domingo, 18 de novembro de 2012

Analise do Direito como agente emancipador: A crise contratual moderna e o fascismo social


 1.      INTRODUÇÃO
Os direitos sociais constitucionalizados, no art. 6º da Constituição Federal do Brasil, integram o núcleo dos chamados direitos fundamentais, quase todos legislados pelo art. 5º, nos incisos I a LXXVIII. Sendo direitos fundamentais, eles inserem-se nas garantias sociais  do Estado Democrático de Direito brasileiro que integra o patrimônio jurídico do povo.

A estabilidade das relações jurídicas, inapelavelmente, antes de servir de base segura  ao  povo, constitui valor fundamental de uma Estado que tenha a pretensão de merecer o título de Estado Democrático de Direito. Por isso, o ordenamento jurídico pátrio é taxativo (consolidado na observação dos preceitos dogmáticos da constituição) ao assegurar como princípio fundamental, no art. 1º da Constituição Federal de 1988, que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito, enaltecendo dentre outros, os valores sociais do trabalho (inc. IV, art. 1º), a dignidade da pessoa humana (inc. III, art. 1º),  a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (inc. I, art. 3º), a erradicação da pobreza  e a redução das desigualdades sociais e regionais (inc. III, art. 3º),a promoção do bem de todos (inc. IV, art. 3º).

Além disso, o art. 6º relaciona os direitos sociais: a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados. Dessa forma, interpreta Milton Santos “... Os direitos sociais merecem um tratamento de relevância entre os direitos fundamentais definidos no extenso catálogo de direitos constitucionais do Brasil, e nessa exata medida, o próprio desenvolvimento, enquanto verbo e ação necessita ter como viés central a efetivação e a concretização dos direitos sociais fundamentais, os quais devem ser o fim e o objeto nuclear do desenvolvimento, não se concebendo, portanto, um processo de desenvolvimento centrado unicamente em teorias econômicas desprendidas dos valores humanos” (Milton Santos, Por uma economia politica da cidade, 1994).

Observa-se dessa forma que a própria concepção de Estado Democrático de Direito abrange a qualidade emancipatória do Direito. Primeiramente porque garante segundo Elias Dias, por respaldo jurídico, a passagem do neocapitalismo e sua ideologia operante (Conservadorismo burguês) para o socialismo em conjunto a uma ideologia solidaria. Em segundo momento o Estado Democrático, baseado na proposta de Herman Heller, Garante a democratização da economia, servindo como alavanca do desenvolvimento econômico e social do Estado.

Porem cabe aqui dizer que os ditos Estados Democráticos de Direito da modernidade somente o são de fato no titulo, oque se observa modernamente são instituições que se desviaram em seus objetivos, sendo manipuladas por corporações com objetivos estritamente baseados na logica de mercado, em conjunto com Estados fracos em uma profunda crise do Contrato social. Dessa forma, com suas instituições deturpadas e sua administração em crise, os Estados ditos “Democráticos de Direito” nada podem fazer para impedir a “patologia social”, como diria Durkheim, identificada por Boaventura Santos, o fascismo social.

2 .      Crise contratual e o Fascismo social
O contrato social é a metáfora fundadora da racionalidade social e política da modernidade ocidental. Como qualquer outro, assenta-se em critérios de inclusão. Ele visa criar um paradigma sociopolítico que produz de maneira normal, constante e consistente quatro bens públicos: legitimidade da governação, bem-estar econômico e social, segurança e identidade coletiva.

Esse paradigma atravessa, segundo Boaventura Santos, grande turbulência. A crise contratual moderna consiste na predominância estrutural dos processos de exclusão sobre os de inclusão, sob duas formas: o pós-contratualismo e o pré-contratualismo. Tais formas de exclusão encontram-se como entes formadores de um conceito muito maior, chamado de fascismo social, que Boaventura Santos o identifica como “um tipo de regime no qual predomina a lógica dos mercados financeiros em detrimento de grandes setores das populações, gradativamente distanciados e excluídos do campo de direitos sociais adquiridos nas últimas décadas.” (Santos, 2003,p.3-76).

3 .      Manifestações do Fascismo social: Apartheid Social e Fascismo da Insegurança.

