiciário deverá ser a de deferência para com as valorações feitas pela instância especializada, desde que possuem razoabilidade e tenham observado o procedimento adequado.

Em suma: o judiciário é o guardião da Constituição e deve fazê-la valer, em nome dos direitos fundamentais e dos valores e procedimentos democráticos, inclusive em face de outros poderes, respeitados emproe tonteiras procedimentais e substantivas do Direito: racionalidade, motivação correção e justiça.


Na ocasião da liberação do casamento homoafetivo nos EUA o juiz Anthony Kennedy, escrevendo em nome da corte, disse que a esperança das pessoas gays que querem se casar “é não serem condenadas a viver na solidão, excluídas das mais antigas instituições de nossa civilização. Elas pedem a mesma dignidade aos olhos da lei. A Constituição lhes garante esse direito’’. As palavras do ministro da Suprema Corte exemplificam perfeitamente a  inserção da judicialização da vida contemporânea e aplicação da justiça para uma construção de um mundo mais igualitário e melhor.

Arthur Resende 
1º ano - Direito Noturno

Nenhum comentário:

Postar um comentário