quarta-feira, 30 de março de 2022

Fulcro da obscuridade hodierna

Ainda na Antiguidade Clássica, o exercício científico possuía funções contemplativas, sem muita contribuição no âmbito prático da vida humana. Nesse sentido, René Descartes e Francis Bacon, dois pilares importantes no que diz respeito à construção da Ciência Moderna, a fim de estruturar um saber capaz de transformar a realidade concreta e, ademais, insatisfeitos com a inutilidade das especulações da filosofia tradicional, propuseram meios pautados na racionalidade para alcançar o conhecimento verdadeiro.

Nessa conjuntura, René Descartes, visando romper com tal inoperância dos clássicos e superar as formas supersticiosas - e vigentes, até então - de conhecer o mundo, articulou um método alicerçado pelo ato de duvidar. Dessa forma, como presente em sua obra, o autor acreditava que, ao duvidar metodicamente de tudo, em um momento encontraria um saber incontestável, e esse seria verdadeiro. Assim, chegou a uma nova conclusão: a existência do homem é certificada pela atividade de pensar, ou seja, o corpo não se faz necessário para tal garantia e então, por isso, “Penso, logo existo”.

Outrossim, Francis Bacon e Descartes, embora tenham objetivos equivalentes, divergem em relação ao papel dos sentidos. Nesse viés, Bacon, em sua produção “Novo Órgão”, reflete acerca da futilidade do movimento da mente humana sem um direcionamento – acredita que tal exercício proporciona apenas meros pensamentos mágicos carregados de senso comum. Portando, para ele, um guia faz-se necessário: a observação. Desse modo, somente o elo entre racionalidade e experiência teria capacidade de gerar conhecimento verdadeiro – diferentemente de René, que considera os sentidos fonte de enganos.

Dessarte, a tão prezada utilidade prática da ciência para ambos os filósofos deve-se, sobretudo, à ascensão da classe burguesa e a necessidade de instrumentos e mecanismos promovedores dos avanços almejados por tal grupo -clamavam por uma ciência emancipatória que melhoraria as condições da vida humana. Enfim, a contemporaneidade é, na verdade, a consolidação desses projetos científicos e, ao vivenciar eventos desumanos permeados por ferramentas destrutivas, retrata, notada e infortunadamente, o lado obscuro proporcionado pela Ciência Moderna.

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