3.1  Fascismo da insegurança
A modernidade avança em um ritmo tão frenético que aparentemente não há limites para o seu desenvolvimento. Fugindo-se de tal utopia, o grande sociólogo polonês Zygmunt Bauman assevera que a modernidade que presenciamos alicerça-se basicamente em dois pilares: a insegurança e a indeterminação. O medo torna-se onipresente, manifestando-se em todos os estratos sociais, contrariando todas as lógicas naturais de que a tecnologia seria a mola propulsora da felicidade humana. Soergue-se então um trágico ciclo vicioso: “tendo assolado o mundo dos humanos, o medo se torna capaz de se impulsionar e se intensificar por si mesmo” (BAUMAN, 2006, p.172).
O grande sociólogo ainda pondera que presenciamos um mundo “negativamente globalizado”. A sociedade desenvolve uma ânsia compulsória por se sentir segura, no qual desenvolvemos um amor exacerbado por essa segurança, em todos os âmbitos possíveis. Como bom e fiel companheiro, o capitalismo não se absteria de mercantilizar tal anseio, disseminando-o diariamente pelo meio midiático.
Apesar da redistribuição social que vivenciamos em relação ao medo, percebe-se que seus efeitos mais drásticos manifestam-se nas classes subalternas. O jus sociólogo Boaventura de Sousa Santos enfatiza justamente essa vertente dentro da perspectiva do fascismo da insegurança, inserido na lógica da “globalização contra hegemônica”. Essa, nos dizeres do autor, é a “manipulação discricionária do sentimento de insegurança das pessoas e dos grupos sociais vulnerabilizados pela precariedade de emprego ou por acidentes ou acontecimentos desestabilizadores” (SANTOS, 2003, p.22).
O autor explicita que esse fascismo articula-se pela ação de um “jogo de ilusões retrospectivas e prospectivas”. As ilusões retrospectivas salientam o ciclo do medo e da insegurança, acoplado de um sentimento de ineficiência da burocracia estatal no que tange a prestação de serviços e segurança social, incitando a interferência da esfera privada no setor estatal. As prospectivas, por sua vez, alimentam um ilusório bem-estar por deter maior segurança, muitas vezes ocultando seus riscos, propagam essa premissa como se fosse uma virtude, afinal o medo necessita ser combatido (uma grande hipocrisia, afinal o impulsiona).
O fascismo da insegurança, infelizmente, na sociedade dita como pós-moderna manifesta-se como uma característica inerente e muito presente. Diversas exemplificações consubstanciariam esse, todavia priorizou-se pela abordagem da privatização do Banco do Estado do Maranhão (BEM) que decorreu em 2004, quando o Bradesco venceu o leilão da compra do referido banco. Aparentemente, uma mera prática neoliberal que ocorreu de modo lícito, permitida dentro do cenário da “globalização hegemônica”, todavia camufla os reais patamares no qual a insegurança fora inserida.
De acordo com dados do Sindicato dos Bancários, o BEM possuía dois mil funcionários, sendo que no momento em que fora vendido para o Bradesco, possuía somente 473 empregados. Em 2007, esse número reduziu-se, mais ainda, a 153 bancários. Gradativamente, disseminou-se entre os funcionários uma veemente “pressão psicológica” por metas que deveriam ser cumpridas, no qual o não cumprimento dessas acarretaria em demissões por justa causa. Inúmeros desses funcionários eram concursados, contradição em relação a legalidade vigente, além de muitos já terem estabelecido carreira ali, pois depois de tantos anos trabalhando no mesmo estabelecimento, desenvolveram uma identidade com o mesmo, que fora incorporada ao seu “patrimônio”.
Inevitavelmente, mazelas soergueram-se dessa usurpação e desrespeito aos direitos então adquiridos por aqueles. No âmbito econômico, muitos desses bancários se quer receberam indenizações, pois a pressão chegou a tão ponto, que se auto demitiam; ou se recebiam, não era coerente com os anos prestados. Mais pérfido ainda, foram as consequências quanto a saúde, pois muitos ingressaram em uma profunda depressão, outros adquiriram problemas emocionais, relacionamentos foram destruídos frente a esse caos, etc. A quem então recorrer, afinal o próprio Estado legitimava tal ação? Mais uma vez os subalternos são segregados e impossibilitados se quer de reivindicar por seus devidos direitos, sendo literalmente membros de uma “sociedade civil incivil”.
Reitera-se novamente a tão inflamada insegurança, mas será se essa necessita de um viés econômico? Dentro de uma lógica do mercado, no qual vivenciamos, é impossível qualquer ato não se relacionar aos princípios imperantes do capital, seja direta ou indiretamente, seja a curto ou longo prazo.
 Dentro dessa perspectiva, destaca-se a “pedagogia educacional” disseminada em Israel e na China. Os cidadãos israelenses são submetidos a uma forte pressão psicológica, no qual desde pequenos assimilam gradativamente o massacre pelo qual seu povo passou; posteriormente na adolescência, muitos visitam os campos de concentração, onde é disseminada a ideologia de que o massacre aos judeus não persiste por deterem grande potencial bélico. Já os chineses absorvem um discurso do ódio aos japoneses desde a infância, no qual sucessivamente reporta-se ao Massacre de Nanquim, no qual foram mortos mais de 200 mil chineses e exige-se uma “contraprestação” apesar dessa tragédia ter ocorrido há mais de 70 anos.
3.2 Apartheid Social
O fascismo social pode se manifestar também na forma de apartheid social, que é a “segregação social dos excluídos mediante a divisão das cidades em zonas selvagens e zonas civilizadas”¹. Essas zonas podem ser tipificadas com exemplos bem atuais de segregação. As “zonas selvagens” são regiões como a “Cracolândia” no bairro da Santa Ifigênia em São Paulo, que passou por uma intervenção truculenta de dispersão dos viciados, levantando extensa polêmica. A ação dirigida pelo poder municipal em conjunto com o poder estadual foi, realmente, realizada de forma desumanizadora, fortalecendo o estigma de marginalidade e periculosidade ao tratar os viciados como cães que devem ser enxotados. Como se pode ver, nessas zonas o Estado “atua de forma fascizante, comportando-se como um Estado predador, sem a menor consideração, nem sequer na aparência, pelo Estado de direito.” ²

