segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Dogma e Razão: do catolicismo ao protestantismo

Tema 1 (Capitalismo: a racionalização da fé?)
Mais do que um movimento religioso, a Reforma Protestante expressa a superação da estrutura religiosa medieval e feudal, não apenas no que toca a fé católica, mas principalmente em seus aspectos econômicos, sociais, políticos e culturais. Representando uma adequação de valores e concepções espirituais às transformações pelas quais a Europa passava. Ao se buscar os fatores que levaram às reformas, o primeiro aspecto que deve ser levado em conta é o desvirtuamento da Igreja e sua incapacidade de dar respostas aos anseios espirituais dos fiéis. A Igreja Católica era, na época, a maior possuidora de terras da Europa, e a instituição política mais poderosa, responsável, juntamente com a nobreza, pela manutenção da estrutura feudal.
No século XIII, a Igreja Católica adotou oficialmente celibato clerical, ou seja, a proibição dos membros do clero de casarem e terem filhos. Já que assim, não haveria herdeiros legítimos das terras ocupadas por cardeais e bispos, mantendo-as sobre o controle do clero e da nobreza. Foi daí que surgiu a tradição de que o segundo filho, das famílias nobres, ingressaria no clero católico, já que as terras cultiváveis na Europa eram cada vez mais escassas, e a Igreja era a única instituição que sempre tinha terras a doar. Dessa forma, o alto clero era composto apenas por nobres, e as investiduras (nomeações para a ocupação de cargos na alta hierarquia da Igreja) não analisavam aspectos como a vocação ou formação religiosa do membro a ser nomeado, pelo contrário, essas investiduras eram feitas levando-se em consideração o grau de riqueza, de poder e os benefícios que a aliança pudesse trazer a Igreja.
Essa prática, conhecida como investiduras leigas, gerou um clero inadequado às suas funções religiosas. Um exemplo disso foi o nicolaísmo, termo que provém de um bispo francês, Nicolau (que chegou a ter 32 filhos com 8 mulheres diferentes), e evidencia o desregramento dos membros da Igreja Católica. Além disso, a busca por uma renda capaz de sustentar o luxo em que vivia o clero, levou a Igreja a intensificar a venda de “relíquias sagradas” (prática conhecia como simonia) e a venda de indulgências (absolvição pelos pecados cometidos).
A reação dos fiéis a esse desvirtuamento se deu através de manifestações como o crescimento das heresias, termo empregado para designar todas as manifestações de pensamento religioso discordante dos dogmas impostos pela Igreja Católica. Ao contrário de uma primeira impressão, as heresias constituem-se numa prova de fé e não de falta de fé. Foi esse contexto que originou uma série de movimentos reformistas protestantes que marcaram a Europa no século XVI e teve origem na Alemanha, liderada por um então monge agostiniano chamado Martinho Lutero. Em 1517, Lutero fixou na porta da catedral de sua cidade um documento intitulado “95 teses Contra as Indulgências”. Nele, Lutero criticava violentamente as práticas, acima mencionadas, e se opunha a certos dogmas da Igreja Católica. Com isso, o atrito deixava de ser uma mera questão de críticas ao comportamento da Igreja, e passava a se tratar de uma negação à sua doutrina.
Num quadro de crescimento do comércio, os dogmas da Igreja, de condenação à usura e ao lucro excessivo representavam um forte obstáculo para a burguesia, uma camada em ascensão que tinha interesse em romper com os entraves impostos pelo catolicismo e adotar uma nova religião para a qual suas práticas não sejam pecado e sejam consideradas como dignificantes do homem: o protestantismo. Em "A ética protestante e o espírito do capitalismo", Max Weber procura estabelecer a relação entre os princípios do protestantismo e a realidade econômica e social da Europa, marcada pelo capitalismo. Para Weber, a reforma Protestante não tem o sentido de uma forma de escapar ao controle religioso sobre a vida social, mas de fazê-lo mais rigoroso e estendê-lo a todos os pontos da existência humana.
Weber afirma que o capitalismo não é a ânsia pura e simples por lucro, e vincula-se sobretudo às possibilidades de dinamização racional do investimento. Assim, os fatores que diferenciam o modo de produção capitalista de qualquer outro na história estão ligados à ideia de racionalização, que tem como pressuposto básico uma rigorosa ética pessoal, observada com severidade. Para Weber, o espírito do capitalismo não está no sentido material de se “aproveitar a vida”, mas no sentido da frugalidade, do trabalho árduo, do despojo. Acumular capital liga-se à ideia de virtude e eficiência, e não à ganância, desonestidade ou desvio de caráter. Desse modo, emergia a ideia de trabalho como um valor em si mesmo. Foi sobre esse prisma que o protestantismo ganhou força e se espalhou pela Europa, sendo, mais tarde, adotado na Suécia (Reforma Calvinista), na Dinamarca e na Noruega.

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