quinta-feira, 28 de março de 2024

A pena como expiação: a ideia da anomia durkheimiana na sociedade brasileira

    Para Émile Durkheim, cuja teoria sociológica é o funcionalismo, a sociedade é unida harmoniosamente por meio de uma solidariedade orgânica, de forma que há uma "consciência coletiva", formada pelo conjunto de crenças e sentimentos comuns a seus membros, a qual independe do indivíduo, mas o influencia. Assim, na lógica durkheimiana, crimes apenas o são por irem contra essa "consciência comum", e, ao romperem com a solidariedade, criam uma anomia, situação que deve ser punida com um caráter expiatório, a fim de reafirmar a unidade da "consciência coletiva". Analisando essa perspectiva, é possível afirmar que, no Brasil, a população possui um pensamento muito parecido ao durkheimiano, gerando, por exemplo, justiçamento e a não ressocialização dos presos.

    A princípio, vale ressaltar como o justiçamento é presente na sociedade brasileira. Conhecido também como "fazer justiça com as próprias mãos", o comportamento é comum por partir de uma ideia de punir aqueles que considera criadores de desordem em alguma intensidade, ocorrendo, principalmente, em grupos. Segundo o psicólogo francês Gustave Le Bon, em seu livro "Psicologia das Multidões", ao estar no meio de um grupo, pessoas normalmente inofensivas podem ter comportamentos violentos, estimuladas pela sensação de anonimato e pertencimento. Nesse viés, em janeiro de 2022, o congolês Moïse Kabagambe foi morto no Rio de Janeiro, vítima de uma agressão por um grupo de cinco pessoas, por confundirem seu pedido por um pagamento atrasado por seu trabalho em um quiosque com uma briga, mostrando como a ideia de justiçamento é falha, principalmente por não considerar a possibilidade da pessoa, na verdade, ser inocente, e basear-se apenas em um conhecimento raso sobre o caso, ainda mais com o racismo e outros preconceitos como motivadores.

    Ademais, a ideia de uma punição a ser realizada também pelos cidadãos faz com que ex-presidiários não consigam se reintegrar à sociedade. Dentro de presídios e mesmo após cumprirem suas penas, estes são tratados de uma maneira negativa por seus compatriotas, os quais, devido à sua ficha criminal, não deixam com que eles sejam aceitos em diversos locais, tais quais em vagas de emprego ou simplesmente na vida pública, tornando a punição por seus crimes ainda maior e impedindo a superação total deles. Por conseguinte, a ressocialização no Brasil é um conceito falho, uma vez que, de acordo com o Núcleo de Estudos da Violência da USP e a Secretaria Nacional de Políticas Penais, apenas 6 a cada 25 presos trabalham e, devido à alta taxa de desemprego nesse demográfico, a reincidência no crime é de 46%.

    Desse modo, é perceptível como a ideia de que os criadores de uma possível anomia devem ser punidos, às vezes de uma maneira até mesmo desproporcional, está enraizada na cultura brasileira. Logo, deve-se clarificar que, apesar de haver injustiças em alguns julgamentos, não cabe à população a punição de pessoas inocentes ou daquelas que já cumpriram a sentença dada.


Beatriz Perussi Marcuzzo, 1º ano - noturno, RA: 241220459

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