No entanto, medidas precisavam ser tomadas com relação àquela região, afinal, segundo alguns comentaristas, era “privatizada” pelos traficantes, muitos presos nessa ação. O Estado havia simplesmente abandonado o local, nenhum tipo de serviço público era oferecido ali ou nas redondezas, a não ser o serviço policial, nenhum pouco preparado pra fazer algo diferente do que tem sido feito. Segundo especialista, uma política de redução de danos, realizada através da distribuição de seringas, preservativos e alimentos aos viciados, criando um vínculo entre eles e assistentes sociais, como realizado em muitas regiões de Portugal, geraria a possibilidade de uma efetiva retirada desses indivíduos das ruas através de tratamento oferecido pelo poder público em locais apropriados, como deveria ser o “tendão da Rua Prates”, ainda não terminado.

Para os moradores, entretanto, essa maneira de agir poderia facilmente ser confundida com uma “oficialização” do local como ponto livre para usuários de drogas. Realizar uma ação violenta gera um sentimento de efetividade, de um Estado realmente ativo, que cumpri o seu dever perante a sociedade; sentimento muito conveniente para se ter entre eleitores em um ano de eleições. Coincidência, não? Trabalhar de forma conjunta com os moradores da região, que têm o direito de viver em um lugar mais seguro, explicando os projetos de ação frente aos problemas e, quem sabe, torná-los coparticipantes dessas ações, com certeza é difícil, mas as tornaria mais realistas; evitando, assim, que haja uma maior segregação e fuga para as “zonas civilizadas”, isto é, os condomínios fechados, “cidades privadas”, “comunidades muradas”.

