segunda-feira, 1 de abril de 2024

Funcionalismo como compreensão da Locomotiva Social guiada pela Opinião Coletiva

Propondo o fato social – “todo aquele que independe do indivíduo e tem como substrato o agir do homem em sociedade, de acordo com as regras sociais” - como domínio próprio da Sociologia, Émile Durkheim foi um importante expoente para o firmamento desta como Ciência propriamente dita. Apesar de em alguns pontos muitas vezes ser visto como próximo dos ideais Positivistas, o autor critica a análise inicial a partir da qual Comte fundamentou sua teoria, pois este, ao partir de concepções próprias (“ideias”) em sua análise social (“coisas”), acabaria desviando-se da construção de uma “ciência das realidades” e passaria para uma mera “análise ideológica”. Outrossim, em oposição ao Sistema Social de Comte, Durkheim visualiza a sociedade como um “Corpo Social” em busca constante da coesão através da solidariedade social garantida pelas instituições.

Nestes termos, verifica-se que ainda que a obra remonte o final do século XIX sua teoria encontra-se extremamente vívida na sociedade contemporânea. A partir de uma coerção expressa (penal) ou velada (social), seja ela resistida ou consensual, as pessoas desde muito cedo têm seus comportamentos moldados pela forma coletiva em “cupcakes” úteis que cumprem sua função social. Em alguns pontos, essa condição é até positiva se pensarmos que o respeito ao próximo e aos mais velhos, a ética e a moral em geral são ensinadas, porém também o são os preconceitos e a falsa moralidade. Afinal nenhuma criança nasce racista ou homofóbica.

Essa modulação comportamental já foi inclusive criticada em uma música da banda Pink Floyd, “Another brick in the wall”, em uma letra que continua sob certos aspectos atual, repudiando o ensino que prega o falso apartidário, que hoje remonta inclusive os movimentos contra suposta “doutrinação” nas escolas, isso porque essas mobilizações na verdade têm aversão ao lecionamento de matérias que nada mais ensinam senão o próprio pensamento crítico - Sociologia e Filosofia -, que passaram a ser extremamente atacadas sem pudor, como ocorreu em um discurso do próprio secretário da Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo. Essas vertentes temem que os jovens “pensem por si mesmos”, o que seria um risco à coesão social em seu estabelecimento atual.

Nesse contexto, vale destacar que embora o funcionalismo seja mais “flexível” que o positivismo, assimilando determinados comportamentos sociais no decorrer do tempo, onde a solidariedade orgânica prevê que a “consciência coletiva deixe descoberta uma parte da consciência individual”, essa “liberdade” individual é relativa à medida que não é difícil perceber uma censura social contra aqueles que saem dos trilhos do pensamento essencial. É permitido discordar, mas até certo ponto. E nessa senda, cada vez mais vemos uma atração social pela “solidariedade mecânica”, na qual temos movimentos passionais e em grande parte irrefletidos, onde a individualidade é subvertida quase completamente à consciência coletiva.

Mais claro exemplo é a concepção coletiva do sistema prisional brasileiro. A sua função social atual é restitutiva, ou seja, de correção do comportamento indesejado para posterior reintegração do indivíduo ao convívio social. Entretanto o que se nota é um sentimento coletivo de ódio contra os infratores antes, durante e mesmo depois do cumprimento da pena, dificultando sua efetiva ressocialização.

Outrossim, é comum a propagação de clamores por penas mais rígidas (ainda que desproporcionais ao caso concreto) e dizeres como “bandido bom é bandido morto” – mas só certos bandidos. Esse cenário é a face perfeita já descrita por Durkheim, onde a pena não serve ao infrator e sim à consciência coletiva. Diga-se de passagem, não se trata somente das penas formais (legais), mas também das penas aplicadas pela própria sociedade, que ao atravessar os preceitos legais muitas vezes condenam inocentes sem ressalvas, como foi o caso da Escola Base, da dona de casa do Guarujá (2014) e muitos outros, onde as pessoas conduzidas por uma consciência coletiva deixam de analisar criticamente as situações e o contexto em que se dão. Então fica o questionamento: Como pode uma punição que não visa a correção do indivíduo e sim a “satisfação” coletiva em simples reflexo àquela conduta individual - desdobrando-se largas vezes em mero revanchismo - representar o equilíbrio?

Eis aí uma face obscura que ninguém quer olhar. E é neste ponto que a Sociologia e o pensamento crítico assumem importância fundamental, posto que para poder sair dos trilhos ou dar uma nova direção a eles, é preciso, antes, encará-los de frente, tendo em mente que as próprias mudanças já vivenciadas foram frutos de movimentos/contestações sociais.

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