quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Desenvolvimento Insustentável

"Porém, apenas adquiri algumas noções gerais concernentes a física, e, começando a comprová-las em várias dificuldades particulares, percebi até onde podiam conduzir e quanto diferem dos princípios que haviam sido utilizados até o presente, considerei que não podia mantê-las escondidas sem transgredir a lei que nos obriga a procurar, no que depende de nós, o bem geral de todos os homens. Pois elas me mostraram que é possível chegar a conhecimentos que sejam muito úteis à vida, e que, em lugar dessa filosofia especulativa que se ensina nas escolas, é possível encontrar-se uma outra prática mediante a qual, conhecendo a força e as ações do fogo, da água, do ar, dos astros, dos céus e de todos os outros corpos que nos cercam, tão claramente como conhecemos os vários ofícios de nossos artífices, poderíamos utilizá-los da mesma forma em todos os usos para os quais são próprios, e assim nos tornar como senhores e possuidores da natureza"
René Descartes

O senhorio e dominação do homem sobre a natureza, apartando-o desta, constitui uma ideia basilar da Ciência Moderna. Pregado pelo filósofo francês René Descartes, o conceito de superioridade humana sobre as demais formas de vida permanece impregnado no Modelo de Produção e Consumo Industrial. Tal superioridade justificaria a exploração humana dos recursos naturais, a partir de um conhecimento vinculado à razão e com vistas ao bem-estar do homem e à facilitação de sua vida. O cartesianismo caracteriza-se também pelo Mecanicismo de sua metodologia cintífica. A aliança entre conhecimento científico e exploração da natureza é engrenagem imprescindível na filosofia de Francis Bacon : "Mas aqueles dentre os mortais, mais animados e interessados, não no uso presente das descobertas já feitas, mas em ir mais além; que estejam preocupados, não com a vitória sobre os adversários por meio de argumentos, mas na vitória sobre a natureza, pela ação; não em emitir opiniões elegantes e prováveis, mas em conhecer a verdade de forma clara e manifesta; esses, como verdadeiros filhos da ciência, que se juntem a nós, para, deixando para trás os vestíbulos das ciências, por tantos palmilhados sem resultado, penetrarmos em seus recôndidos domínios. O intelecto humano se agita sempre, não se pode deter ou repousar, sempre procura ir adiante. Mas sem resultado. Daí ser impensável, inconcebível que haja um limite extremo e último no mundo. Antes, sempre ocorre como necessária a existência de mais algo além". As concepções baconianas, todavia, parecem ser mais enérgicas que as cartesianas. Além disso, nota-se um anseio insaciável pela inovação contínua, o qual não concebe limites. O ideal do filósofo inglês, em conjunto com o cartesianismo, integra a essência do Modelo de Produção e Consumo Industrial Moderno. O Capitalismo, nascente à época de Descartes e de Bacon, absorveu ambas as teorias já citadas e amalgamou-as com a busca desenfreada pelo lucro e pela acumulação de capital. Ciência e Capital tornaram-se um amálgama destinado ao desenvolvimento. As Revoluções Industriais apenas dinamizaram este processo e auxiliaram na implantação de ideologias hedonistas e consumistas. O desenvolvimento proposto, pactuado estritamente à acumulação, impôs, de facto, a dominação humana sobre o meio natural. Conforme avançam os séculos, são, entretanto, cada vez mais contestadas a eficácia e a veracidade deste "desenvolvimento" : ao mesmo tempo em que trouxe "prodígios e maravilhas", acarretou os mais diversos impactos ambientais. Os impactos, porém, não se referem somente ao ambiente. A cultura consumista, a superprodução e o superaquecimento de variadas economias provoca crises cíclicas em meio à superabundância. Tal fato foi relembrado em diversas teorias socialistas, a exemplo do marxismo. Defenderam Karl Marx e Friedrich Engels que "Nestas crises, surge uma epidemia que, em todas as épocas antigas, teria parecido absurda : a epidemia da superprodução. A sociedade se vê, subitamente, de volta a um estado de barbarismo momentâneo. Seria como se uma escassez, uma guerra universal devastadora houvesse cortado o fornecimento de todos os meios de subsistência. A indústria e o comércio parecem ter sido destruídos. E por quê ? Porque há civilização em demasia, comércio em demasia. As forças produtivas à disposição da sociedade não mais tendem a fomentar o desenvolvimento das condições da propriedade burguesa. Pelo contrário, tornaram-se poderosas demais para estas condições, que as restringem". Criou-se, desta forma a miséria em meio à abastança : enquanto algumas nações sofrem com o excesso de peso, outras padecem de fome e subnutrição. A estas contradições já se referiu Charles Fourier : "na civilização, a pobreza brota da própria abundância". Os impactos ambientais são muito severos : extinção de fauna e de flora, o derretimento das calotas polares, poluição nos seus mais diversos graus e tipos, as mudanças climáticas, o aquecimento global, acidificação pluvial, fluvial e marinha, dentre outros. Não é rara a observação de que as mudanças climáticas representam uma ameaça à propria existência humana. Em sua constante ânsia pelo lucro, o desenvolvimento insustentável criado pela indústria capitalista, embora tenha lançado mão da racionalidade para criar instrumentos de exploração do meio natural, não se utilizou da mesma racionalidade para medir as consequências desta exploração; ou seja, não se considerou que os recursos naturais são finitos. Em contrapartida, este modelo de desenvolvimento não é único do sistema capitalista. O socialismo moderno, o socialismo de facto, através do chamado "socialismo de mercado" demonstra a mesma imprudência. Notável exemplo é o "socialismo de mercado chinês". É deste ano o alerta do Ministro do Meio Ambiente chinês, Zhou Shengxian, acerca disso : "Nos milhares de anos de civilização da China, o conflito entre humanidade e natureza nunca foi tão sério quanto hoje". A única alternativa viável ao problema, para muitos estudiosos, é o desenvolvimento sustentável, cuja definição segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) é : "O desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da Terra e preservando as espécies e os habitats naturais". Na década de 1980, iniciaram-se, por todo o mundo, extensos debates acerca da questão ambiental, com o objetivo de se implementar o desenvolvimento sustentável, que podem, todavia, ser muito tardios. Na Brasil, a movimentação legislativa e o desenvolvimento do Direito Ambiental são igualmente recentes. São importantes dispositivos jurídicos, com o fim de implementar no País o desenvolvimento sustentável, o Código Florestal, a Lei n.6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente), a Lei 12.305/2010 (Responsabilidade Ambiental) e o artigo 225 da Constituição Federal, que diz expressamente (no caput) : "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". O desenvolvimento sustentável pode ser justificado a partir de um segundo alerta de Zhou : "O esgotamento e exaustão dos recursos, e a deterioração do meio ambiente se tornaram sérios gargalos restringindo o desenvolvimento econômico e social".

Nenhum comentário:

Postar um comentário