A multiplicação intensa de condomínios fechados tem sido objeto de estudos devido à separação que gera entre o cidadão com recursos e o cidadão comum. O medo da violência, intencionalmente exacerbado por programas televisivos sensacionalistas, e a garantia de segurança contra essa violência são algumas das principais justificativas utilizadas pelos que buscam esses locais de habitação, “mesmo considerando a possibilidade de que esteja ocorrendo um aumento da criminalidade, principalmente das taxas de crimes violentos, é necessário anotar que os promotores desses empreendimentos , assim como a mídia, têm usado esses índices sem o devido rigor. O assunto é tratado como se a violência fosse generalizada, e não um problema circunscrito a algumas situações e relacionado a universos delimitados. Na verdade, devemos ter em mente que os índices muito elevados de criminalidade se referem, sobretudo, às áreas onde se concentra a moradia da população mais pobre.”³

Mas não são os únicos argumentos utilizados, o desejo de “exclusividade” também está muito envolvido nessa escolha; a busca por estar realmente separado do comum, excluindo territorialmente os “diferenciados”, evitando o “incômodo” de ter contato com outros grupos sociais, também estão entre os motivos citados. “Os pesquisadores, Atkinson e Flint (2004), ressaltam que a necessidade de segurança por parte dos moradores dessas comunidades não significa apenas proteção contra crimes violentos, mas também uma vontade de evitar as “incivilidades” cotidianas. As pessoas entrevistadas, tanto dentro como fora dos condomínios fechados têm um sentimento de que a distinção e a exclusividade eram tão ou mais importantes do que as preocupações com a segurança, para explicar a atração por esse tipo de residência.” 4 Nessas “zonas civilizadas” o “Estado atua de forma democrática, comportando-se como um Estado protetor, ainda que muitas vezes ineficaz e não fiável”. 5

Nesse contexto, o substrato ideológico, propagado pelas mídias e financiado pelas grandes corporações, de instabilidade e insegurança enquadra-se integralmente no conceito de fascismo de apartheid social de BOAVENTURA, anteriormente citado no texto; permitindo uma compreensão do engano à que estamos sujeitos, um chacoalhar das nossas pré-concepções e, quem sabe, um eventual diferente enfrentamento de questões tão nossas, mas encaradas por uma visão “outruísta”, isto é, não é minha responsabilidade.

1.      SANTOS, Boaventura de Sousa. Revista Crítica de Ciências Sociais, 65, Maio 2003, pg. 21.
2.      SANTOS, Boaventura de Sousa. Revista Crítica de Ciências Sociais, 65, Maio 2003, pg. 21.
3.      Disponível em: < http://www.fee.tche.br/sitefee/download/tds/019.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2012. pg. 10
4.      Disponível em: < http://www.fee.tche.br/sitefee/download/tds/019.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2012. pg.12
5.      SANTOS, Boaventura de Sousa. Revista Crítica de Ciências Sociais, 65, Maio 2003, pg. 21.

4 .      Bibliografia

BAUMAN, Zygmunt. Medo líquido. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.

Diaz, Elias. Estado de derecho y  sociedad democrática. Madri: Edicursa, 1969.

Heller, Herman. Teoria Do Estado. São Paulo: Edipiro, 1968.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Revista Crítica de Ciências Sociais, 65, Maio 2003.

SANTOS, Milton. Por uma economia política da cidade. SP: Hucitec /Educ, 1994.



Membros do Grupo: Heloisa Bretas, Gustavo Bourbon, Luísa Thomazella, Sahid Sekeff, Yuri Rios. 






