segunda-feira, 1 de junho de 2015

NOSSO REFERENCIAL SOCIAL: NEGLIGENTE E ALIENADOR, TALVEZ?

Pensador moderno formado em Direito, Economia e Filosofia, Durkheim foi claramente influenciado pelo cientificismo de sua época e logo nos propõe uma sociologia funcionalista. Desenvolvendo diversos conceitos, é a partir de sua compreensão, que ele nos possibilita entrever as distorções que impregnam e prejudicam o funcionamento do corpo social.
Ele enxerga cada sociedade como um grande organismo formado por teias de relações. São as relações, produto da interação de dado grupo social, que desde o nascimento do indivíduo, trata de molda-lo e o torna-lo reprodutor do conjunto de padrões engendrados pela cultura daquele local, isto é, da consciência do grupo. Tais relações que dialogam entre si constituem os denominados fatos sociais.
O fato social vincula o indivíduo ao referencial de tal forma que qualquer distanciamento das regras praticadas pelo grupo acarreta a coerção sobre a pessoa. A violência contra esta pessoa é consequência da moral cerceadora da coletividade, que trata de reforçar seu poder e limitar a autonomia individual – se o ser não age conforme os padrões de sua sociedade, os fatos sociais o punirão, seja psicologicamente, fisicamente ou institucionalmente.
Em certos estágios do processo de socialização já não há necessidade da presença física do grupo para impor a coerção, a mente da pessoa se autoviolenta quando não reproduz os padrões. Os transtornos alimentares como bulimia e aneroxia são claros exemplos de fatos sociais patológicos, nos quais pessoas, a partir do que é transmitido e imposto pelos meios de comunicação – uma normatização distorcida do corpo humano - passam a se enxergar fora dos padrões estéticos determinados e com isso negam a si o prazer de uma alimentação adequada para se submeter a visão idealizada de corpo.
 O Direito materializa as regras sociais padrão da consciência coletiva, e ao exercer formalmente uma punição aos entes que as violam, cria uma forte coesão social, e assim se constituindo como, talvez, o mais importante dos fatos sociais. Como o fato social visa uma conservação da dinâmica social, logo, o direito não se põe a alterar o que não afeta o equilíbrio social.
Os diversos casos de linchamentos públicos de jovens negros suspeitos de cometerem crimes, ocorridos ao redor das regiões do Brasil em 2014, expuseram um sentimento autônomo de fazer justiça com as próprias mãos, contraposto alguns preceitos que constituem a ciência jurídica – a garantia de segurança pública como dever do Estado e o respeito aos direitos humanos como uma atitude cidadã – e refletiram, destarte, o reforço de uma consciência dos chamados “cidadãos de bem”, e em último caso, a criação de uma nova normatividade, tão logo, expressão anômica dentro da sociedade brasileira.
Esta situação não é de certa surpresa. Ela se deriva de uma consciência, elitista e segregatória, praticada e que organiza a sociedade brasileira desde muito tempo.  A população negra, maior parcela do povo brasileiro, continua sendo explorada seja pela falta de oportunidades que não tem acesso cotidianamente se comparada ao contingente branco, seja pelas violências praticadas em decorrência da doutrina neocolonialista instalada com a colonização portuguesa em solo nacional. Ser negro e pobre, é no Brasil, símbolo de ser propício ao crime. Não se estranha que esse pensamento seja majoritário entre a classe branca e burguesa.  As estatísticas demonstram grande número de jovens negros aderindo ao crime como atalho a uma ascensão econômica e meio de ajudar em casa suas famílias, em detrimento de um emprego formal, muitas vezes precário e de baixa remuneração. A tudo isso ainda se soma o consumismo pregado na mídia que os afeta– a exclusão face a compra de artigos de marca em relação a grande massa usuária dele aumenta ainda mais o desejo de tais produtos pela classe negra.  
A materialização parcial da dignidade humana de negros em pouco afeta o corpo social.  Há um desprezo do próprio dito Estado de Direito, que se realiza nas diversas violências praticadas contra negros: são eles os mais perseguidos e mortos nas patrulhas policiais, têm suas tradições culturais e religiosas desrespeitadas, são precárias as políticas públicas desenvolvidas para lhe darem moradia, saúde e educação.
Para Durkheim, em sumo, é a consciência coletiva que garante os elos de solidariedade e solidez de uma sociedade. Por isso, faz-se necessária, a prática de uma educação cotidiana livre de preconceitos e dos valores do capital, fator essencial para possibilitar a transformação dessa consciência a fim de que toda a humanidade possa regozijar-se em uma existência digna e plena.

Aula 5. Direito Noturno. João Victor Ruiz.

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