sexta-feira, 23 de novembro de 2012

"Os Intocáveis"



"Meu Deus, por livre escolha e por Teu amor, 
desejo permanecer aqui e fazer o que a Tua vontade exige de mim.
Não! Não voltarei atrás. 
A minha comunidade são os pobres.
A tua segurança é a minha.
 A tua saúde é a minha.A minha casa é a casa dos pobres.
Não apenas dos pobres, mas dos mais pobres dos pobres.
Daqueles de quem as pessoas já não querem se aproximar, 
com medo do contágio e da sujeira,
 porque estão cobertos de micróbios e vermes.
Daqueles que não vão rezar nos templos, 
porque não podem sair nus de casa.
Daqueles que já não comem porque não têm forças para comer.
Daqueles que se deixam cair pelas ruas, 
conscientes de que irão morrer e ao lado dos quais os vivos passam, 
sem lhes prestar atenção.
Daqueles que já não choram, porque se lhes esgotaram as lágrimas.
Dos intocáveis."

Madre Teresa de Calcutá

No texto “Poderá o direito ser emancipatório?”, Boaventura de Sousa Santos traz um conceito muito interessante e peculiar, que é o conceito justamente dos não cidadãos, segundo ele os não cidadãos são os indivíduos e grupos sociais que pertencem à sociedade civil incivil e às zonas fronteiriças entre a sociedade estranha e a sociedade civil incivil.
Os indivíduos que pertencem a essa categoria tem uma experiência de vida que corresponde a ausência de cidadania e caracterizam realmente não só as suas relações com o estado, como ainda suas interações com os outros indivíduos , incluindo por vezes os que compartilham a sociedade civil incivil.
A não cidadania é a não inclusão, dentro de todos seus pressupostos, no contrato social, e entre outras palavras o sistema de exclusão social.
Tal tema se encaixa perfeitamente nos marginalizados da cracolândia. Onde são pessoas que vivem como animais tentando justamente satisfazer o seu vício, vivendo sem nenhuma perspectiva de vida, e sem justamente vontade de reagir e tentar algo melhor para si, e é a partir dessa realidade próxima de todos nós que analisaremos à luz das reflexões de Boaventura.
Uma relação muito evidente entre os marginalizados da cracolândia e as reflexões de Boaventura, está no fato de Boaventura dizer que as experiências de vida desses não cidadãos variam de acordo com as circunstâncias, podem ser elas pelo fato de terem sido expulsos de um determinado contrato social e é o que realmente acontece com os viciados em craque onde suas famílias, ao saberem desse vícios, os expulsam de casa onde eles passam a viver juntamente com seu semelhante e assim tornando a situação ficar ainda pior. Outra relação também evidente é a seguinte: Boaventura diz que outra circunstância que é experiência de vida desses indivíduos é o fato de eles nunca terem passado por um processo de inclusão social, que é o caso das crianças de rua, que não têm sequer nenhum processo de socialização e são totalmente excluídas da sociedade o que faz com que iniciem sua vida muito cedo nas drogas e passem a habitar a cracolândia.
Assim, de acordo com a análise profunda sobre a realidade dessa “comunidade”, percebe-se claramente um apartheid social e polarizada segundo eixos econômicos, sociais, culturais e políticos. Todos os fatores, portanto, influenciam na prática da não-cidadania dos usuários de crack.
Desse modo, nota-se a falibilidade da Constituição e do Direito, onde estes asseguram os direitos dos não-cidadãos, mas isso não passa do ponto de vista formal, já que eles são atirados para um estado natural, estado este onde o único objetivo de vida é a própria sobrevivência, seguida do vício pela droga. Em outras palavras, é um estado que se traduz numa permanente angústia relativamente ao presente e ao futuro, na perda iminente do controle sobre as expectativas.
A polícia é outro elemento importante na vida desses usuários, pois são eles quem violentam, de modo brutal e desonesto, fatiando os direitos de liberdade de ir e vir, de permanecer onde querem, sem serem perturbados. É aí que citamos o documentário “Dr. Marcelo – O Diário do Inferno”, onde um médico recém formado da Faculdade de Medicina da USP se propõe a tratar os usuários de uma forma diferente, acrescentando carinho, fidelidade e, sobretudo, dando valor à dignidade, pois aqueles que são tratados como animais, nada mais são do que humanos.
 A cidadania, para os usuários, portanto,  é tida como ruína ou memória, ou seja, o cidadão foi expulso de algum tipo de contrato social, mesmo que seja por força da própria droga, a ineficiência de políticas públicas de saúde e segurança social permitem que eles fiquem presos pela droga que os consumiu.
Logo, mister se faz um questionamento que, mesmo após a discussão, pode suscitar diversas respostas. Mesmo com a argumentação do Professor, explicitamos novamente nossa pergunta para todos: Poderá o direito ser emancipatório, mesmo com todos os problemas e pedras no caminho dos exclusos não apenas dos sistemas políticos, culturais e econômicos, mas também dos sistemas sociais, como os usuários da Cracolândia na região metropolitana de São Paulo?

Afonso Marinho Catisti de Andrade
José Eduardo Garcia Tavares
Ricardo Juniti Akutsu Filho
Vicente da Silva Gordo Videira
(1º ano Direito Diurno)

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