Direito e o novo mundo do trabalho

Durante grande parte da história da humanidade, o capitalismo, ainda que de sua forma mais rudimentar, foi presente. Com o passar do tempo, aquele escambo evoluiu para o comércio, que nada mais é que a troca de algo a qual foi atribuído valor, devido à sua raridade dando poder a seu detentor, e a mercadoria alvo do interesse. Tendo em vista o desenvolvimento do sistema, foram necessários funcionários; o sistema pedia cada vez mais mão-de-obra. No inicio, a relação empregador-empregado era mais intrínseca, era mais unida.
Para exemplificar, imagine uma fábrica, ou um comércio, onde os empregados conheciam seus empregadores, e vice-versa. Isso já é uma grande diferença, comparado com a atualidade. Atravessando crises e períodos de ouro, os trabalhadores foram garantindo direitos que pudessem beneficiá-los a partir do fim século XIX. Contudo, passado um século, tais direitos estão sendo dissolvidos junto com o vinculo que outrora foi duradouro. A relação caracterizada anteriormente como base do contrato social, a empregador-empregado, atualmente sofre diversas alterações. Devido ao mundo globalizado e às novas demandas de conhecimento específico, os requisitos para a contratação tornaram-se polarizados; ou são de alta especificidade com alta remuneração, alta procura e baixo número de concorrentes; ou de trabalho principalmente físico, com baixa especificidade, baixa remuneração, e - devido ao alto número de candidatos em um país como o Brasil - alta competição. São nesses polos que o mundo do trabalho hoje se divide. Em ambos as relações são líquidas, flexíveis e temporárias.
A partir dessa divisão, temos cada vez mais membros da sociedade excluídos do sistema. Devido ao não crescimento da necessidade de mão-de-obra, está cada vez mais difícil a inserção no mercado de trabalho. Isso se deve ao desenvolvimento de tecnologias e à ganancia do capital, que visa produzir mais com menos gastos. Garantindo o emprego aos trabalhadores que sobraram só há um curto contrato. Com a redução do tempo desse vinculo, os direitos garantidos ficam cada vez mais estreitos, podendo se observar a fissura no contrato social, tal qual Boaventura nos explicitou. Junto a isso, o aumento populacional e o aumento de jovens ao ingresso no mercado de trabalho fazem crescer a quantidade de pessoas à margem do sistema.
A situação é mais complicada do que se imagina. Imagine a uma pequena ou média empresa. Essa empresa tem condições financeiras de manter o salário e todos os direitos trabalhistas de 3 ou 4 funcionários durante 10 ou 11 meses. Porém, com o fim de ano e o aumento na demanda comercial, é preciso contratar um trabalhador temporário. Esse trabalhador temporário tem que ter seus direitos trabalhistas também, porém deve ser algo comedido, sem prejudicar tanto o proprietário do meio de produção como seu funcionário. Empresas e interesses estrangeiros habitam nosso país; com a diminuição da indústria nacional, como ficariam os direitos dos trabalhadores? Tais multinacionais vão para onde seja possível o maior lucro, não se importando com os operários que emprega.
Exemplificando outro ponto, olhemos para os marginalizados, os excluídos do sistema legal que recorrem à ilegalidade para sobrevivência. Camelôs, por exemplo, recorrem a mecanismos ilegais para poderem ganhar seu sustento. Parece fora da nossa realidade, mas é muito difícil manter-se ativo perante tantos impostos e tantas burocracias. Apesar de todos os crimes cometidos nesse tipo de trabalho, é o único possível para milhões de trabalhadores que almejam uma solução para seu problema.
E nesse abuso contra os cidadãos, o governo ainda nos quer fazer acreditar que a escravidão terminou. Muito pelo contrário. Agora ela abrange todas as etnias que fazem parte dos marginalizados pelo sistema. Todos aqueles a quem o governo não oferece base suficiente para adaptar-se à nova demanda de conhecimento acabam por ser escravizados pela necessidade da mão de obra barata. E como um antisséptico que as mães passam nos machucados de seus filhos, o governo “joga” leis trabalhistas na população, a fim de mascarar um problema cujas raízes são muito mais profundas. Como uma modificação geral do sistema é uma utopia sem limites, a solução mais próxima e possível para os marginalizados do sistema seria a transformação do direito de agente profilático para agente preventivo.  Dessa maneira, o direito atuaria como a mãe que estende a mão aos filhos e lhes ensina qual caminho seguir. Seria uma trilha de passos a se seguir para se livrar da escravatura do século XXI.
 Mas, apesar da utopia, se o governo modificasse seu sistema de ensino, e todos tivessem a mesma condição de aprendizagem, e todo cidadão brasileiro tivesse um diploma do ensino médio, os problemas seriam resolvidos? A resposta é não. Não existem cargos superiores suficientes para abranger todo o contingente que se formaria nas universidades, e um indivíduo com diploma não iria se submeter a trabalhar em cargos inferiores à sua formação profissional. Dessa maneira, seriam os cargos básicos que ficariam em defasagem. Portanto, podemos chegar à conclusão mais suja a que o capitalismo nos remete: é preciso manter os marginalizados do sistema. É necessário garantir que a educação seja precária para que não haja revolta em um sujeito que trabalha 60 horas semanais para receber um salário mínimo. O direito no mundo moderno do trabalho tem profilaxias que fazem melhorar essa condição, mas é necessário admitir que ele não é, e que também não há, solução para o problema da desigualdade.
 
