segunda-feira, 18 de março de 2024

Direito e Família: Uma Crítica ao Positivismo Jurídico e às Políticas Neoliberais

    Auguste Comte, considerado inapto a doutrinas religiosas, - a priori - contribuiu para uma reorganização social baseada no sistema de política positivista, o qual possuía como princípio a paz, a ordem e o progresso, prezando por uma religião baseada em valores morais que criaria uma sociedade organicista.

    O Positivismo Jurídico trata a norma no seu sentido estrito, ou melhor, para essa teoria, o direito não se vincula com aspectos conflituosos que compõem uma sociedade e não busca validade ou reconhecimento dos critérios advindos do equilíbrio entre moralidade e justiça, deixando de lado toda a necessidade de uma dogmática analítica e hermenêutica que abarcam o senso de se fazer justiça na contemporaneidade de uma comunidade.

    A sociedade organicista apresenta conceitos contraditórios, uma vez que sua dinâmica social apenas idealiza uma lei fundamental e funcional para todos, ignorando o fato de que apenas a lei em seu sentido estrito, sequer garante o direito inato de cada indivíduo. Dessa forma, Comte define a felicidade como realização do bem público, No entanto, desvaloriza a solidariedade social que se encontra na engrenagem das relações sociais. 

    Dentro da concepção de sociedade, encontram-se diversos conflitos externos (a sociedade como um todo) até os internos que ocorrem dentro de uma instituição para o Estado: a família. A agenda neoliberal que permeia a atuação do Estado, se estende na relação com as políticas sociais que, a princípio, possuem a ideia de retirar as famílias da extrema pobreza, assim como demonstra na lei apenas posta. 

    Todavia, essa intervenção do Estado se demonstra incapaz de retirar as famílias beneficiárias da situação de pobreza, haja vista que a sua gerência se configura apenas em programas emergenciais e assistencialistas e não contemplam as multifacetadas e complexidade de laços que distanciam a lógica biológica de constituir família, assim como traz o próprio conceito de família atualmente, que pode ir de famílias adotivas temporárias até famílias monoparentais, famílias homoafetivas, famílias reconstituídas após o divórcio - entre outras - que apresentam os seus próprios conflitos que são refletidos na sociedade. Afinal, família também é o lugar onde há tensões e até mesmo diversas formas de violência.

    Nesse sentido, compreende-se a família como instituição primária que promoverá a socialização de seus membros, o qual irá possibilitar um ambiente de construção de identidade e dos projetos de vida. Dessa forma, compreende-se que a família deve prover todas as necessidades dos seus membros, sendo totalmente dependentes das relações de produção e do mercado de trabalho. 

    Dito isso,  é possível vislumbrar que as famílias que se encontram em situação de pobreza, são as mais penalizadas no processo de garantia desses direitos positivados expostos por uma Estado neoliberal, pois há uma responsabilização da família pela promoção do bem-estar de sua parentela, perpetuando nas políticas sociais que sempre se enquadram em um cenário constante de negociações que tentam a todo momento, moldar um padrão de vida que se distancia completamente da realidade dessas famílias.

    Essa direção que essas políticas sociais seguem, reforçam um caráter moralizador sobre as famílias pobres que carecem dessas assistentes sociais. Afinal, uma vez levantada essa questão social conflituosa presentes nessa instituição, elas substanciam um caráter individual advindo dessa tradição liberal que retroage a verdadeira essência das políticas públicas, pois responsabiliza o indivíduo pela efetivação dos direitos sociais que são apresentados desde a CF/88 até as suas leis complementares, como por exemplo, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

    Dessa forma, não há como se falar em uma lei fundamental para todos e a imposição moral de uma religião que permanece intrínseca até mesmo nas próprias leis. É necessário sempre se questionar: quem é de fato reconhecido/a pela lei exposta ou por aquele que a cria? Para quem as leis são feitas? Qual a sua finalidade? 

    Assim como discorre Wright Mills sobre as questões públicas: “as questões relacionam-se com assuntos que transcendem esses ambientes locais do indivíduo e o alcance de sua vida íntima. [...]”. Toda relação de conflito é um reflexo da sociedade, assim como a própria sociedade reflete nas relações internas. 

    Ainda, “A questão, na verdade, envolve quase sempre uma crise nas disposições institucionais, e com frequência também aquilo que os marxistas chamam de “contradições ou antagonismos”. É de fato estranha uma coincidência um Estado neoliberal tentar garantir os direitos de todos, uma vez que a própria garantia de apenas “ser feliz” se encontra nos meios de produção e no mercado de trabalho que o indivíduo se encontra. A culpa sempre recai no indivíduo e não na gerência lucrativa do Estado.


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