segunda-feira, 7 de novembro de 2022

A criminalização da homofobia

    O conflito expresso na ADO 26, julgada pelo STF em 2019, diz respeito à criminalização da homofobia, a qual diz respeito ao preconceito em relação à orientação sexual de terceiros, seja por meio de ofensas, atitudes discriminatórias e/ou atos de violência. 

    Nesse sentido, primeiramente, é válido ressaltar que tal assunto se insere no chamado “Espaço dos Possíveis”, de Bourdieu, pois as ideias em conflito são tanto do âmbito jurídico quanto social. Há divergências, portanto, nas doutrinas e até na própria jurisprudência, em relação à criminalização, ou não, da homofobia.

    A racionalização do direito prevê que ele deve ser baseado na interpretação da lei, sem quaisquer influências externas, ou seja, deve seguir o que está expresso nas legislações de forma metódica. Esse é um dos principais argumentos contra a criminalização de tal preconceito, ao defender que na Constituição (art. 5°), há a garantia de liberdade de expressão, proteção e igualdade entre todos os indivíduos; logo, não há a necessidade de criar leis que garantam algo que já está positivado. Além disso, afirmam que não há crime nem pena sem lei prévia; logo, não há a necessidade de criação de um tipo penal específico.

    Entretanto, os que defendem a criminalização da homofobia utilizam de argumentos válidos e concretos, como o fato de que para a justiça social não é suficiente que a Constituição preveja igualdade e proteção a todos os indivíduos no âmbito formal, pois na realidade não há a concretização disso. Ademais, o próprio texto constitucional diz que é dever do STF garantir os direitos; logo, não tem problema ampliar o rol de direitos, se isso significa garantir a proteção que a Constituição prevê. 

    É fácil perceber que um dos motivos da dificuldade de romper com ideais preconceituosos está no fato de que as minorias sofrem pois não se incluem no modelo da maioria daqueles que estão no STF (homens, brancos, héteros). Com isso, não há representação no STF dos ministros em relação à comunidade LGBT: tanto por idade quanto por fatores de sua própria orientação sexual; assim, torna-se incabível que os grupos subordinados sejam julgados por aqueles que se inserem nas características do próprio grupo subordinador. 

    Dessa forma, há a continuação do ciclo de hierarquização, em que as minorias sociais são colocadas como inferiores. Com isso, há a reprodução da violência simbólica, a qual, segundo Bourdieu, se caracteriza por ser “invisível”, ou seja, pouco perceptível, ao garantir a perpetuação das subordinações como se fosse algo natural, pressupondo que a dominação entre grupos distintos é algo natural na sociedade e que deve ser preservada.

    A historicização da norma, todavia, diz que devemos adequar as leis e decisões ao contexto social atual, de acordo com as demandas e necessidades da população. Logo, torna-se um argumento válido para a defesa da criminalização da homofobia. Garapon, ainda, afirma que deve ocorrer, na sociedade, a magistratura do sujeito, garantindo que o indivíduo deve ser capaz de conduzir sua vida de acordo com seus próprios valores. Logo, sua forma de viver e de se expressar não deve ser limitada pela simples inadequação de terceiros à sua orientação sexual. 

    Por fim, cabe dizer que a utilização da crença religiosa como argumento não é válida, uma vez que o Estado é laico. Além disso, apesar de muitas pessoas se utilizarem da Bíblia para embasar o que, na verdade, não se passa de um ridículo discurso de ódio, o próprio Papa Francisco, autoridade máxima da Igreja Católica, se posiciona contra o preconceito e a homofobia.

    Dessa forma, na ADO 26, o STF decidiu criminalizar a homofobia e quaisquer discriminações que defendem como único o padrão heteronormativo. 


Giovana Parizzi
1° Direito - Matutino

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