Alunos 1º Ano Direito Diurno: Giovana Branco, Karine Hungaro Cunha, Rafaella Salomão, Rodolfo Baldissera.
 

                           O ESTADO COMO MOVIMENTO SOCIAL EMERGENTE



“Estamos, portanto, em vias de criar novas constelações de lutas democráticas, visando permitir mais e mais amplas deliberações democráticas sobre aspectos de sociabilidade também mais vistos e mais diferenciados. A minha definição de socialismo como democracia sem fim vai, exatamente, neste sentido.”



Com o aumento das diferentes formas de fascismo social e em decorrência da disputa entre diversos atores sociais, debaixo da coordenação estatal pela regulação dos bens públicos, vê-se necessário que as forças cosmopolitas apresentem novas formas de democracia abrangendo tanto ações estatais quanto não-estatais. Nesse contexto aparece uma nova forma de organização também com o nome de Estado, mas com uma nova forma e mais vasta de organização, “composta por um conjunto híbrido de fluxos, redes e organizações em que se combinam e se interpenetram elementos estatais e não-estatais, nacionais e internacionais”. Dessas novas formas de democracia apresenta-se, pensando em uma redistribuição social, a democracia participativa que traz em seu conteúdo ações por parte do estado quanto por parte de agentes privados (ONGs, empresas, movimentos sociais, etc.) Na qual o Estado assegura a coordenação dos interesses e desempenhos. Sendo que é nesse tipo de democracia que o autor considera como sendo a conversão do Estado em um movimento social emergente.
A democracia participativa traz em si a democracia redistributiva que seria politicas de redistribuição social do dinheiro arrecadado pelo Estado em sua forma híbrida, para que dessa forma criar mecanismos de inclusão social. A respeito da politica tributária, a democracia redistributiva define-se pela solidariedade fiscal, sendo que como o Estado terá cada vez menos participação na produção direta de riquezas e cada vez mais a sua coordenação, se torna praticamente impossível controlar através da democracia representativa, consequentemente se torna necessário a utilização dos mecanismos da democracia participativa. Em linhas gerais a democracia participativa com a democracia redistributiva dará aos cidadãos e as famílias a opção de decidir, no coletivo e para o coletivo, quais seriam as melhores formas da utilização da arrecadação das ações tributárias. Ao mesmo que engloba essa forma a democracia participativa, existe o rendimento mínimo universal que garante a todos os cidadãos, independente do emprego, um rendimento suficiente para cobrir a necessidades básicas, constituindo assim em um poderoso mecanismo de inclusão social. As lutas por esse mecanismo são lutas cosmopolitas, ou seja, são lutas contra as formas de fascismos sociais.
Conclui-se, então, que essa nova forma de Estado emergente como movimento social ainda está por se inventar. Dessa forma as lutas democráticas nos anos que virão serão lutas por desenhos institucionais alternativos, uma vez que seja possível coexistir diferentes soluções institucionais concorrentes entre si, funcionando como experiências-piloto sujeitas a constantes remodelagens, dando condições iguais a diferentes soluções institucionais. “Por outras palavras, o Estado experimental será democrático na medida em que conferir igualdade de oportunidades às diversas propostas de institucionalização democrática”. Enfim como o fascismo social se legitima ou naturaliza enquanto pré-contratualismo e pós-contratualismo, cabe também às forças cosmopolitas mudar o Estado nacional em um elemento de uma rede internacional visando diminuir os “impactos destrutivos e exclusivistas desses imperativos,” visando a redistribuição igualitária das riquezas produzias pelo mundo todo.
“Sendo o mais recente dos movimentos sociais, o Estado acarreta consigo uma grande transformação do direito estatal tal como o conhecemos nas atuais condições do demoliberalismo. O direito cosmopolita é, aqui, a componente jurídica das lutas pela participação e pela experimentação democráticas nas políticas e regulações do Estado.”



Guilherme Amaro Paim, José Eduardo de Andrade Filho, Lorena Perozzi e Murilo Thomas Aires.